Medidas e aplicação da coima e sanções acessórias. Aplicação da
lei no tempo.
A
Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro, que veio reforçar “as garantias dos
contribuintes e a simplificação processual, alterando a Lei Geral Tributária, o
Código de Procedimento e de Processo Tributário, o Regime Geral das Infrações
Tributárias e outros atos legislativos” e entrou em vigor a 01/01/2022,
conforme dispõe o art. 17.º.
As
alterações ao regime do RGIT no que reporta a medida e aplicação da coima e
sanções acessórias têm relevância, já que, incidem na dispensa, atenuação
especial e redução da coima, ou seja, o legislador alterou as consequências
jurídicas da infração, no sentido de
concretizar e tornar mais objetiva a aplicação daqueles regimes, ao alargar a
sua aplicação às pessoas coletivas, como também, introduzir determinados
condicionalismos para funcionar o regime de redução, nos termos do art. 28.º
-A., que consubstanciam na redução dos valores percentuais da coima, e a
possibilidade de substituição da coima por admoestação.
Considerando-se
que estas alterações traduzem um regime mais favorável face ao regime anterior
é necessário ponderar a aplicabilidade da lei nova aos procedimentos de
contraordenação anteriores a vigência da nova lei.
Quer
isto dizer, que a necessidade de graduar as coimas à luz do novo regime implica
que tenha de existir uma nova decisão administrativa por decisão judicial que é
de conhecimento oficioso.
Delimitada
a questão que se aborda passa-se por analisar cada uma das figuras jurídicas
que sofreram alterações: a dispensa de coima; direito à redução de coimas; e,
atenuação especial de coimas.
Dispensa de coima - artigo
29.º do RGIT
A
lei determina a dispensa da coima quando, nos cinco anos anteriores, o agente não tenha sido condenado por
decisão transitada em julgado, em processo de contraordenação ou de crime por infrações
tributárias, ou beneficiado de dispensa ou de pagamento de coima com redução
nos termos do art. 29.º e 30.º. Aplica-se ainda às situações em que: (i) não
esteja em causa a falta de entrega da prestação tributária; e, (ii) o agente
tenha cumprido as obrigações tributárias que deram origem à infração – al.) e
b) do n.º 2 do art. 29.º.
A dispensa de coima nos termos do n.º 2 do art.
29.º deve ser requerida no prazo concedido para a defesa, devendo a falta
cometida ser regularizada até ao termo daquele prazo.
Direito à redução das coimas – art.
30.º do
RGIT
É possível a redução do valor da coima, no valor
mínimo de 12.5 % e 50%, nas seguintes situações: i) a pedido do agente sem que tenha
sido levantado auto de notícia, recebida participação ou denúncia ou iniciado
procedimento de inspeção tributária – 12,5%; ii) até ao termo do prazo para
apresentação de audição prévia no âmbito de procedimento de inspeção tributária
– 50%.
Este direito está sob
condição:
i)
Nos casos da redução de 12,5% - para
que se verifique, a redução de 12,5 % é necessário que se realize o pagamento
nos 30 dias posteriores à notificação da coima reduzida pela entidade
competente e a regularização da situação tributária do infrator no mesmo prazo;
ii)
Nos casos da redução de 50% - para
que se verifique a redução para 50% é necessário a regularização da situação
tributária do infrator dentro do prazo previsto no n.º 4 do artigo 58.º-A do
Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira, ou
seja, no prazo de 15 dias.
Atenuação especial das coimas - art. 32.º
do RGIT
A coima pode ser
especialmente atenuada a pedido do infrator, no prazo de 30 dias, (prazo
concedido para a defesa) caso este reconheça a sua responsabilidade e, no mesmo
prazo, regularize a situação tributária.
Quando houver lugar à atenuação especial da
coima, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos para metade, não
podendo resultar um valor inferior ao que resultaria da aplicação do artigo
30.º, nem ser inferior a 25 (euro).
A lei permite que a
entidade competente aplique a sanção de admoestação quando a gravidade da
infração é reduzida, tal como, a culpa do agente – n.º 3 do art. 30.º.
A gravidade da infração
resulta da forma como o legislador desenhou o grau de gravidade qualificando-as
como leves, graves ou muito graves.
Regressando ao teor do
nova lei, verifica-se que esta veio a instituir:
i)
A regra de notificação para regularização e
para exercício do direito à redução, que consta do artigo 28.º-A, que não
existia no regime anterior;
ii)
No que reporta a dispensa de
coimas, o art. 29.º passa a prever pessoas coletivas (anteriormente estava
prevista no n.º 4 do mesmo artigo e no 32.º, n.º 1 do RGIT e só previa pessoas
singulares);
iii)
No âmbito do valor das coimas, o
valor das coimas são inferiores;
Aqui
chegados, é de concluir que em matéria contraordenacional como em matéria penal
vigora por imperativo constitucional e
legal a regra da aplicação retroativa da lei mais favorável, nos termos do n.º
4 do art. 29.º da CRP e n.º 2 do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10, (Se a lei vigente ao tempo da prática do facto for
posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo
se este já tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgado
e já executada) aplicável por
força do art. 3.º, alínea b) do RGIT (regime aplicável a título subsidiário - Quanto às contraordenações e
respetivo processamento, é aplicável o regime geral do ilícito de mera
ordenação social).
Esta questão já foi
decidida em inúmeros acórdãos, salientando-se aqui, dois mais recentes do TCA
Norte de 2024:
i)
No primeiro caso, estava em causa a
aplicação a arguida de 75 coimas que dizem respeito à falta de pagamento de
taxas de portagens. A pessoa coletiva interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em
06/02/2023, que julgou improcedente o recurso das decisões de aplicação de
coima. O RCA Norte decidiu que as alterações
introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, no Regime Geral das
Infracções Tributárias, em sede de dispensa, redução e atenuação especial das
coimas, se repercutem na decisão de aplicação e na medida da coima questionada
nos autos – por imposição constitucional e legal do princípio da aplicação
retroactiva da lei nova mais favorável - haverá que, oficiosamente, determinar
a remessa do processo à autoridade administrativa para que esta reveja ou
renove tal decisão em conformidade com essas alterações em vigor, introduzidas
pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro. () Ac. TCA Norte de 27/06/2024, p. n.º 0162/22.6BEMDL
ii)
No segundo
caso, a reportar a medida concreta da coima aplicada, o TCA Norte decidiu: em
matéria penal, como em matéria contraordenacional, vigora por imperativo
constitucional e legal a regra da aplicação retroativa da lei mais favorável –
cfr. artigos 29.º, n.º 4 da CRP, 2.º, n.º 4 do Código Penal e 3.º, n.º 2 do
Decreto-Lei n.º 433/82, aplicável ex vi artigo 3.º, alínea b) do RGIT
aplicável ex vi artigo
18.º da Lei n.º 26/2006, de 30 de Junho. Daí que o facto de em causa nos autos
estarem contraordenações praticadas em data anterior à da entrada em vigor da
Lei nova não constitui obstáculo a essa aplicação se esta lei se revelar mais
favorável e enquanto não ocorrer decisão com trânsito em julgado. () Ac. TCA Norte
de 28/11/2024, p. n.º 00031/22.0BEVIS q eu se destaca o sumário.
Assim sendo, nestas situações concretas, em que a lei nova é mais favorável, o
Tribunal impõe a baixa dos autos à
Autoridade Administrativa para que esta tenha a oportunidade de rever ou
renovar a decisão de aplicação da coima, em conformidade com o novo quadro
legal.