quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Dever de Decidir. Deferimento tácito. Administração pública

Um dos grandes princípios da Administração Pública é o Dever de Decidir – Principio da Decisão, previsto no n.º 1 do art. 13.º do CPA.

Este dever enuncia a obrigação da Administração Pública tomar uma posição face as questões que sejam apresentadas aos seus órgãos e serviços.
Quer isto dizer que, a Administração está vinculada a uma resposta quando lhe seja apresentada: petição, reclamação, queixas, impugnações.
 Este dever mantém-se mesmo que a questão apresentada tenha sido para órgão ou serviço incompetente na matéria, impondo-se a este a enviar para órgão ou serviço competente n.º 1 do art. 41.º do CPA).
O princípio do dever de decidir tem uma exceção. Não há o dever de decidir quando a Administração tenha praticado o ato administrativo sobre o mesmo pedido, formulado pelo mesmo particular com os mesmos fundamentos, há pelo menos dois anos, a contar da data da apresentação do requerimento (n.º 2 do art. 13.º do CPA).
Aqui chegados, e tendo como foco o instituto do deferimento tácito, é importante aferir os prazos para a decisão da Administração Pública.
 O n.º 1 do art. 128.º do CPA estabelece o prazo-regra de 90 dias. Este prazo pode ser prorrogado por 90 dias desde que fundamentado em circunstancias excecionais ou em alguns procedimentos específicos ser mais curto (n.º 2 do art. 128.º do CPA).
Em matérias de prazos é ainda importante reter que nos casos de procedimentos de natureza oficiosa em que a decisão possa ser desfavorável ao interessado, os mesmos caducam no prazo de 180 dias (n.º 6 do art. 128.º do CPA).
 No que respeita a contagem dos prazos deve observar-se o previsto no art. 87.º do CPA, sem prejuízo da dilação, (art. 88.º)  a saber:
a)         O prazo começa a correr independentemente de quaisquer formalidades;
b) Não se inclui na contagem o dia em que ocorra o evento a partir do qual o prazo começa a correr;
c) O prazo fixado suspende-se nos sábados, domingos e feriados;
d) Na contagem dos prazos legalmente fixados em mais de seis meses, incluem-se os sábados, domingos e feriados;
e) É havido como prazo de um ou dois dias o designado, respetivamente, por 24 ou 48 horas;
f) O termo do prazo que coincida com dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o ato não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte;
g) Considera-se que o serviço não está aberto ao público quando for concedida tolerância de ponto, total ou parcial.
Considerando o dever de decidir nos prazos previstos na lei quando a Administração Pública não obedece a imposição legal estamos perante uma omissão do deve de decidir. A inercia da Administração pode significar uma de duas situações: há incumprimento do dever de decidir; ou, ao silêncio dá-se o valor jurídico de deferimento tácito. 
O deferimento tácito é um instituto jurídico que está previsto no n.º 1 do art. 130.º do CPA. E o silêncio só tem significado jurídico quando existe legislação que confira esse valor. Não havendo lei que determine o deferimento tácito há incumprimento da Administração Pública.
Os interessados têm formas de reagir no caso de incumprimento da Administração. Na ausência de decisão final pode o particular recorrer aos meios de tutela administrativa ou judicial, tal como, podem reagir quando está perante o deferimento tácito.
Sobre a possibilidade de recorrer aos meios de tutela no caso de deferimento tácito a doutrina diverge, por exemplo:
- Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos defendem que o interessado pode na mesma (…) «pedira condenação da Administração à emissão do ato administrativo ilegalmente omitido, de modo a obter uma tutela plena da sua situação jurídica».
- Sérvulo Correia  e João Tiago Silveira refendem que (…) «havendo deferimento tácito, o ato já existe: os seus efeitos típicos encontram-se desde logo constituídos na esfera do interessado. Uma ação de condenação à prática de ato administrativo com o mesmo conteúdo enfermaria de possibilidade do objeto».
-  Vasco Pereira da Silva contesta que o deferimento tácito dê origem a um ato administrativo.
 Deve salientar-se que o ato tácito da comunicação prévia prevista no n.º 3 doa rt. 134.º do CPA em que, a ausência de pronúncia do órgão competente não dá origem a um ato de deferimento tácito, mas habilita o interessado a desenvolver a atividade pretendida, sem prejuízo dos poderes de fiscalização da Administração e da possibilidade de esta utilizar os meios adequados à defesa da legalidade, sendo uma alternativa à atribuição de um valor positivo ao silencio da Administração.
Note-se que, o ato tácito da comunicação prévia implica a responsabilidade exclusiva do particular, se for o caso.
Em fase de conclusão, deixa-se claro que a lei restringe as situações em que é possível deferimento tácito impondo que nesses casos exista referencia expressa naquele sentido.
O que se compreende, pois a ser em sentido contrario a Administração sempre correria o risco de aceitar, por diversos motivos, designadamente, pela sua inercia, situações solicitadas pelos particulares que poderiam ir contra os interesse público.
Para maior desenvolvimento nesta matéria ver:
Carla Amado Gomes / Ana Fernanda Neves / Tiago Serrão, in Comentários ao Novo Código do Procedimento Administrativo.
Diogo Freitas Do Amaral, in Curso de Direito Administrativo, Tomo II.
Marcelo Rebelo de Sousa / André Salgado De Matos, in Direito Administrativo Geral, Tomo III.