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domingo, 26 de maio de 2019

Quando o inimigo não existe, há que construí-lo. Relações laborais. Analogia.

Quando o inimigo não existe, há que construí-lo. Relações laborais. Analogia.
Segundo Umberto Eco, «Ter um inimigo é importante, não apenas para definir a nossa identidade, mas também para arranjarmos um obstáculo em relação ao qual seja medido o nosso sistema de valores, e para mostrar, no afronta-lo, o nosso valor. Portanto quando o inimigo não existe, há que construí-lo».
Umberto Eco referia-se as relações entre os Estados ou Nações.
Sem esforço é possível fazer uma analogia entre as relações entre Estados e as relações laborais. (É fazer as devidas adaptações entre o universo macro para o mico).
O autor refere-se à «generosa flexibilidade em eleger-se um inimigo quem quer que não pertencesse ao seu grupo, para se reconhecerem como grupo». Ora, não é frequente que este tipo de situações ocorra nas organizações empresariais?
Quantas situações de facto decorrem nas empresas que se traduzem na grande facilidade de alguns elementos agregados em grupos, elegerem outros como inimigos, em regra, quem não quer pertencer ao grupo gerador de forças para contento de um ou dois, que lideram o processo de manipulação e até demonização do ambiente de trabalho?
Não é um processo complexo, aliás parece ser linear.
Para isso, basta escolher alguém que por qualquer motivo não siga os movimentos de moda. Umberto Eco afirma, «os inimigos são diferentes de nós e comportam-se segundo costumes que não são os nossos».
E acrescenta: «Alguém diferente é estrangeiro. Já nos baixos-relevos romanos os bárbaros aparecem como barbudos e achatados, e a própria designação de bárbaros, como é sabido, alude a um defeito de linguagem e, portanto, de pensamento».
Mas os inimigos não são apenas aqueles que são diferentes, os bárbaros na palavra deste autor, são também «aqueles que alguém tem interesse em representar como ameaçadores, ainda que não nos ameacem diretamente, de modo que é tanto o seu carater ameaçador que faz ressaltar neles a diferença mas é a diferença que se torna sinal de carater ameaçador».
Voltando para a dimensão dos Estados e Nações, «o inimigo não abrange apenas aquele que é de fora, mas aquele que está dentro, entre nós – diríamos o imigrante extracomunitário».
Também o seio das organizações se pode dizer que, o inimigo já não é apenas aquele que quer entrar no mercado de emprego e que em entrevista mostrou ser «capaz» e que criou a dúvida ao recrutador (se este candidato entrar eu terei futuro na empresa?) como aquele que, já no seio da organização empresarial revela ser «capaz» e por isso criou incertezas ao colega que começa a sentir-se ameaçado.
Identificando-se o inimigo, o processo tem continuidade com a adjetivação como sendo:  burro; feio; fétido até monstruoso.
Inicia-se de seguia a estratificação dos indivíduos não por classes profissionais, carreiras e categoria, mas pela perspetiva dos manipuladores.
O processo pode chegar à perseguição. Os leprosos! (Estes são totalmente destruídos para não propagar a peste).
Sempre há a hipótese de se tornar o “patinho feio” que desprezados pelos seus semelhantes se adequam à imagem que estes têm deles.
Melhor ainda, tornar-se protagonista da história e divirta-se a procura da pedra preciosa: a distinguir as pedras verdadeiras das falsas. 

Umberto Eco afirma que «O inimigo não pode ser abolido dos processos civilizacionais. A necessidade é congénita mesmo do homem brando e amigo da paz». 

As transcrições indicadas são do autor Umberto Eco, Construir o Inimigo, escritos ocasionais.