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domingo, 1 de novembro de 2020

Personalidade jurídica. Direitos de personalidade gozam de proteção para além da morte

 Relembrar um homicídio (relato em livro) consubstancia ofensa à honra e bom nome do homicida /falecido?


O n.º 1 do art. 66.º articulado com o n.º 1 do art. 68.º, ambos do Código Civil dispõem que a personalidade jurídica é adquirida com o nascimento completo e com vida e cessa com a morte.

 

Por sua vez, o n.º 1 do art. 71.º determina que os direitos de personalidade gozam ainda de proteção após a morte do seu titular.

 

Assim, de acordo com os normativos do Código Civil ainda que a personalidade cesse com a morte do titular dos direitos, alguns direitos de personalidade – ofensa ilícita e ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral tem a tutela do Direito.

 

A lei visa a proteção das pessoas falecidas contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à respetiva personalidade, física ou moral, em vida e após morte.

 

O direito ao bom nome tem consagração na Lei Fundamental – no capítulo dos direitos, liberdades e garantias, constam: a proteção à cidadania; ao bom nome e reputação; à imagem; à palavra; à reserva da intimidade da vida privada e familiar - art.º 26.º, n.º 1.

 

Por sua vez, o artº 12.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aplicável por força do disposto no artº 8º da CRP, determina que, «ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da lei».

 

Por outro lado, a publicação em livro a relatar o evento (homicídio) encontra igualmente tutela constitucional na liberdade de expressão e informação, prevista genericamente no art.º 37.º da CRP e na específica liberdade de criação cultural e artística, prevista no art.º 42.º da CRP.

 

Também o art.º 19.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece que «todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão».



 

Já o art. 10.º, n.º 1, 1ª parte, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) determina que «qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações ou ideias sem que possa haver ingerência de quaisquer autoridades públicas e sem considerações de fronteiras», sem prejuízo de algumas restrições.


A CEDH prevê-as no art.º 10.º, n.º 2, «o exercício desta liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas pela lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a proteção da saúde ou da moral, a proteção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e a imparcialidade do poder judicial».


No que respeita aos direitos fundamentais, haverá colisão ou conflito sempre que se deva entender que a Constituição protege simultaneamente dois valores ou bens em contradição numa determinada situação concreta (real ou hipotética).

 

Tem sido entendimento que no confronto do direito à honra com o direito de liberdade de expressão, exercido através da imprensa (ou publicação de um livro) se há um qualquer interesse público a prosseguir, haverá eventualmente que privilegiar o direito à informação e a liberdade de expressão em detrimento de outros direitos individuais.

 

Também é entendimento que, «a liberdade de imprensa deva respeitar, no seu exercício, o direito fundamental do bom nome e da reputação, o jornalista não está impedido de noticiar factos verdadeiros ou que tenha como verdadeiros em séria convicção, desde que justificados pelo interesse público na sua divulgação, podendo este direito prevalecer sobre aquele, desde que adequadamente exercido, nomeadamente mediante exercício de um esforço de objetividade com recurso a fontes de informação fidedignas por forma a testar e controlar a veracidade dos factos».


Se o autor na descrição do homicídio o descreve de forma objetiva retratando as circunstância de modo, tempo e lugar não há como dizer que a retratação tenha atingido o bom nome da pessoa falecida e por conseguinte tenha havido um ilícito suscetível de ser indemnizável nos termos da lei civil.

 

Liberdade de expressão, Direito de personalidade, tutela do direito à honra, ofensa à memória de falecido, Ac. TR Guimarães de 22/10/2020.

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