Quando soube que irá decorrer uma nova exposição das obras de Almada Negreiros, (um dos melhores pintores portugueses) lembrei-me de parte do texto que constitui o livro Fotobiografias, Século XX.
Não deixa de ser irónico!
«Quando uma manhã entrei na exposição
já alguém antes de mim lá tinha ido e escarrado em meia dúzia de originais»
«Paris
é a concretização de um sonho para Almada, ele que sempre glorificara a
cidade-berço do modernismo, conhecida pelos ecos antes trazidos por amigos como
Amadeo, Santa-Rita, Sá-Carneiro, Pacheko ou Viana. Mas a vida na capital
francesa não será fácil.
(…)
Busto estilizado de Almada Negreiros,
Auto-retrato, 1943, Alberto Kissola, 2016
O seu caminho é o da independência absoluta, que não se advinha fácil depois de despendidos no bilhete do Sud Expresso os derradeiros tostões da herança deixada pela mãe. Para garantir a sobrevivência em terras de França, Almada está disposto a qualquer atividade remunerada, desde empregado de armazém numa fabrica de velas a dançarino profissional de salão (...)
Almada
invocará como explicação as diferenças de nacionalidade, associando ideal
artístico a nação: «Foi então que eu vi
que a Arte tinha uma política, uma pátria e que o seu sentido universal existia
intimamente ligado a cada país da Terra».
Para
saciar a nostalgia da pátria, compõe logo nos primeiros meses em Paris o poema
em prosa Histoire du Portugal par Coeur, evocação do país longínquo onde o lado
naif tempera o sentimento nacionalista, escrita em francês, como justificará, «porque foi assim que ensinei aos
estrangeiros a Raça onde nasci».
(…)
«Quando cheguei a Lisboa tudo estava
mais pequenino», lamentava-se nas páginas do seu jornal manuscrito Parva, «Não! Eu não quero ter remorsos de ter colaborado
nesta falta de arquitetura que há aqui em Lisboa todos os dias». E vai encontrar
uma cidade indiferente, que ignora a exposição de desenhos por ele logo
organizada no salão nobre do Teatro São Carlos. «Quando uma manhã entrei na exposição já alguém antes de mim lá tinha
ido e escarrado em meia dúzia de originais» - é a única recordação que
poucos anos depois salientará do evento.
Fotobiografias Seculo XX, Almada Negreiros, Circulo de Leitores, p.
65 e 66.
Mais uma exposição de Almada Negreiros, com inauguração marcada para dia 2 de fevereiro de 2017, na Fundação Calouste Gulbenkian.
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