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domingo, 19 de janeiro de 2025

 Contagem dos dias de faltas por morte de familiar?


Este tema continua a ter pareceres e interpretações divergentes. Se uns entendem que o computo dos dias é efetuado em dias consecutivos outros têm entendimento diferente no sentido de se contabiliza apenas os dias em que o trabalhador está obrigado a prestar a sua atividade. 

Apesar de se compreender as duas posições só a segunda posição parece que melhor  se coaduna com a redação do normativo que consta quer no CT quer na LGTFP.

Surge novamente o tema, já que, no dia 15 deste mês, o "economia ao minuto" abordou o tema indicando que, «uma ação judicial instaurada em abril de 2023 no Tribunal do Trabalho e no Tribunal Administrativo, em que o STEC alegava que a CGD considerava "erradamente, e em prejuízo dos trabalhadores, que os períodos de faltas justificadas, previstos na lei, para os casos de falecimento de parentes ou afins do trabalhador, englobam os dias de descanso semanal e feriados». 

"Vem agora o Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa dar razão ao STEC, numa sentença bastante esclarecedora e que, apesar de apenas se aplicar aos trabalhadores da CGD com contrato administrativo de provimento, é sem dúvida um exemplo e uma referência cujo entendimento deveria ser respeitado pela empresa", sustenta o sindicato num comunicado divulgado hoje. (...) 

A notícia citando a sentença esclarece que, "o Tribunal Administrativo de Lisboa refere que, "tendo por base a interpretação corretiva da norma, o que tem sido o entendimento da Administração Pública [e que tem sido a solução dada aos casos da vida real no âmbito das relações de emprego público [e que foi, como vimos, o entendimento do Conselho Superior da Magistratura, da ACT e da Provedora de Justiça - que inclusive elaborou recomendação nesse sentido], deve considerar-se que só existe falta quando existe a obrigação do trabalhador prestar a sua atividade laboral, seja em dias úteis seja em dias não úteis".

Um acordão recente (Ac. TR Lisboa de 23/10/2024) veio a decidir de forma diferente e em contrário com as entidades supra identificadas. (Sobre este acordão irei escreve já que discordo de alguns argumentos explanados na medida em que alguns permitem concluir o contrário bastando para isso colocar a mesmo situação mas de forma inversa.

No sentido de que os dias que não sejam de trabalho (sabado, domingo feriado, descanso semanal obrigatório ou complementar) não contam para  dias de dispensa por motivo de morte de familiar ver: Condições do Trabalho (ACT), a Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP) e a Direção-Geral da Administração Escolar (DGAE),  a provedora de Justiça. 

Consultar: Ac. TR Porto, de 13/07/2022

 

 Comissão de serviço em regime de substituição. Direito a indemnização. Regime da L n.º Lei n.º 2/2004 - art. 26.º


De uma ação interposta para pedir a anulação Da decisão do Presidente da Câmara Municipal de Pombal, que indeferiu o seu pedido de atribuição de indemnização pela cessação de comissão de serviço e de condenação à atribuição da sobredita indemnização, no valor de € 13.506,92, acrescido de juros de mora calculados desde a data do vencimento até efetivo e integral pagamento, veio o Tribunal Central Administrativo do Sul decidir a manter a decisão de primeira instância com uma justificação que há muito defendia.

A justificação é clara e inequivoca com se pode ver pela transcrição de parte do teor do acordão: 

«Determina o artigo 26.º, n.º 1, da Lei 2/2004, de 15 de janeiro, alterada Lei n.º 49/2012, de 29 de agosto, que “... 1 - Quando a cessação da comissão de serviço se fundamente na extinção ou reorganização da unidade orgânica ou na necessidade de imprimir nova orientação à gestão dos serviços, os dirigentes têm direito a uma indemnização desde que contem, pelo menos, 12 meses seguidos de exercício de funções...”. A ideia subjacente a este requisito é a instituição de um verdadeiro período probatório para o cargo dirigente provido por concurso, à semelhança do que sucede quando se celebra um contrato de trabalho em funções públicas sem termo. Efetivamente, o período experimental é o período inicial da prestação de trabalho dos trabalhadores com vínculo de contrato em funções públicas, destinando-se a comprovar se o trabalhador possui as aptidões indispensáveis para o posto de trabalho. De resto, o n.º 2 do artigo 45.º da LTFP distingue duas modalidades de período experimental:
a) o período experimental do vínculo; e
b) o período experimental da função.

O período experimental do vínculo respeita ao período inicial de execução do vínculo de emprego público; o período experimental da função respeita ao período inicial de execução do contrato em nova função por parte de trabalhador que já é titular de um vínculo de emprego público por tempo indeterminado.
Pois bem, este artigo 26.º, n.º 1, da Lei 2/2004, de 15 de janeiro, alterada Lei n.º 49/2012, de 29 de agosto, tem implícita essa ideia de período experimental do cargo dirigente, daí se compreendendo a razão pela qual este normativo se reporta expressamente à imposição do dirigente, para poder ganhar o direito a uma indemnização, ter de ter prestado 12 meses seguidos de exercício de funções.

Impõe-se, portanto, o exercício efetivo daquelas funções dirigentes [basta atender ao elemento literal da norma].

Por tal razão, o facto de o Recorrido ter sido suspenso daquelas funções antes de perfazer o seu exercício em 12 meses seguidos obsta à percepção da indemnização consagrada no mesmo artigo 26.º da Lei 2/2004, de 15 de janeiro, alterada Lei n.º 49/2012, de 29 de agosto.

Quanto à questão de, em momento antecedente, o mesmo Recorrido ter exercido tais funções em regime de substituição, o Tribunal ad quem não tem dúvidas em concluir que não podem ser contabilizadas pera os efeitos pretendidos, ou seja, para o recebimento da citada indemnização.

E porquê?
Pois bem, a possibilidade de nomeação para o exercício de cargos dirigentes em regime de substituição é uma situação excecional e que está limitada no tempo [exatamente por ser excecional], não dando lugar a qualquer direito ao exercício de comissão de serviço por 3 anos, como resulta do normal recrutamento desses cargos, no respeito pelo concurso público, como impõe o artigo 20.º e seguintes da Lei 2/2004, de 15 de janeiro, alterada Lei n.º 49/2012, de 29 de agosto.

Ora, a indemnização consagrada no artigo 26.º do citado Estatuto dos Cargos Dirigentes não pode deixar de ser enquadrada no âmbito da constituição de um vínculo de emprego público próprio, in casu, a comissão de serviço, com uma duração determinada de 3 anos, na sequência do respetivo concurso público. Aliás, a indemnização, de resto, é calculada precisamente atendendo à remuneração que, no período de 3 anos, aquela nomeação como dirigente lhe daria direito – vide artigo 26.º, n.º 2 e 3, do sobredito diploma legal.

A nomeação em regime de substituição, apesar de, muitas vezes, abusivamente utilizada, apenas pode ocorrer se for expectável uma ausência ou impedimento do respetivo titular que persistam por mais de 60 dias, ou em caso de vacatura do lugar. A substituição cessará, no máximo, passados 90 dias sobre a data da vacatura do lugar, salvo se estiver em curso procedimento tendente à designação de novo titular, pelo que, sendo um regime de exceção, porque fora das regras da concorrência, a comissão de serviço de 3 anos apenas pode resultar na sequência de um concurso livre, aberto e transparente.

Dito isto, facilmente se percebe que o período ocorrido no exercício de funções dirigentes, em regime de substituição, não conta para os efeitos do artigo 26.º, n.º 1 e 2, já citados, tanto mais que dificilmente isso se compaginaria bem com a ratio precisamente do n.º 2 referido, pois que, apenas após um procedimento concursal, o exercício o cargo dirigente assume o prazo de duração de 3 anos.
A nomeação de um dirigente, se for feita em regime de substituição, pode cessar a todo tempo, sem necessidade de fundamento, inexistindo, aqui, quaisquer expectativas quanto à durabilidade deste frágil vínculo laboral público que, por isso, deve ser utilizado a título absolutamente excepcional.»

Assim sendo, a cessação da comissão de serviço antes do termo gera o direito de indemnização se e quando verificados os seus presuspostos, nos termos do n.º 1 do art. 26.º do citado diploma legal, sendo certo que o regime em substituição não admite indemnização.

Consultar: Ac. TCA Sul de 03/10/2024, p. 1108/20.1BELRA
 





 

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Medidas e aplicação da coima e sanções acessórias. Aplicação da lei no tempo.

 A Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro, que veio reforçar “as garantias dos contribuintes e a simplificação processual, alterando a Lei Geral Tributária, o Código de Procedimento e de Processo Tributário, o Regime Geral das Infrações Tributárias e outros atos legislativos” e entrou em vigor a 01/01/2022, conforme dispõe o art. 17.º.

 As alterações ao regime do RGIT no que reporta a medida e aplicação da coima e sanções acessórias têm relevância, já que, incidem na dispensa, atenuação especial e redução da coima, ou seja, o legislador alterou as consequências jurídicas da infração, no sentido de concretizar e tornar mais objetiva a aplicação daqueles regimes, ao alargar a sua aplicação às pessoas coletivas, como também, introduzir determinados condicionalismos para funcionar o regime de redução, nos termos do art. 28.º -A., que consubstanciam na redução dos valores percentuais da coima, e a possibilidade de substituição da coima por admoestação.

Considerando-se que estas alterações traduzem um regime mais favorável face ao regime anterior é necessário ponderar a aplicabilidade da lei nova aos procedimentos de contraordenação anteriores a vigência da nova lei.

Quer isto dizer, que a necessidade de graduar as coimas à luz do novo regime implica que tenha de existir uma nova decisão administrativa por decisão judicial que é de conhecimento oficioso.

Delimitada a questão que se aborda passa-se por analisar cada uma das figuras jurídicas que sofreram alterações: a dispensa de coima; direito à redução de coimas; e, atenuação especial de coimas.

 

Dispensa de coima - artigo 29.º do RGIT

 

A lei determina a dispensa da coima quando, nos cinco anos anteriores, o agente não tenha sido condenado por decisão transitada em julgado, em processo de contraordenação ou de crime por infrações tributárias, ou beneficiado de dispensa ou de pagamento de coima com redução nos termos do art. 29.º e 30.º. Aplica-se ainda às situações em que: (i) não esteja em causa a falta de entrega da prestação tributária; e, (ii) o agente tenha cumprido as obrigações tributárias que deram origem à infração – al.) e b) do n.º 2 do art. 29.º.

A dispensa de coima nos termos do n.º 2 do art. 29.º deve ser requerida no prazo concedido para a defesa, devendo a falta cometida ser regularizada até ao termo daquele prazo.

Direito à redução das coimas – art. 30.º do RGIT

 É possível a redução do valor da coima, no valor mínimo de 12.5 % e 50%, nas seguintes situações: i) a pedido do agente sem que tenha sido levantado auto de notícia, recebida participação ou denúncia ou iniciado procedimento de inspeção tributária – 12,5%; ii) até ao termo do prazo para apresentação de audição prévia no âmbito de procedimento de inspeção tributária – 50%.

Este direito está sob condição:

i)                    Nos casos da redução de 12,5% - para que se verifique, a redução de 12,5 % é necessário que se realize o pagamento nos 30 dias posteriores à notificação da coima reduzida pela entidade competente e a regularização da situação tributária do infrator no mesmo prazo;

ii)                  Nos casos da redução de 50% - para que se verifique a redução para 50% é necessário a regularização da situação tributária do infrator dentro do prazo previsto no n.º 4 do artigo 58.º-A do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira, ou seja, no prazo de 15 dias.

 

Atenuação especial das coimas  - art. 32.º do RGIT

 A coima pode ser especialmente atenuada a pedido do infrator, no prazo de 30 dias, (prazo concedido para a defesa) caso este reconheça a sua responsabilidade e, no mesmo prazo, regularize a situação tributária.

 Quando houver lugar à atenuação especial da coima, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos para metade, não podendo resultar um valor inferior ao que resultaria da aplicação do artigo 30.º, nem ser inferior a 25 (euro).

 A lei permite que a entidade competente aplique a sanção de admoestação quando a gravidade da infração é reduzida, tal como, a culpa do agente – n.º 3 do art. 30.º.

A gravidade da infração resulta da forma como o legislador desenhou o grau de gravidade qualificando-as como leves, graves ou muito graves.

Regressando ao teor do nova lei, verifica-se que esta veio a instituir:

i)                    A regra de notificação para regularização e para exercício do direito à redução, que consta do artigo 28.º-A, que não existia no regime anterior;

ii)                   No que reporta a dispensa de coimas, o art. 29.º passa a prever pessoas coletivas (anteriormente estava prevista no n.º 4 do mesmo artigo e no 32.º, n.º 1 do RGIT e só previa pessoas singulares);

iii)                  No âmbito do valor das coimas, o valor das coimas são inferiores;

Aqui chegados, é de concluir que em matéria contraordenacional como em matéria penal vigora por imperativo constitucional e legal a regra da aplicação retroativa da lei mais favorável, nos termos do n.º 4 do art. 29.º da CRP e n.º 2 do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10, (Se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo se este já tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgado e já executada) aplicável por força do art. 3.º, alínea b) do RGIT (regime aplicável a título subsidiário - Quanto às contraordenações e respetivo processamento, é aplicável o regime geral do ilícito de mera ordenação social).

Esta questão já foi decidida em inúmeros acórdãos, salientando-se aqui, dois mais recentes do TCA Norte de 2024:

i)                    No primeiro caso, estava em causa a aplicação a arguida de 75 coimas que dizem respeito à falta de pagamento de taxas de portagens. A pessoa coletiva interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em 06/02/2023, que julgou improcedente o recurso das decisões de aplicação de coima. O RCA Norte decidiu que as alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, no Regime Geral das Infracções Tributárias, em sede de dispensa, redução e atenuação especial das coimas, se repercutem na decisão de aplicação e na medida da coima questionada nos autos – por imposição constitucional e legal do princípio da aplicação retroactiva da lei nova mais favorável - haverá que, oficiosamente, determinar a remessa do processo à autoridade administrativa para que esta reveja ou renove tal decisão em conformidade com essas alterações em vigor, introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro. ()  Ac. TCA Norte de 27/06/2024, p. n.º 0162/22.6BEMDL

ii)                  No segundo caso, a reportar a medida concreta da coima aplicada, o TCA Norte decidiu: em matéria penal, como em matéria contraordenacional, vigora por imperativo constitucional e legal a regra da aplicação retroativa da lei mais favorável – cfr. artigos 29.º, n.º 4 da CRP, 2.º, n.º 4 do Código Penal e 3.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, aplicável ex vi artigo 3.º, alínea b) do RGIT aplicável ex vi artigo 18.º da Lei n.º 26/2006, de 30 de Junho. Daí que o facto de em causa nos autos estarem contraordenações praticadas em data anterior à da entrada em vigor da Lei nova não constitui obstáculo a essa aplicação se esta lei se revelar mais favorável e enquanto não ocorrer decisão com trânsito em julgado. () Ac. TCA Norte de 28/11/2024, p. n.º 00031/22.0BEVIS q eu se destaca o sumário.



Assim sendo, nestas situações concretas, em que a lei nova é mais favorável, o Tribunal impõe  a baixa dos autos à Autoridade Administrativa para que esta tenha a oportunidade de rever ou renovar a decisão de aplicação da coima, em conformidade com o novo quadro legal.


terça-feira, 23 de julho de 2024

 

Disciplinar (Direito laboral público ou privado)

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segunda-feira, 24 de junho de 2024

 Despedimento. Conceito de justa causa: nexo de “imediação” logica e nexo “cronológico”

O conceito de justa causa está formulado no n.º 1 do art. 351.º do CT, e traduz-se num comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

O artigo apresenta um conjunto de factos que consubstanciam “justa causa” a título meramente exemplificativo, e por isso, outros comportamentos podem constituir “justa causa” de despedimento.

Consta no citado artigo algumas situações que podem configurar “justa causa”, a saber:

- Desobediência ilegítima às ordens dadas por responsáveis hierarquicamente superiores;

- Violação de direitos e garantias de trabalhadores da empresa;

- Provocação repetida de conflitos com trabalhadores da empresa;

- Desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, de obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho a que está afeto;

- Lesão de interesses patrimoniais sérios da empresa;

- Falsas declarações relativas à justificação de faltas;

- Faltas não justificadas ao trabalho que determinem diretamente prejuízos ou riscos graves para a empresa, ou cujo número atinja, em cada ano civil, cinco seguidas ou 10 interpoladas, independentemente de prejuízo ou risco;

- Falta culposa de observância de regras de segurança e saúde no trabalho;

 - Prática, no âmbito da empresa, de violências físicas, injúrias ou outras ofensas punidas por lei sobre trabalhador da empresa, elemento dos corpos sociais ou empregador individual não pertencente a estes, seus delegados ou representantes;

- Sequestro ou em geral crime contra a liberdade das pessoas referidas na alínea anterior;

- Incumprimento ou oposição ao cumprimento de decisão judicial ou administrativa;

- Reduções anormais de produtividade.

A entidade empregadora na apreciação da “justa causa” deve atender as várias circunstâncias que circunscrevem a situação de facto, designadamente, o quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros.

Portanto, o despedimento por iniciativa da entidade empregadora por facto imputável ao trabalhador (culpa do trabalhador) tem sempre subjacente a – justa causa compatibilizando-se com a proibição de despedimentos sem justa causa enquanto garantia do trabalhador – art. 338.º do CT/2009.

Assim sendo, o despedimento por facto imputável ao trabalhador (art. 351.º) impõe que a situação de facto seja subsumível na cláusula geral (n.º 1) sendo esta aferida nos termos do n.º 3.

Dito de outro modo e seguindo-se a doutrina e jurisprudência, a conceito de justa causa exige a presença de quatro requisitos:

- Que exista um comportamento culposo do trabalhador – elemento de natureza subjetiva:

- Impossibilidade de subsistência da relação laboral – elemento de natureza objetiva;

- Nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade de subsistência da relação laboral, ou seja, deve estar presente um nexo de “imediação” logica conforme expressa a lei - comportamento que torne imediatamente impossível , isto é, um nexo cronológico que demonstre em concreto que a impossibilidade da manutenção do vínculo é imediata sem a possibilidade de se protelar no tempo, sob pena de se perder o efeito prático que se pretende com a norma.

Este último requisito é facilmente percetível com o seguinte exemplo: o (A) praticou determinado facto que colocaria em causa o vínculo laboral mas a entidade empregadora mesmo sabendo dos factos /gravidade decide reagir passados seis meses após o conhecimento dos factos. A inercia da entidade empregadora é contrária a imposição legal que se traduz numa reação imediata, conforme resulta do instituto da caducidade que obriga ao empregador agir nos 60 dias após o conhecimento da infração pelo empregador ou quando a falta de reação superar os 30 dias entre a suspeita da existência de comportamentos irregulares e o início do inquérito, (352.º do CT/2009) ou ainda, se não proferir a decisão de despedimento no prazo de 30 dias, após a receção dos parecer prévios exigidos nos termos do n.º 5 do art. 356.º do CT/2009.

Assim, sempre que sejam ultrapassados os prazos previstos na lei, ficando a ideia de ter existido inercia por parte da entidade empregadora em agir disciplinarmente contra o trabalhador em tempo útil, o contrato de trabalho mantem-se e por isso perde-se a “reação imediata” presente no conceito de “justa causa” e por conseguinte não é possível argumentar-se a “existência de crise contratual” para se concluir pela “impossibilidade de manutenção do vínculo laboral”.

Aqui chegados, para o sucesso de um processo disciplinar com vista ao despedimento é de extrema importância conferir a presença de todos os elementos que pressupõem o conceito de “justa causa”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

quinta-feira, 6 de junho de 2024

 Regime de exclusividade com 42 horas semanais. Carreira especial médica. Pressupostos de atribuição e cessação (Regime previsto no Dl n.º 73/90 atualmente revogado). Responsabilidade civil extracontratual do Estado

 O DL n.º 73/90 de 06/03 1 teve poucas alterações e esteve em vigor durante muitos anos e por isso ainda é com alguma frequência que surgem conflitos judiciais a correr nos Tribunais Administrativos o que justifica a sua abordagem.

Aborda-se o tema numa perspetiva de responsabilidade civil pelo incumprimento das normas referentes à carga horária semanal no caso concreto do regime de dedicação exclusiva com 42 horas semanais e a confusão que se criou com a publicação de dois diplomas legais referentes à carga horária de trabalho semanal na Administração Pública.

 Regime de tempo de trabalho aplicável aos médicos com contratos de trabalho em funções públicas inseridos no SNS

No que respeita à carga horária dos médicos da carreira especial (vinculados à AP por contrato de trabalho em funções públicas) de forma sumária, dir-se-á que a revisão do tempo de trabalho prevista no DL n.º 177/2009 traduziu-se no seguinte: o período normal de trabalho passou a ser de 40 horas semanais; e no que reporta ao regime transitório, os médicos por opção transitavam para as 40 horas semanais ou seja, as modalidades de horários ao abrigo do DL n.º 73/90 mantinham-se em vigor se não existisse intervenção do interessado no sentido de alterar a carga horária praticada. 2

A possibilidade da manutenção de direitos adquiridos no âmbito da dedicação exclusiva com 42 horas incluía a regra da redução da carga horária semanal conforme disposição legal: os médicos com idade superior a 55 anos de idade em regime de dedicação exclusiva há, pelo menos 5 anos, com 42 horas/s, continuam a poder usufruir, sem perda de regalias da redução de uma hora em cada ano no horário de trabalho até perfazer às 35 horas semanais. 3

O regime previsto no DL n.º 73/90 identificava duas modalidades de regime de trabalho: o tempo completo a corresponder às 35 horas semanais e a dedicação exclusiva corresponder às 42 horas semanais. Este regime eram exclusivo das carreiras de clínica geral e hospitalar. 4

 A atribuição do regime de dedicação exclusiva dependia de dois pressupostos essenciais:

- Intervenção do trabalhador no sentido de manifestar disponibilidade para prestar atividade em serviço de urgência ou consulta externa pelo período mínimo de cinco anos;

- Comprovado interesse público

A manutenção do exercício profissional em exclusividade com 42 horas implicava a manutenção dos pressupostos que lhe deram origem anteriormente identificados.

Já, a cessação deste regime operava da seguinte forma: 5

- Intervenção da entidade empregadora - deficiente cumprimento das obrigações do médico;

- Intervenção do médico – vontade de fazer cessar aquele regime com aviso prévio de 60 dias, sem prejuízo do compromisso assumido do exercício profissional ser de pelo menos 5 anos.

Do regime assim instituído, dir-se-ia que a entidade empregadora só o podia fazer cessar em duas situações específicas: incumprimento/cumprimento defeituoso das obrigações por parte do médico ou alterações das circunstancias de facto, tal como, o médico deixar de prestar efetivamente funções no serviço de urgência ou nas consultas externas.

Quer isto dizer que, nos casos de mobilidade o médico manteria o direito da exercer o mesmo regime desde que, se tenha mantido a prestação de atividade em serviços de urgência ou consulta externa. O regime da exclusividade com 42 horas assente no principio do interesse público inerente as exigências funcionais do serviço de urgência e da consulta externa.

Assim, qualquer decisão da entidade empregadora em fazer cessar o regime de exclusividade fora dos motivos legalmente previstos consubstancia incumprimento da entidade empregadora.

 

Efeitos da alteração prevista no L n.º 68/2013, de 29/08 e do L n.º 18/2016. Erro interpretativo

A carga horária na Administração Pública foi objeto de duas alterações com a publicação da L n.º 68/2013 e da L n.º 18/2016.

 O primeiro diploma estabelecia a duração do período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas com a carga horaria de 40 horas semanais e o segundo veio a consagrar 35 horas semanais, revogando o regime anterior.

A questão que se coloca é saber se estes diplomas têm implicações na carga horária semanal dos médicos. A pergunta tem razão de ser pelo facto de terem existido instituições que entenderam aplicar os diplomas à carreira especial médica.

A resposta é negativa. Este erro interpretativo tem consequências legais de natureza económica. A explicação é simples.

Desde logo, não se deve confundir duas carreiras distintas em que uma reporta a carreira de regime geral e a outra reporta a carreira especial. As normas do regime geral têm caráter subsidiário face ao regime especial, o qul se inclui o regime da carreira médica especial.

Por outro lado, o próprio diploma no seu art. 2.º a dispor, “o disposto no n.º 1 não prejudica a existência de períodos normais de trabalho superiores, previstos em diploma próprio». O mesmo se diga do diploma de 2016.

Deste modo, não margem para dúvidas sobre a não aplicabilidade do regime geral à carreira especial médica.

Desta forma, não pode a entidade empregadora pública justificar que as horas efetuadas por um médico para além das 40 horas semanais ou 35 h/s são consideradas trabalho extraordinário e que não tendo sido autorizadas não tem a obrigação de as pagar.

Quer isto dizer, que a entidade empregadora ao não pagar o valor correspondente a exclusividade com 42 horas está a incorrer em incumprimento.

 

Cessação do regime da exclusividade com 42 horas por iniciativa do empregador público

Aqui chegados, coloca-se ainda outra questão, que é de saber se o regime de exclusividade com 42 horas plena pode cessar mesmo que se mantenha os respetivos pressupostos e se a resposta for em sentido negativo quais os direitos dos profissionais.

Como já foi oportuno explicar, a manutenção do regime de exclusividade com 42 horas não cessa enquanto se mantiverem os seus pressupostos não podendo a entidade empregadora deixar de observar os pedidos da redução da carga horária de médico com idade superior a 55 anos.

Assente que o médico em exclusividade com 42 horas tem de prestar 42 horas semanais e ao perfazer os 55 anos de idade pode requerer a redução de uma hora por cada ano de trabalho até chegar as 35 horas semanais, a entidade empregadora entra em incumprimento quando nega esse direito.

O incumprimento da entidade empregadora implica o direito à compensação. O direito à compensação pelo trabalho prestado para além das 35 horas de trabalho semanal. Ou seja, o médico deve receber as diferenças remuneratórias a corresponder ao regime das 42 h/semanais em relação as 35 horas que lhe foram pagas.

De salientar ainda, o direito à redução de uma hora por cada ano de trabalho no regime de exclusividade com 42 horas.

Já se teve a oportunidade de salientar que esta modalidade de horário permitia que o médico com mais 55 anos de idade pudesse reduzir uma hora por cada ano até atingir as 35 horas sem redução da remuneração. Bastava requerer. Tendo o médico direito à redução das horas com referencia as 42 horas semanais e tendo esse direito sido indeferido por a entidade empregadora entender que o médico por efeito legal estava abrangido ao regime das 35 horas basta que se prove que o médico prestou as 42 horas para que se verifique um dano na esfera jurídica do trabalhador.

Indeferimento da redução de horário e a responsabilidade civil extracontratual do Estado

Por cada pedido de redução de horário e respetivo indeferimento constituem um ato jurídico ilícito, já que, cada indeferimento consubstancia uma decisão contrária ao direito.

Assim, sob o ponto de vista da responsabilidade civil por ato de Administração, basta que se verifique o nexo de causalidade entre o ilícito e o dano. Ora, se da aplicação correta do regime levaria a que o médico trabalhasse no primeiro ano menos uma hora, no segundo ano menos duas horas e assim sucessivamente, tendo este prestado o horário sem a devida redução houve um prejuízo patrimonial.

O prejuízo patrimonial deve ser valorado tendo como referencial o valor hora da remuneração atribuída ao regime de exclusividade com 42 horas que mais não é do que o correspondente ao valor do enriquecimento que a entidade empregadora obteve.

No âmbito da responsabilidade civil extracontratual do Estado a L n.º 67/2007, de 31/12, estabelece a presunção de culpa leve na prática de atos jurídicos ilícitos. 6

 Em suma, sempre que a Administração Pública vede ao trabalhador um direito consagrado na lei por uma errada interpretação das normas vigentes fica obrigado a indemnizar desde que estejam preenchidos os requisitos da responsabilidade civil extracontratual do Estado.

 

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1.      Alterações ao DL n.º 73/90, de 06/03: DL n.º 412/99, de 01/11/90, DL n.º 44/2007, de 23/02. DL n.º 177/2009, de 04/08 - Estabelece o regime da carreira especial médica, bem como os respetivos requisitos de habilitação profissional e revogou o DL n.º 73/90, de 06/03, com a com exceção dos n.os 5 a 9 e 11 a 14 do artigo 24.º e dos n.os 5 a 16 do artigo 31.º os quais se mantêm em vigor, na medida em que regulem situações não previstas no novo regime e até à entrada em vigor do IRC. Decreto-Lei n.º 266-D/2012 de 31 de dezembro que entrou em vigor a 01/01/2013 revogado com interesse para a questão que se aborda o artigo 32.º do Dl n.º 177/2009, «Artigo 32.º Norma transitória 1 — Os médicos transitam para a carreira especial médica nos termos previstos no artigo 28.º do presente decreto -lei. 2 — Os médicos que não pretendam manter o respetivo regime de horário de trabalho atualmente em vigor podem requerer ao presidente do órgão de administração do estabelecimento onde prestem funções, por escrito, a todo o tempo, com produção automática de efeitos, a transição para o regime previsto no artigo 20.º do presente decreto -lei. 3 — Caso não efetuem a opção prevista no número anterior, os médicos mantêm o respetivo regime de trabalho, remunerações e direitos inerentes, conforme os seguintes regimes de trabalho: a) 35 horas semanais sem dedicação exclusiva; b) 35 horas semanais, com dedicação exclusiva; c) 42 horas semanais; d) 35 horas semanais, sem dedicação exclusiva com disponibilidade permanente; e) 35 horas semanais, com dedicação exclusiva e disponibilidade permanente.»

2.      Aplicação do art. 24.º e 31.º e 39.º do DL n.º 73/90.

3.       Art. 31.º n.º 15 do DL n.º 73/90: «Os médicos com idade superior a 55 anos e que trabalhem em regime de dedicação exclusiva há, pelo menos, cinco anos, com horário de 42 horas por semana, será concedida, se a requererem, redução de uma hora em cada ano no horário de trabalho semanal, até que o mesmo perfaça as 35 horas semanais, sem perda de regalias.»

4.       Art. 9.º do Dl n.º 73/90, que foi revogado pelo art. 36.º do Dl n.º 177/2009 em vigor a 09/08/2009 e o art. 1.º do Dl n.º 93/2011 que repristinou o art. 9.º, em vigor a 02/08/2011.

5.      Art. 31.º n.º 4 do DL n.º 73/90 com a alteração introduzida pelo DL n.º 412/99, de 15.10.

6.      Art. 10.º n.º 2 da L n.º 67/2007, de 31712, o que permite concluir pela presença de um outro requisito de responsabilidade civil extracontratual. 

 


quarta-feira, 5 de junho de 2024

 

Reclamação de créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial. Prazo de caducidade – suspensão / interrupção

 

A lei determina que a reclamação de créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial deve ser feita no prazo de um ano a contar do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.

Com a publicação da L n.º 71/2018, de 31 de dezembro ficou clarificada a questão deste prazo de caducidade ser ou não suscetível de suspensão ou interrupção, na medida em que, foi aditado o n.º 9 ao art. 2.º que se transcreve: «O prazo previsto no número anterior suspende-se com a propositura de ação de insolvência, a apresentação do requerimento no processo especial de revitalização e com a apresentação do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas, até 30 dias após o trânsito em julgado da decisão prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º ou da data da decisão nas restantes situações.»

Assim, tendo cessado o contrato de trabalho no dia 05/06/2024, inicia-se o prazo de contagem de um ano em 06/06/2024 (n.º1 do art. 2 do DL n.º Dl n.º 59/2015).

 Com a nova redação esse prazo suspende-se no momento do seu início por efeito da apresentação pela entidade empregadora de um requerimento de processo especial de revitalização / o processo de insolvência e reclamação dos créditos pelo trabalhador. A suspensão do prazo mantem-se até 30 dias após trânsito em julgado da decisão de insolvência.

A suspensão ou interrupção do prazo de caducidade para reclamação de créditos laborais não foi tão linear antes da entrada em vigor da L n.º 71/2018 tendo sido, aliás, objeto de algumas decisões judiciais dando-se nota da decisão do STA a fixar jurisprudência face a divergência entre duas decisões judiciais em que considerou que o prazo para reclamar os créditos laborais ao FGS era suscetível de suspensão ou interrupção.

O STJ defendeu ainda que qualquer interpretação contrária seria inconstitucional.

Para o efeito, invocou o sentido que foi dado ao n.º 9 do art. 2.º do citado diploma legal. 

O Acórdão recorrido, defendeu «que era de aplicar ao caso dos autos o prazo de caducidade de um ano previsto no artigo 2.º, n.º 8 do NRFGS, contando-se o mesmo da data da entrada em vigor daquele diploma legal (ou seja, 04.05.2015).» Concluindo pela intempestividade do pedido, por considerar que o prazo para a sua apresentação tinha caducado. () O tribunal seguiu, entre outros, o Ac. STA de 03/10/2019, proc. N.º 01015/16.2BEPNF.

O Acórdão fundamento proferiu decisão no sentido de «mesmo aplicando-se ao caso o prazo de caducidade de um ano a contar do dia seguinte àquele em que cessara o contrato de trabalho (prazo previsto no artigo 2.º, n.º 8 do NRFGS), cabia, face à decisão do TC (acórdão n.º 328/2018) que julgara aquela norma inconstitucional, promover a sua aplicação segundo uma interpretação conforme à constituição, o que resultava na “aplicação ao caso por via interpretativa integradora” da solução entretanto introduzida pela Lei n.º 71/2018, de 31 de Dezembro. De acordo com esta solução, o prazo de caducidade do direito tinha de considerar-se suspenso desde a propositura da “acção de insolvência, a apresentação do requerimento no processo especial de revitalização e com a apresentação do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas, até 30 dias após o trânsito em julgado da decisão prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º ou da data da decisão nas restantes situações”. E assim concluiu pela «tempestividade do pedido formulado pelo Requerente em 25.08.2016 (apesar de o contrato de trabalho ter cessado em 20.12.2013) e pela obrigação de o FGS apreciar o pedido.»

Em conclusão, diz-se que todas as situações anteriores à entrada em vigor do n.º 9 do art. 2.º do RFGS, o tempo de um ano para a reclamação dos créditos laboral suspendiam imediatamente na data do início da contagem do prazo, ou seja, no dia imediatamente a seguir à data da cessação do contrato de trabalho.

Na verdade, o afirmado no acórdão fundamento, teve entretanto consagração legal expressa pela alteração legislativa do NRFGS, aprovada pela Lei n.º 71/2018, de 31 de Dezembro.

Jurisprudência:

Ac. STA de 26/10/23, proc n.º 621/17.2BEPNF-A

O prazo de caducidade de um ano para reclamação ao Fundo de Garantia Salarial de créditos emergentes de contrato de trabalho previsto no artigo 2.º n.º 8 do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril, na redacção anterior à alteração introduzida pela Lei n.º 71/2018, de 31 de Dezembro, é susceptível de suspensão/interrupção, a determinar casuisticamente.

 

Ac. STA de 03/11/2022, PROC N.º 01315/17.4BEPRT

 As “decisões interpretativas de inconstitucionalidade”, repetidamente formulados pelo TC, da norma do nº 8 do art. 2º do DL nº 59/2015, de 21/4, «na interpretação segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal, é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão», não impõem a extirpação daquela norma (com a consequente repristinação do regime pretérito – constante do revogado “Regulamento do Código de Trabalho”), mas apenas a admissibilidade de adequadas causas de suspensão/interrupção na aplicação daquele prazo de um ano, estabelecido na referida norma, para reclamação ao “Fundo de Garantia Salarial” de créditos emergentes de contratos de trabalho.

 Assim, tendo o Autor, no caso dos autos, visto cessar o seu contrato de trabalho em 1/10/2015 (em plena vigência, pois, do DL nº 59/2015), era-lhe aplicável o prazo de um ano, a contar dessa data, para requerer ao “FGS” créditos emergentes do contrato de trabalho, nos termos estabelecidos no nº 8 do art. 2º daquele diploma legal.

 Tendo o Autor apresentado requerimento ao “FGS” em 18/1/2017, fê-lo tempestivamente, pois que, embora ultrapassando o prazo de um ano (concretamente, 1 ano, 3 meses e 17 dias), deve descontar-se o período de 162 dias (cerca de 5 meses e meio) que mediou entre a instauração do processo de insolvência do empregador (em 31/5/2016) e 30 dias após a respetiva sentença declaratória (10/11/2016).

 Efetivamente, o pedido de declaração de insolvência do empregador deve ser considerado causa de suspensão do prazo (de um ano) legalmente estabelecido para reclamação ao “FGS” dos créditos, até à respetiva declaração de insolvência, como consequência direta daqueles juízos de inconstitucionalidade formuladas pelo TC, ainda que o legislador somente através da Lei nº 71/2018, de 31/12, viesse a estabelecer tal causa de suspensão em obediência a essas decisões de inconstitucionalidade.

 

Ac. STA de 03/10/2019, proc n.º 01015/16.2BEPNF 0534/18

 Com o regime do «FGS» instituído em 2015 pelo DL n.º 59/2015, manteve-se o prazo de prescrição de créditos que se encontra inserto no art. 337.º do Código de Trabalho [CT], passando o referido Fundo, em caso, nomeadamente, de insolvência do empregador, a assegurar o pagamento aos trabalhadores dos créditos emergentes de contrato de trabalho quando o pagamento lhe vier a ser requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho [arts. 01.º e 02.º, n.º 8, daquele novo regime.


Instituiu-se, assim, um prazo de reclamação cujo termo final se apresenta como diverso do regime até aí vigente e que constava do n.º 3 do art. 319.º da Lei n.º 35/2004, dado que neste preceito se disciplinava que os créditos poderiam ser reclamados até três meses antes da respetiva prescrição e, como tal, estávamos em face de prazo «basculante» visto o respetivo termo final «oscilava» ou «pendulava» em função das intercorrências sofridas ou havidas no cômputo do prazo de prescrição.

Visto o regime normativo transitório definido no art. 03.º do DL n.º 59/2015 na sua concatenação com o demais regime legal vigente, nomeadamente o n.º 8 do art. 02.º do novo regime do «FGS» e o art. 337.º do CT, não foi propósito do legislador o de instituir ex novo e de modo generalizado um prazo de admissão de requerimentos de trabalhadores contendo pedidos de reclamação de pagamento de créditos junto do «FGS» e que este viesse ou passasse a responder, enquanto garante e com tal amplitude, independentemente ou abstraindo-nos da necessidade de aferição do decurso ou não dos prazos [prescricional ou de caducidade] e/ou com total abstração de situações constituídas.

 Quando a lei nova [«LN»] vem encurtar um prazo a ponto de, por força da entrada em vigor daquela lei, o mesmo poder ficar automaticamente prescrito ou caduco impõe-se que a contagem do novo prazo seja efetuada a partir do início de vigência da «LN» com a ressalva da parte final do n.º 1 do art. 297.º do Código Civil.

Viola o princípio da confiança ínsito no art. 02.º da CRP um entendimento que, em aplicação do quadro normativo referido em I., aceita como conforme à nossa ordem jurídica que, em aplicação da «LN» que modifica regra relativa a prazo, um trabalhador possa, por caducidade, perder o direito ao pagamento dos créditos salariais antes mesmo da entrada em vigor dessa lei e da própria data de apresentação do requerimento ou de esta mesma ser possível à luz daquela lei.

 

Ac. TC n.º  792/2022, de 17/11/22,

 Julgar inconstitucional a norma constante do n.º 8 do artigo 2.º do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril, na interpretação segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão, por violação da alínea a) do n.º 1 e do n.º 3 do artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa.