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sábado, 8 de setembro de 2012

O Baloinço das reformas de ensino e explicação da inutilidades destas,


          Depois do DL n.º 272/2009,
  
          Depois do Ac. TCA Sul de 12/01/2012,

          Depois de Portaria n.º 274-A/2012, de 06/09 ... entre outros,

Deixo aqui o registo de uma crónica,  - O Baloinço das reformas de ensino e explicação da inutilidades destas, publicada em Seara Nova, a 28 de julho de 1945

"Quando em Portugal se faz reforma de ensino cada um dá, como é natural, a sua sentença. Este diz que prefere um curso complementar sem preparação de letras e ciências, porque entende que um homem fica imperfeito e incompleto se assim não acontecer: outro sustenta que no programa de filosofia se devia dar maior lugar à moral, visto que sua respeitável opinião a filosofia não é uma técnica; outro é de opinião que não deve haver aulas depois do almoço, abonando isto com citações de autores consideráveis. Há pois muitas opiniões, todas argumentando com suas diferentes razões, resultando delas as reformas que se vêm substituindo umas às outras. Assim, ora temos cursos separados de letras e ciências, ora temos um curso uno; ora há mais, ora menos Latim, mais ou menos moral; ora o primeiro ciclo acaba no 2.º ano ora no 3.º; ora há duas ora uma ora nenhuma aula depois do almoço – consoante a Autoridade está nas mãos dos que opinam em certo sentido ou na dos que opinam no sentido oposto.
E por decisões supremas não direi desta opinião, mas desta “opinação”, é possível resolver os mais graves problemas. Certas pessoas, por exemplo, antipatizam com coeducação – problema debatido, estudado experimentalmente, por homens de ciência - ; e efetivamente um belo dia a coeducação lá se vai, de uma penada, sem explicação, levada por uma opinião condenatória, e passa ao rol das coisas que esperam o regresso da opinião favorável, assim como uma pessoa que perdeu uma partida ao jogo e aguarda a sorte da partida seguinte.
Assim, pois na expetativa de próxima reforma muitos perguntam: qual é o programa de Latim? Em que ano acaba o primeiro ciclo? A que horas começam as aulas? Qual é o regime dos exames? Etc., etc. Cada um procura saber se a sua opinião é confirmada ou contrariada pela reforma em questão: e quando esta for publicada haverá sobre ela como de costume várias sentenças, umas favoráveis e satisfeitas, outras desfavoráveis e esperando a desforra.
Há porém uma pergunta que ninguém fará, uma coisa sobre a qual ninguém terá opinião, se por acaso não saírem muito erradas as minhas previsões. Essa pergunta é: em que base cientifica assenta esta reforma? Que investigações e experiências foram feitas para a sua elaboração? Em que laboratórios estudaram os seus autores? A que escola cientifica pertencem? Quais são os resultados dos trabalhos científicos que precederam este projeto?
Será ingenuidade supor que esta deveria ser a primeira pergunta a fazer-se? Como se há-de elaborar, para dar um exemplo, um programa de línguas vivas sem se terem experimentado e aplicado as leis da aprendizagem daquelas línguas? E se assim não fizermos, como nos achamos habilitados a propor um programa? Em que nos fundamentamos? Na opinião do Sr. X que julga que o melhor meio de aprender Francês é decorar as regras e formas da Gramática? E acaso o Sr. X já experimentou outro método qualquer além deste? E por que não preferiremos a opinião do Sr. Y que é o contrário da do Sr. X?
Que credenciais, em suma, traz esta ou aquela reforma? Em que provas se baseia?
(…)
Algum leitor mais desconfiado pensará que tudo isto são questões sem valor prático. Não interessa o rigor científico. Pedagogia é arte, não ciência, dirão.
(…)
Com efeito, o Leitor já se lembrou de pôr a hipótese de um regime ou um método diferente daquela rotina a que estamos todos habituados, o Leitor e eu?
(…)
Não estará o Leitor como um surdo de nascença, convencido de que os sons que os outros ouvem são meras ilusões, de que nem sequer vale a pena fazer a experiencia de ouvir bem? Não será a nossa santa convicção de surdos que nos leva a pensar que além dos problemas dos horários, disciplinas, doseamentos de programas, inspeções, etc., não há outros a resolver, e a sorrir das cantigas dos sábios, fortes na nossa antiga e sólida experiencia de muitos anos de ensino?
 (…) e o que aconteceu com o regime de exames em vigor?
(…) a questão policial da divulgação de pontos antes do exame… a hipotética causa do anonimato do professor.
(…)
Mas note o Leitor que este erro é o de toda a chamada pedagogia nacional. Como são controlados, examinados os resultados do nosso ensino ou dos nossos programas.
(…)
As críticas que são feitas às nossas reformas, programas, sistemas de exames, etc., têm como único fundamento as preferências ou conveniências pessoais, os interesses dos pais, e dos colégios, os hábitos dos professores, às vezes, mas raramente preconceitos religiosos ou doutrinários.
Nenhum corpo científico de doutrina, fundado em leis, psicofisiológicas, preside à nossa legislação sobre educação. Para empregar uma linguagem mais pitoresca: temos curandeiro em vez de médicos.
Culpa dos reformadores? Não creio, Leitor. Os reformadores são já vítimas. Com efeito, onde estão os cientistas que poderiam orientar, os laboratórios a que poderiam recorrer? A escola que poderia preparar?
Onde há em Portugal um corpo, um colégio, um instituto de pedagogistas e psicologistas para orientar os autores das reformas? Que se tem investigado concretamente acerca da criança portuguesa?
(..) E que sabemos nós, professores, dos métodos e das leis da aprendizagem?

Retirado da net


Eis, ao que julgo, Leitor, a razão por que cada qual dá a sua sentença e por que as reformas são uma espécie de baloiço em que ora sobe ora desce a mesma sentença, para voltar a subir e a descer.
E entretanto fica sempre adiada a única reforma realmente útil e urgente. Essa reforma é a criação em Portugal de um corpo de cientistas especializados nos problemas da criança, com meios de trabalho e possibilidades de iniciativas que lhe permitam ser mais que uma mera secretaria de expediente, ou mera academia de espirituosos ou eruditos cavalheiros"

António Saraiva