quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Responsabilidade civil na promoção da segurança e saúde no local de trabalho

A L n.º 102/2009 republicada pelo L n.º 4/2014 aprovou o regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho, em vigor desde 01/10/2009. O Capítulo II destinado as obrigações dos empregadores e trabalhadores de acordo com o art. 15.º e 17.º, respetivamente, são importantes em sede de responsabilidade civil.
Ao empregador cabe assegurar ao trabalhador condições de segurança e de saúde em todos os aspetos do seu trabalho, zelando, de forma continuada e permanente, pelo exercício da atividade em condições de segurança e de saúde para o trabalhador, tendo em conta os seguintes princípios gerais de prevenção:
«a) Evitar os riscos;
b) Planificar a prevenção como um sistema coerente que integre a evolução técnica, a organização do trabalho, as condições de trabalho, as relações sociais e a influência dos fatores ambientais;
c) Identificação dos riscos previsíveis em todas as atividades da empresa, estabelecimento ou serviço, na conceção ou construção de instalações, de locais e processos de trabalho, assim como na seleção de equipamentos, substâncias e produtos, com vista à eliminação dos mesmos ou, quando esta seja inviável, à redução dos seus efeitos;
d) Integração da avaliação dos riscos para a segurança e a saúde do trabalhador no conjunto das atividades da empresa, estabelecimento ou serviço, devendo adotar as medidas adequadas de proteção;
e) Combate aos riscos na origem, por forma a eliminar ou reduzir a exposição e aumentar os níveis de proteção;
f) Assegurar, nos locais de trabalho, que as exposições aos agentes químicos, físicos e biológicos e aos fatores de risco psicossociais não constituem risco para a segurança e saúde do trabalhador;
g) Adaptação do trabalho ao homem, especialmente no que se refere à conceção dos postos de trabalho, à escolha de equipamentos de trabalho e aos métodos de trabalho e produção, com vista a, nomeadamente, atenuar o trabalho monótono e o trabalho repetitivo e reduzir os riscos psicossociais;
h) Adaptação ao estado de evolução da técnica, bem como a novas formas de organização do trabalho;
i) Substituição do que é perigoso pelo que é isento de perigo ou menos perigoso;
j) Priorização das medidas de proteção coletiva em relação às medidas de proteção individual;
l) Elaboração e divulgação de instruções compreensíveis e adequadas à atividade desenvolvida pelo trabalhador.
3 - Sem prejuízo das demais obrigações do empregador, as medidas de prevenção implementadas devem ser antecedidas e corresponder ao resultado das avaliações dos riscos associados às várias fases do processo produtivo, incluindo as atividades preparatórias, de manutenção e reparação, de modo a obter como resultado níveis eficazes de proteção da segurança e saúde do trabalhador.
4 - Sempre que confiadas tarefas a um trabalhador, devem ser considerados os seus conhecimentos e as suas aptidões em matéria de segurança e de saúde no trabalho, cabendo ao empregador fornecer as informações e a formação necessárias ao desenvolvimento da atividade em condições de segurança e de saúde.
5 - Sempre que seja necessário aceder a zonas de risco elevado, o empregador deve permitir o acesso apenas ao trabalhador com aptidão e formação adequadas, pelo tempo mínimo necessário.
6 - O empregador deve adotar medidas e dar instruções que permitam ao trabalhador, em caso de perigo grave e iminente que não possa ser tecnicamente evitado, cessar a sua atividade ou afastar-se imediatamente do local de trabalho, sem que possa retomar a atividade enquanto persistir esse perigo, salvo em casos excecionais e desde que assegurada a proteção adequada.
7 - O empregador deve ter em conta, na organização dos meios de prevenção, não só o trabalhador como também terceiros suscetíveis de serem abrangidos pelos riscos da realização dos trabalhos, quer nas instalações quer no exterior.
8 - O empregador deve assegurar a vigilância da saúde do trabalhador em função dos riscos a que estiver potencialmente exposto no local de trabalho.
9 - O empregador deve estabelecer em matéria de primeiros socorros, de combate a incêndios e de evacuação as medidas que devem ser adotadas e a identificação dos trabalhadores responsáveis pela sua aplicação, bem como assegurar os contactos necessários com as entidades externas competentes para realizar aquelas operações e as de emergência médica.
10 - Na aplicação das medidas de prevenção, o empregador deve organizar os serviços adequados, internos ou externos à empresa, estabelecimento ou serviço, mobilizando os meios necessários, nomeadamente nos domínios das atividades técnicas de prevenção, da formação e da informação, bem como o equipamento de proteção que se torne necessário utilizar.
11 - As prescrições legais ou convencionais de segurança e de saúde no trabalho estabelecidas para serem aplicadas na empresa, estabelecimento ou serviço devem ser observadas pelo próprio empregador.
12 - O empregador suporta a totalidade dos encargos com a organização e o funcionamento do serviço de segurança e de saúde no trabalho e demais sistemas de prevenção, incluindo exames de vigilância da saúde, avaliações de exposições, testes e todas as ações necessárias no âmbito da promoção da segurança e saúde no trabalho, sem impor aos trabalhadores quaisquer encargos financeiros.
13 - Para efeitos do disposto no presente artigo, e salvaguardando as devidas adaptações, o trabalhador independente é equiparado a empregador.
14 - Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto nos n.os 1 a 12.
15 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, o empregador cuja conduta tiver contribuído para originar uma situação de perigo incorre em responsabilidade civil».
No concerne as obrigações dos trabalhaores o art. 17.º determina que, constituem obrigações do trabalhador:
«a) Cumprir as prescrições de segurança e de saúde no trabalho estabelecidas nas disposições legais e em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, bem como as instruções determinadas com esse fim pelo empregador;
b) Zelar pela sua segurança e pela sua saúde, bem como pela segurança e pela saúde das outras pessoas que possam ser afetadas pelas suas ações ou omissões no trabalho, sobretudo quando exerça funções de chefia ou coordenação, em relação aos serviços sob o seu enquadramento hierárquico e técnico;
c) Utilizar corretamente e de acordo com as instruções transmitidas pelo empregador, máquinas, aparelhos, instrumentos, substâncias perigosas e outros equipamentos e meios postos à sua disposição, designadamente os equipamentos de proteção coletiva e individual, bem como cumprir os procedimentos de trabalho estabelecidos;
d) Cooperar ativamente na empresa, no estabelecimento ou no serviço para a melhoria do sistema de segurança e de saúde no trabalho, tomando conhecimento da informação prestada pelo empregador e comparecendo às consultas e aos exames determinados pelo médico do trabalho;
e) Comunicar imediatamente ao superior hierárquico ou, não sendo possível, ao trabalhador designado para o desempenho de funções específicas nos domínios da segurança e saúde no local de trabalho as avarias e deficiências por si detetadas que se lhe afigurem suscetíveis de originarem perigo grave e iminente, assim como qualquer defeito verificado nos sistemas de proteção;
f) Em caso de perigo grave e iminente, adotar as medidas e instruções previamente estabelecidas para tal situação, sem prejuízo do dever de contactar, logo que possível, com o superior hierárquico ou com os trabalhadores que desempenham funções específicas nos domínios da segurança e saúde no local de trabalho.
2 - O trabalhador não pode ser prejudicado em virtude de se ter afastado do seu posto de trabalho ou de uma área perigosa em caso de perigo grave e iminente nem por ter adotado medidas para a sua própria segurança ou para a segurança de outrem.
3 - As obrigações do trabalhador no domínio da segurança e saúde nos locais de trabalho não excluem as obrigações gerais do empregador, tal como se encontram definidas no artigo 15.º
4 - Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto na alínea b) do n.º 1».
E, o n.º 5 deste artigo prevê a responsabilidade disciplinar e civil, para o trabalhador que viole culposamente os deveres referidos no n.º 1 ou aquele cuja conduta tiver contribuído para originar uma situação de perigo.

Esta norma tem correspondência ao n.º 15 do art. 15.º que se transcreve: «Sem prejuízo do disposto no número anterior, o empregador cuja conduta tiver contribuído para originar uma situação de perigo incorre em responsabilidade civil».
A questão em concreto que aqui se coloca é saber se a responsabilidade civil consagrada naqueles preceitos é objetiva ou subjetiva.
A quem entenda que quer o artigo 15.º quer o art. 17.º consagram a responsabilidade civil objetiva, ou seja, sem culpa.
Não parece ser essa a interpretação a seguir, já que, o legislador utilizou a expressão «culposamente» no n.º 5 do art. 17.º, para a responsabilidade civil do trabalhador.
Recentemente o Tribunal da Relação do Porto defendeu o entendimento de que a responsabilidade civil em matéria referente a promoção da segurança e saúde no trabalho é subjetiva nas quais o legislador concretiza o requisito da ilicitude na criação de situação de perigo para a segurança e saúde no trabalho.
«A remissão para a responsabilidade civil feita sem restrição tem de ser interpretada como remissão para o instituto em si mesmo e, portanto, para a totalidade dos seus pressupostos; só não deverá ser assim quando os termos da remissão permitirem considerar que o legislador quis afastar alguns desses pressupostos».
E acrescenta, «Se a intenção legislador fosse a de responsabilizar pelo risco o autor do evento gerador do perigo ter-se-ia exprimido melhor usando a expressão normalmente usada nessas situações, dizendo “responde, independentemente de culpa».
Quer isto dizer, que o legislador ao estabelecer a responsabilidade civil cabe ao intérprete nos termos do n.º 3 do art. 9.º do Código Civil que essa responsabilidade depende do preenchimento de todos os pressupostos, designadamente, a culpa.

Assim, em situações em que é afastada a culpa do agente não pode haver responsabilidade civil nos termos do n.º 5 do art. 17.º do DL n.º 102/2009. 

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Confidencialidade de mensagens e de acesso a informação. Art. 22.º do Código do Trabalho Natureza jurídica das mensagens. A prova


O art. 22.º do CT/2009 estabelece que: «O trabalhador goza do direito de reserva e confidencialidade relativamente ao conteúdo das mensagens de natureza pessoal e acesso a informação de carácter não profissional que envie, receba ou consulte, nomeadamente através do correio eletrónico.
E que, «O disposto no número anterior não prejudica o poder de o empregador estabelecer regras de utilização dos meios de comunicação na empresa, nomeadamente do correio eletrónico».
Articulando-se este artigo com o art. 16.º do mesmo diploma legal que determina que: «O empregador e o trabalhador devem respeitar os direitos de personalidade da contraparte, cabendo-lhes, designadamente, guardar reserva quanto à intimidade da vida privada.
E que, «o direito à reserva da intimidade da vida privada abrange quer o acesso, quer a divulgação de aspetos atinentes à esfera íntima e pessoal das partes, nomeadamente relacionados com a vida familiar, afetiva e sexual, com o estado de saúde e com as convicções políticas e religiosas»

Conclui-se que o artigo 22.º tutela a reserva e a confidencialidade relativamente ao conteúdo das mensagens de natureza pessoal, logo, não está no âmbito de aplicação deste artigo, o acesso de informação com carater profissional.
Ao empregador está vedado a intrusão ao conteúdo das mensagens de um trabalhador receba ou envie no deu local de trabalho independentemente da forma em que se concretizam, o que significa dizer que, estão incluídos os e-mails, comunicação por correio eletrónico.
Assim sendo, o empregador ou quem o represente não podem aceder as mensagens de cariz pessoal.
Situação diferente é quando se trata de envio de e-mail cujo o conteúdo tem natureza profissional.
Passo a exemplificar: imagine-se um trabalhador que envia para um outro correio eletrónico (ambos os endereços eletrónicos são de pessoa coletiva – empresa) um e-mail cujo teor reporta a ficheiros com dados ao abrigo do sigilo profissional, designadamente pelo facto de nestes ficheiros constarem informações relativamente ao objeto social da empresa, procedimentos internos, etc…), aqui, não estamos na esfera jurídica do art. 22.º permitindo ao trabalhador em sede de processo disciplinar, invocar a nulidade da prova, por violação do art. 22.º por parte do empregador.
E isto, porque estamos perante uma comunicação de natureza profissional.
Um trabalhador que envie por correio eletrónico do local de trabalho sobre matérias relacionadas com o funcionamento do serviço para outro endereço eletrónico também este de pessoa coletiva, sujeita-se a processo disciplinar cuja sanção é o despedimento com justa causa por violação do dever de lealdade, respeito e urbanidade e segredo profissional/sigilo ao empregador. (art. 128.º do CT/2009).
Não pode o trabalhar em sede de processo disciplinar invocar que o empregador não podia consultar o e-mail visto que nestes casos, o empregador não é considerado terceiro.
O empregador não está obrigado a manter o contrato com um trabalhador em que perdeu a confiança, dai estar preenchido o conceito de justa causa previsto no 351.º do CT/2009.