Seguidores

domingo, 19 de janeiro de 2025

Medidas e aplicação da coima e sanções acessórias. Aplicação da lei no tempo.

 A Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro, que veio reforçar “as garantias dos contribuintes e a simplificação processual, alterando a Lei Geral Tributária, o Código de Procedimento e de Processo Tributário, o Regime Geral das Infrações Tributárias e outros atos legislativos” e entrou em vigor a 01/01/2022, conforme dispõe o art. 17.º.

 As alterações ao regime do RGIT no que reporta a medida e aplicação da coima e sanções acessórias têm relevância, já que, incidem na dispensa, atenuação especial e redução da coima, ou seja, o legislador alterou as consequências jurídicas da infração, no sentido de concretizar e tornar mais objetiva a aplicação daqueles regimes, ao alargar a sua aplicação às pessoas coletivas, como também, introduzir determinados condicionalismos para funcionar o regime de redução, nos termos do art. 28.º -A., que consubstanciam na redução dos valores percentuais da coima, e a possibilidade de substituição da coima por admoestação.

Considerando-se que estas alterações traduzem um regime mais favorável face ao regime anterior é necessário ponderar a aplicabilidade da lei nova aos procedimentos de contraordenação anteriores a vigência da nova lei.

Quer isto dizer, que a necessidade de graduar as coimas à luz do novo regime implica que tenha de existir uma nova decisão administrativa por decisão judicial que é de conhecimento oficioso.

Delimitada a questão que se aborda passa-se por analisar cada uma das figuras jurídicas que sofreram alterações: a dispensa de coima; direito à redução de coimas; e, atenuação especial de coimas.

 

Dispensa de coima - artigo 29.º do RGIT

 

A lei determina a dispensa da coima quando, nos cinco anos anteriores, o agente não tenha sido condenado por decisão transitada em julgado, em processo de contraordenação ou de crime por infrações tributárias, ou beneficiado de dispensa ou de pagamento de coima com redução nos termos do art. 29.º e 30.º. Aplica-se ainda às situações em que: (i) não esteja em causa a falta de entrega da prestação tributária; e, (ii) o agente tenha cumprido as obrigações tributárias que deram origem à infração – al.) e b) do n.º 2 do art. 29.º.

A dispensa de coima nos termos do n.º 2 do art. 29.º deve ser requerida no prazo concedido para a defesa, devendo a falta cometida ser regularizada até ao termo daquele prazo.

Direito à redução das coimas – art. 30.º do RGIT

 É possível a redução do valor da coima, no valor mínimo de 12.5 % e 50%, nas seguintes situações: i) a pedido do agente sem que tenha sido levantado auto de notícia, recebida participação ou denúncia ou iniciado procedimento de inspeção tributária – 12,5%; ii) até ao termo do prazo para apresentação de audição prévia no âmbito de procedimento de inspeção tributária – 50%.

Este direito está sob condição:

i)                    Nos casos da redução de 12,5% - para que se verifique, a redução de 12,5 % é necessário que se realize o pagamento nos 30 dias posteriores à notificação da coima reduzida pela entidade competente e a regularização da situação tributária do infrator no mesmo prazo;

ii)                  Nos casos da redução de 50% - para que se verifique a redução para 50% é necessário a regularização da situação tributária do infrator dentro do prazo previsto no n.º 4 do artigo 58.º-A do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira, ou seja, no prazo de 15 dias.

 

Atenuação especial das coimas  - art. 32.º do RGIT

 A coima pode ser especialmente atenuada a pedido do infrator, no prazo de 30 dias, (prazo concedido para a defesa) caso este reconheça a sua responsabilidade e, no mesmo prazo, regularize a situação tributária.

 Quando houver lugar à atenuação especial da coima, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos para metade, não podendo resultar um valor inferior ao que resultaria da aplicação do artigo 30.º, nem ser inferior a 25 (euro).

 A lei permite que a entidade competente aplique a sanção de admoestação quando a gravidade da infração é reduzida, tal como, a culpa do agente – n.º 3 do art. 30.º.

A gravidade da infração resulta da forma como o legislador desenhou o grau de gravidade qualificando-as como leves, graves ou muito graves.

Regressando ao teor do nova lei, verifica-se que esta veio a instituir:

i)                    A regra de notificação para regularização e para exercício do direito à redução, que consta do artigo 28.º-A, que não existia no regime anterior;

ii)                   No que reporta a dispensa de coimas, o art. 29.º passa a prever pessoas coletivas (anteriormente estava prevista no n.º 4 do mesmo artigo e no 32.º, n.º 1 do RGIT e só previa pessoas singulares);

iii)                  No âmbito do valor das coimas, o valor das coimas são inferiores;

Aqui chegados, é de concluir que em matéria contraordenacional como em matéria penal vigora por imperativo constitucional e legal a regra da aplicação retroativa da lei mais favorável, nos termos do n.º 4 do art. 29.º da CRP e n.º 2 do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10, (Se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo se este já tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgado e já executada) aplicável por força do art. 3.º, alínea b) do RGIT (regime aplicável a título subsidiário - Quanto às contraordenações e respetivo processamento, é aplicável o regime geral do ilícito de mera ordenação social).

Esta questão já foi decidida em inúmeros acórdãos, salientando-se aqui, dois mais recentes do TCA Norte de 2024:

i)                    No primeiro caso, estava em causa a aplicação a arguida de 75 coimas que dizem respeito à falta de pagamento de taxas de portagens. A pessoa coletiva interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em 06/02/2023, que julgou improcedente o recurso das decisões de aplicação de coima. O RCA Norte decidiu que as alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, no Regime Geral das Infracções Tributárias, em sede de dispensa, redução e atenuação especial das coimas, se repercutem na decisão de aplicação e na medida da coima questionada nos autos – por imposição constitucional e legal do princípio da aplicação retroactiva da lei nova mais favorável - haverá que, oficiosamente, determinar a remessa do processo à autoridade administrativa para que esta reveja ou renove tal decisão em conformidade com essas alterações em vigor, introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro. ()  Ac. TCA Norte de 27/06/2024, p. n.º 0162/22.6BEMDL

ii)                  No segundo caso, a reportar a medida concreta da coima aplicada, o TCA Norte decidiu: em matéria penal, como em matéria contraordenacional, vigora por imperativo constitucional e legal a regra da aplicação retroativa da lei mais favorável – cfr. artigos 29.º, n.º 4 da CRP, 2.º, n.º 4 do Código Penal e 3.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, aplicável ex vi artigo 3.º, alínea b) do RGIT aplicável ex vi artigo 18.º da Lei n.º 26/2006, de 30 de Junho. Daí que o facto de em causa nos autos estarem contraordenações praticadas em data anterior à da entrada em vigor da Lei nova não constitui obstáculo a essa aplicação se esta lei se revelar mais favorável e enquanto não ocorrer decisão com trânsito em julgado. () Ac. TCA Norte de 28/11/2024, p. n.º 00031/22.0BEVIS q eu se destaca o sumário.



Assim sendo, nestas situações concretas, em que a lei nova é mais favorável, o Tribunal impõe  a baixa dos autos à Autoridade Administrativa para que esta tenha a oportunidade de rever ou renovar a decisão de aplicação da coima, em conformidade com o novo quadro legal.


Sem comentários:

Enviar um comentário