A instauração de execução tendente à cobrança coerciva de custas aplicadas
por entidade administrativa na fase administrativa do procedimento
contraordenacional é um tema que deve ser analisado com algum cuidado após a entrada em vigor do Dl n.º 27/2019. Ministério Público ou Autoridade tributária?
Segue o Parecer da Procuradoria-Geral da República n.º 27/2020, de 15/04/2021.
Questões:
«Em face da entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de
28 de março (que procedeu à alteração da Lei da Organização do Sistema
Judiciário, ao Código de Procedimento e de Processo Tributário, ao Código de
Processo Civil, ao Regulamento das Custas Processuais, ao Código de Processo
Penal, ao Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade e ao
diploma legal que prevê o regime de custas no Tribunal Constitucional), a quem
compete a instauração de execução tendente à cobrança coerciva de custas
aplicadas por entidade administrativa e não pagas voluntariamente, na fase
administrativa do procedimento contraordenacional – ao Ministério Público ou à
Autoridade Tributária?
Caso se entenda que a legitimidade é da Autoridade Tributária, como
deverão proceder os magistrados do Ministério Público relativamente ao
expediente que para o efeito lhes for remetido pelas diversas autoridades
administrativas – deverá tal expediente ser-lhes devolvido, para os fins tidos
por convenientes, acompanhado de despacho onde constem as razões pelas quais se
entende que o Ministério Público não é legalmente competente para o efeito? Ou
deverá tal expediente, por mera economia de meios, ser reencaminhado
diretamente à Autoridade Tributária, com conhecimento à autoridade
administrativa que o remeteu, acompanhado do referido despacho?»
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Conclusões
Em face do
exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1.ª Na sua versão original, o Regime Geral das Contraordenações remetia a
execução das custas para o disposto nos artigos 171.º e seguintes do Código das
Custas Judiciais, assim atribuindo ao Ministério Público competência para
promover a sua execução junto dos tribunais judiciais (art. 202.º, n.º 2, daquele
Código);
2.ª Esta solução, apesar das inúmeras
alterações legislativas que enfrentou, manteve-se quase inalterada até à
entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de março, relativa à aplicação do
processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas, multas não penais e
outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial;
3.ª Com efeito, considerando a natureza
tributária das custas e seguindo o exemplo da jurisdição administrativa e
fiscal, o legislador inverteu aquele paradigma, remetendo para a execução
fiscal a cobrança coerciva das custas fixadas em processo judicial;
4.ª Para esse efeito, a Lei n.º 27/2019, de
28 de março, alterou o Código de Procedimento e de Processo Tributário que
passou a dispor que «Poderão ser igualmente cobradas mediante processo de
execução fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei: (…) Custas,
multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial
[art. 148.º, n.º 2, alª c)];
5.ª Bem como o artigo 35.º, n.º 1, do
Regulamento das Custas Processuais, que sob a epígrafe «execução», passou a
dispor que: «Compete à administração tributária, nos termos do Código de
Procedimento e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança
coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em
processo judicial»;
6.ª Embora nem a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, nem as normas que ela
alterou, o digam expressamente, deve entender-se que este regime é aplicável às
custas fixadas na fase administrativa do processo de mera ordenação social,
competindo à Administração Tributária proceder à sua cobrança coerciva;
7.ª Desde logo, porque, continuando o artigo 92.º, n.º 1, do Regime Geral
das Contraordenações, a remeter para os preceitos reguladores das custas em
processo criminal, será aqui aplicável o disposto no artigo 35.º do Regulamento
das Custas;
8.ª Depois, porque, atenta a sua natureza, tais custas estão incluídas no
âmbito do artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo
Tributário, segundo o qual o processo de execução fiscal abrange, para além do
mais, a cobrança coerciva de taxas, demais contribuições financeiras a favor do
Estado, adicionais cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais;
9.ª Em terceiro lugar, porque, em vez de atribuir ao juízo ou tribunal
que as tenha proferido competência para executar as decisões relativas a
multas, custas e indemnizações previstas na lei processual aplicável, o
legislador passou a atribuir-lhe, apenas, competência para a execução das
decisões relativas a multas penais e indemnizações previstas na lei processual
aplicável (art. 131.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário);
10.ª Em quarto lugar, porque o legislador restringiu os poderes do
Ministério Público, maxime o poder de promover a execução por
custas, conferindo-lhe, agora, apenas, competência para promover a execução das
penas e das medidas de segurança e, bem assim, a execução por indemnização e
mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar
judicialmente (art. 469.º do Código de Processo Penal);
11.ª Finalmente, porque o legislador eliminou a referência à execução por
custas, que constava do artigo 491.º, n.º 2, do Código de Processo Penal,
passando a mesma a ser da competência exclusiva da Administração Tributária;
12.ª Com estas alterações, para além de ter atribuído à Administração
Tributária competência para proceder à cobrança coerciva das custas, o
legislador eliminou as normas que antes atribuíam ao Ministério Público
competência para promover a sua execução e aos tribunais judiciais competência
para a tramitar;
13.ª Desta forma, o artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do Código de
Procedimento e de Processo Tributário, passou a incluir a cobrança da taxa de
justiça e dos encargos legais, que, por força de disposições legais especiais,
antes lhe estava subtraída; e
14.ª Se as entidades
administrativas remeterem ao Ministério Público expediente destinado à cobrança
de custas fixadas em processo de contraordenação, tal expediente deverá, por
mera economia de meios, ser reencaminhado diretamente à Autoridade Tributária,
com conhecimento ao remetente.
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Comentário:
Um documento completo
que permite aprofundar conhecimentos sobre documento que permite aprofundar
conhecimentos sobre a competência para a instauração de execução tendente à cobrança coerciva
de custas aplicadas por entidade administrativa face as alterações provocadas
pela entrada em vigor da L n.º 27/2019, de 28 de março. Recomendado.
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Parecer da Procuradoria-Geral da República n.º
27/2020, de 15/04/2021
Senhora Procuradora-Geral
da República
Excelência:
Submeteu
Vossa Excelência, nos termos dos artigos 44.º, alª d) e 45.º, n.º 2, do
Estatuto do Ministério Público[1], pedido de Parecer a este Conselho
Consultivo da Procuradoria-Geral da República, nos seguintes termos:
«Em face da entrada em vigor da Lei n.º 27/2019,
de 28 de março (que procedeu à alteração da Lei da Organização do Sistema
Judiciário, ao Código de Procedimento e de Processo Tributário, ao Código de
Processo Civil, ao Regulamento das Custas Processuais, ao Código de Processo
Penal, ao Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade e ao diploma
legal que prevê o regime de custas no Tribunal Constitucional), a quem compete
a instauração de execução tendente à cobrança coerciva de custas aplicadas por
entidade administrativa e não pagas voluntariamente, na fase administrativa do
procedimento contraordenacional – ao Ministério Público ou à Autoridade
Tributária?
Caso se entenda que a legitimidade é da Autoridade Tributária, como
deverão proceder os magistrados do Ministério Público relativamente ao
expediente que para o efeito lhes for remetido pelas diversas autoridades
administrativas – deverá tal expediente ser-lhes devolvido, para os fins tidos
por convenientes, acompanhado de despacho onde constem as razões pelas quais se
entende que o Ministério Público não é legalmente competente para o efeito? Ou
deverá tal expediente, por mera economia de meios, ser reencaminhado
diretamente à Autoridade Tributária, com conhecimento à autoridade
administrativa que o remeteu, acompanhado do referido despacho?»
O referido pedido de parecer foi
instruído com informação do gabinete de V.ª Ex.ª, que relata a diversidade de
procedimentos e a necessidade de os uniformizar (de modo a que todo o
Ministério Público proceda da mesma forma) e, em síntese, preconiza que o
Ministério Público já não é competente para o efeito, devendo a ação executiva
ser promovida pela Autoridade Tributária.
Competência
para a instauração de execução das custas aplicadas na fase administrativa do
processo de contraordenação
Traçar a evolução do regime de execução
das custas, aplicadas na fase administrativa dos processos de contraordenação,
desde que surgiu, entre nós, o direito de mera ordenação social, até à
atualidade, não é uma tarefa fácil, tantos são, apesar da quase constante
continuidade normativa e, consequente, manutenção do paradigma, os diplomas
envolvidos. Para além do desenvolvimento da instância executiva nos tribunais
comuns, importará considerar também o seu desenvolvimento nos tribunais
administrativos e fiscais, resultando a solução da conjugação das duas
soluções.
1. O Código de Processo Penal, de 1929, na
sequência de soluções anteriores, dispunha, desde a sua versão inicial,
aprovada pelo Decreto n.º 16487, de 15 e fevereiro de 1929, que competia ao
Ministério Público promover a execução das penas, imposto de justiça,
indemnização de perdas e danos e mais quantias devidas ao Estado (art. 627.º[2]). Na mesma linha, o artigo 59.º do Código
de Processo Civil, aprovado pelo Decreto n.º 29637, de 28 de maio de 1939,
atribuía ao Ministério Público legitimidade para promover a execução de multas
impostas em qualquer processo, bem como executar custas ou quaisquer
importâncias devidas ao Estado.
Estas
execuções eram instauradas por apenso ao processo no qual se tivesse feito a
notificação da respetiva conta ou liquidação (art. 92.º do Código de Processo
Civil), exceto se o processo estivesse no Tribunal da Relação ou no Supremo
Tribunal de Justiça, caso em que correria termos no tribunal de primeira
instância onde o processo tivesse sido instaurado, com base numa certidão
emitida para o efeito (art. 93.º do mesmo diploma legal)[3]. Competentes para a execução eram,
portanto, os tribunais comuns. Quem tinha competência para julgar o caso ou a
causa também tinha competência para cobrar as custas dele emergentes.
Complementando
este regime, que se manteve com o Código de Processo Civil, aprovado pelo
Decreto-Lei n.º 44129, de 28 de dezembro de 1961, o Código das Custas Judiciais[4] veio regular o pagamento coercivo
das custas, tanto em matéria civil (arts. 152.º e ss.), como em matéria
criminal (art. 202.º). Aí se dizia, nomeadamente, que a execução era instaurada
por apenso ao processo em que tivesse tido lugar o aviso de pagamento,
autuando-se o requerimento de nomeação de bens à penhora e observando-se os
demais termos do processo sumaríssimo (art. 154.º, n.º 1).
2. O direito de mera ordenação social
foi introduzido no ordenamento jurídico nacional, pelo Decreto-Lei n.º 232/79,
de 24 de junho, que, apesar das hesitações[5] iniciais, optou por atribuir aos
tribunais comuns a competência para conhecer do recurso de impugnação judicial
e demais atos jurisdicionais[6]. Na fórmula do próprio preâmbulo do
diploma:
«Após algumas hesitações, optou-se por atribuir aos tribunais comuns a
competência para conhecer do recurso de impugnação judicial.
Reconhece-se de boamente que a pureza dos princípios levaria a privilegiar a
competência dos tribunais administrativos. Ponderadas, contudo, as vantagens e
desvantagens que qualquer das soluções irrecusavelmente comporta, considerou-se
mais oportuna a solução referida, pelo menos como solução imediata e
eventualmente provisória.
E isso por ser a solução normal em direito comparado. E ainda por se revelar
mais adequada a uma fase de viragem tão significativa como a que a introdução
do direito de ordenação social representa. Além do mais, afiguram-se mais
facilmente vencíveis as naturais resistências ou reservas da comunidade dos
utentes do novo meio de impugnação judicial».
Não admira,
por isso mesmo, que a execução da coima e das custas fosse promovida pelo
representante do Ministério Público junto do tribunal da comarca em cuja área
tivesse a sua sede a autoridade que tivesse aplicado a coima (salvo quando a
decisão exequenda tivesse sido proferida pelo Tribunal da Relação, caso em que
a execução poderia também ser promovida perante o tribunal da comarca do
domicílio do executado) que esta obedecesse aos termos da execução por custas,
aplicando-se, devidamente adaptado, o disposto no artigo 640.º do Código de
Processo Penal[7], relativo à execução da pena de multa
(art. 76.º, n.º 2[8]) e que, se o contrário não resultasse
daquela lei, as custas seriam reguladas pelo disposto nos artigos 171.º e
seguintes do Código das Custas Judiciais, relativas à matéria criminal (art.
78.º, n.º 1[9]).
2.1. Pouco tempo depois, o Regime Geral
das Contraordenações[10], sob a epígrafe «Princípios gerais»,
veio confirmar estas opções iniciais, prescrevendo, naquilo que nos interessa,
que:
«1 - Se o contrário não resultar desta lei, as custas em processo de
contraordenação regular-se-ão pelo disposto nos artigos 171.º e seguintes do
Código das Custas Judiciais» (art. 92.º).
Assim, por
força desta remissão, atento o artigo 202.º, n.º 2, daquele Código[11], o Ministério Público era competente
para instaurar a execução para pagamento daquelas custas, que seguia os termos
das execuções por custas reguladas na parte cível daquele diploma, com
observância do disposto no artigo 1696.º do Código Civil. Terminado o processo
de contraordenação, caso as custas não fossem pagas voluntariamente, o
Ministério Público tinha o encargo de proceder à sua cobrança coerciva e os
tribunais comuns eram competentes para conhecer das questões daí emergentes.
2.2. O novo Código de Processo Penal,
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro, apesar de integrar as
exigências da Constituição da República Portuguesa de 1976 e do Código Penal de
1982[12], manteve as soluções já consagradas nos
artigos 627.º e 640.º do Código de Processo Penal de 1929. Assim, confirmando
as competências executivas do Ministério Público e dos tribunais comuns, passou
a prescrever que:
«1 - Compete ao Ministério Público promover a execução das penas e das medidas
de segurança e, bem assim, a execução por imposto de justiça, custas,
indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba
representar judicialmente» (art. 469.º, n.º 1)[13].
Prosseguindo
na mesma linha de raciocínio, em 1995[14], o Decreto-lei n.º 244/95, de 14 de
setembro, procurando, justamente, «proceder ao aperfeiçoamento da coerência
interna do regime geral de mera ordenação social, bem como da coordenação deste
com o disposto na legislação penal e processual penal»[15] vigente, alterou aquele artigo 92.º
do Regime Geral das Contraordenações, que passou a prescrever que:
«1 - Se o contrário não resultar desta lei, as custas em processo de
contraordenação regular-se-ão pelos preceitos reguladores das custas em
processo criminal».
Dessa forma, o legislador articulou o
Regime Geral das Contraordenações com o novo Código de Processo Penal que, para
além de ser direito subsidiário (art. 41.º do Regime Geral das
Contraordenações), como acabámos de ver, na sequência da nossa tradição jurídica,
assumira a regulamentação da competência para promover a execução do imposto de
justiça, das custas e demais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe
incumba representar judicialmente (arts. 469.º, n.º 1 e 488.º, n.º 2). De todo
o modo, no essencial, as soluções são as mesmas, cabendo ao Ministério Público
promover perante os tribunais comuns, a execução das custas ou de multas
emergentes dos processos de contraordenação.
2. 3. Um ano depois, atentas as reformas
operadas no processo civil através do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de
dezembro e do Decreto-Lei n.º 180/96, de 25 de setembro, e procurando reforçar
a coerência entre o regime das custas judiciais e o Código de Processo Penal[16], o legislador revogou o anterior Código
das Custas Judiciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44329, de 8 de maio de
1962. Em seu lugar, surgiu um novo Código das Custas Judiciais (aprovado pelo
Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de novembro), que, sendo «em grande parte, um
diploma complementar da legislação processual» continuou a prever que:
«O Ministério Público instaurará execução se ao devedor de custas ou multas
forem conhecidos bens penhoráveis» (art. 116.º, n.º 1) e que:
«as execuções por custas, multas e outros valores contados são instauradas por
apenso ao processo em que teve lugar a notificação para pagamento, autuando-se
o requerimento inicial e observando-se os demais termos do processo sumário»
(art. 117.º, n.º 1)[17].
2.4. Alguns anos mais tarde, em 2008, no intuito de uniformizar e de
simplificar o sistema de custas processuais e conforma anunciado na nota
preambular, o legislador:
«procurou concentrar todas as regras quantitativas e de procedimento sobre
custas devidas em qualquer processo, independentemente da natureza judicial,
administrativa ou fiscal num só diploma - o novo Regulamento das Custas
Processuais - mantendo algumas regras fundamentais, de carácter substantivo,
nas leis de processo.
Assim, as normas centrais relativas à responsabilidade pelo pagamento de custas
podem encontrar-se no Código de Processo Civil e no Código de Processo Penal,
os quais serão aplicáveis, a título subsidiário, aos processos administrativos
e fiscais e aos processos contraordenacionais, respetivamente. Em
contrapartida, para todos estes processos, os operadores judiciais poderão
encontrar regras simples e uniformes no Regulamento das Custas Processuais, no
que respeita à quantificação da taxa de justiça, ao modo de pagamento das
custas ou processamento da correspetiva conta»[18].
Para o
efeito, o Regulamento das Custas Processuais[19] revogou o Código das Custas
Judiciais vigente [art. 25.º, n.º 2, al.ª a)] e instituiu um novo regime,
aplicável aos processos que correm termos nos tribunais judiciais, nos
tribunais administrativos e fiscais e no balcão nacional de injunções.
No que respeita à execução das custas, a
filosofia base era, no entanto, a mesma:
«1 - Não tendo sido possível obter-se o pagamento das custas,
multas e outras quantias cobradas de acordo com os artigos anteriores, é
entregue certidão da liquidação da conta de custas ao Ministério Público, para
efeitos executivos, quando se conclua pela existência de bens penhoráveis»
(artigo 35.º, n.º 1).
Complementando
todas estas normas, localizadas no Código de Processo Penal, no Código de
Processo Civil e no Regulamento das Custas Processuais, o artigo 131.º da Lei
da Organização do Sistema Judiciário[20], sob a epígrafe, «Execução por multas,
custas e indemnizações» dispunha que:
«Os tribunais de competência territorial alargada, as secções da instância
central e as secções de competência genérica da instância local são ainda
competentes para executar as decisões por si proferidas relativas a custas,
multas ou indemnizações previstas na lei processual aplicável».
2.5. Durante quase 40 anos, apesar das
dúvidas iniciais, com maior ou menor clareza legal, o Ministério Público foi,
assim, competente para promover a execução das custas emergentes da fase
administrativa dos processos de contraordenação e os tribunais comuns
competentes para dela conhecer. Não admira, portanto, que, para além do Regime
Geral das Contraordenações, outros diplomas especiais sigam, ainda hoje, a
mesma opção inicial.
É o caso da Lei n.º 50/2006, de 29 de
agosto (que aprovou a lei quadro das contraordenações ambientais), segundo a
qual:
«1 - Decorrido o prazo de pagamento das custas sem a sua realização, a
autoridade administrativa envia, nos 20 dias úteis seguintes, o processo ao
Ministério Público para a instauração da competente ação executiva» (art. 60.º,
n.º 1).
É,
igualmente, o caso do disposto na Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro[21], que aprova o regime processual
aplicável às contraordenações laborais e de segurança social, que se limita a
dizer que «sempre que o contrário não resulte da presente lei, são aplicáveis,
com as devidas adaptações, as disposições do regulamento das custas
processuais» (art. 59.º), dessa forma remetendo, então, a matéria para a esfera
de competências do Ministério Público.
Já não era,
todavia, assim, em matéria de contraordenações fiscais e aduaneiras, por força
do Regime Jurídico das Infrações Fiscais e Aduaneiras, aprovado pelo
Decreto-Lei n.º 376-A/89, de 25 de outubro, que (como se destacou logo no
respetivo preâmbulo) atribuiu aos tribunais fiscais e aduaneiros competência
para conhecer dos recursos interpostos (art. 60.º, n.º 7[22]) e aos tribunais tributários de primeira
instância competência para proceder à execução da coima e das custas (art.
69.º, n.º 3[23]). Solução especial que foi salvaguardada
pelo Código de Procedimento e de Processo Tributário[24], segundo o qual, o processo de execução
fiscal abrange a cobrança coerciva das coimas e outras sanções pecuniárias
fixadas em decisões, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações
tributárias, salvo quando aplicadas pelos tribunais comuns [art. 148.º, n.º 1,
alª b)]. E que, mais tarde, transitou para o Regime Geral das Infrações
Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho (artigos 80.º, n.º 1[25], e 65.º, n.º 1[26], respetivamente)[27].
3. Esta solução parece ser a
consequência da implementação de uma verdadeira jurisdição administrativa. De
facto, no rescaldo da revolução, a Lei Constitucional n.º 3/74, de 14 de maio,
veio esclarecer que «as funções jurisdicionais serão exercidas exclusivamente
por tribunais integrados no poder jurisdicional» (art. 18.º) e, depois, o
Decreto-Lei n.º 250/74, de 12 de junho, incluiu os Tribunais Administrativos na
dependência funcional do Ministério da Justiça, juntamente com os demais
tribunais. Deixaram de «ser órgãos administrativos independentes, na
dependência do Ministério do Interior, para passar a ser verdadeiros tribunais»[28]. Mesmo assim, a Constituição da
República Portuguesa, de 2 de abril de 1976, refletindo as dúvidas então
existentes, limitou-se a dizer que «poderá haver tribunais administrativos e
fiscais» (art. 212.º, n.º 3), deixando ao legislador liberdade para a sua
criação[29].
Utilizando
esta margem de conformação, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais,
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de abril[30], lançando os fundamentos da evolução
futura, veio esclarecer que:
«Incumbe aos tribunais administrativos e fiscais, na administração da justiça,
assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, reprimir a
violação da legalidade e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados
no âmbito das relações jurídicas administrativas e fiscais» (art. 3.º).
Dessa forma,
como se dizia logo no respetivo preâmbulo, o legislador fixou «em termos
precisos a natureza e os limites da jurisdição administrativa e tributária».
Naquilo que ora nos interessa, na sequência dessa mesma fixação, o Estatuto
atribuiu aos Tribunais Tributários de primeira instância competência para a
«cobrança coerciva de dívidas a pessoas de direito público, nos casos previstos
na lei, bem como de custas e multas aplicadas pelos tribunais administrativos e
fiscais» [art. 62.º, n.º 1, alª c)][31].
A Lei de
Processo dos Tribunais Administrativos[32], complementando estas disposições, sob a
epígrafe, «Execuções por custas e multas», prescreveu, depois, que:
«As execuções por custas e multas impostas em tribunal administrativo são
instauradas nos tribunais tributários com base em certidão executiva, quando
aquele tribunal não puder obter o pagamento por meio do levantamento de
depósito que o devedor tenha à sua ordem ou por desconto nos respetivos
vencimentos, ordenados ou salários, nos termos do Código das Custas Judiciais»
(art. 75.º).
As execuções
fiscais eram, então, reguladas pelo Código de Processo das Contribuições e
Impostos[33], segundo o qual tais execuções corriam
termos pelos Tribunais de 1.ª instância das Contribuições e Impostos de Lisboa
e Porto, relativamente aos devedores domiciliados nos respetivos concelhos
(art. 152.º, § 1.º daquele Código) e, fora daqueles, nas Repartições de
Finanças dos concelhos ou bairros fiscais, desempenhando os respetivos chefes
as funções de juízes auxiliares, nos termos do § único do art. 40.º deste
Código, sem prejuízo da intervenção dos tribunais respetivos nos casos
previstos na sua alínea d).
3.1. Refletindo todo este
desenvolvimento seminal, provocado pelo Estatuto dos Tribunais Administrativos
e Fiscais[34], a Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de
julho, sob a epígrafe «Tribunais Administrativos e Fiscais», veio esclarecer
que:
«1. O Supremo Tribunal Administrativo é o órgão superior da
hierarquia dos tribunais administrativos e fiscais, sem prejuízo da competência
própria do Tribunal Constitucional.
2. O Presidente do Supremo Tribunal Administrativo é eleito de entre e pelos
respetivos juízes.
3. Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e
recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das
relações jurídicas administrativas e fiscais» (art. 214.º, atual art. 212.º[35]).
O número três desta norma constitucional
suscitou, de imediato, para além do mais, a momentosa questão colocada por José
Carlos Vieira de Andrade:
«saber se aí se consagra uma reserva material absoluta de jurisdição
atribuída aos tribunais administrativos, no duplo sentido de que, por um lado,
os tribunais administrativos só poderão julgar questões de direito
administrativo, e de que, por outro lado, só eles poderão julgar tais questões»[36].
No que à
primeira vertente da questão diz respeito (saber se os Tribunais
Administrativos e Fiscais só podem julgar litígios emergentes de uma relação
jurídico-administrativa), a doutrina caminhou no sentido de admitir que lhes
seja atribuída competência para o julgamento de outras questões, como, por
exemplo, para julgar ações sobre contratos privados da administração ou para
julgar ações de responsabilidade civil extracontratual por atos de gestão
privada da administração[37].
Ainda quanto
à repartição das competências, em matéria de execução, fulcral para o presente
parecer, o Tribunal Constitucional, independentemente de saber se aquele artigo
da Lei Fundamental «atribui aos tribunais administrativos uma reserva material
absoluta de jurisdição» ou «se, aí, apenas se consagram os tribunais
administrativos como os tribunais comuns em matérias administrativas»[38], considerou acerca de tal preceito que:
«[está] direcionado ao julgamento das ações e recursos que versem sobre
relações jurídicas administrativas e fiscais litigiosas, não podendo a lei
ordinária extravasar para outra coisa que não sejam tais relações, mas sem que
isso signifique que, de todo em todo, se tenha impedido relegar para a mesma
lei qualquer parcela definidora ou integradora da competência dos tribunais
administrativos e fiscais, no que toca a processos executivos.
E, com efeito, na sua formulação típica, a ação executiva não envolve qualquer
julgamento - uma atividade de cariz declaratório a culminar na apreciação de
mérito de determinada relação jurídica - limitando-se, em princípio, à adoção
das providências materiais adequadas à satisfação de direitos já previamente
reconhecidos no título executivo»[39].
Por isso mesmo, continuando a seguir
aquela jurisprudência, o artigo 214.º, n.º 3, da Constituição não impediria a
utilização das execuções fiscais noutras situações, como, por exemplo, a
execução de créditos da Caixa Geral de Depósitos.
No que
respeita à segunda vertente da questão (saber se só os Tribunais
Administrativos e Fiscais podem julgar litígios emergentes de uma relação
jurídico-administrativa), a resposta da doutrina maioritária, porventura devido
à inexistência de uma rede de tribunais suficientemente alargada e dotada dos
recursos humanos imprescindíveis para dar resposta adequada, também foi no
sentido de que não se trata de uma reserva absoluta e de que o legislador
dispõe de uma certa margem de conformação, podendo, sem prejuízo de um núcleo
irredutível de matérias, atribuir à jurisdição comum competência para a
execução de coimas e multas processuais aplicadas em processos de
contraordenação[40].
A jurisprudência navegou nas mesmas
águas, tendo o Tribunal Constitucional, justamente, decidido:
«não julgar inconstitucional a norma do artigo 55.º, n.º 3, do Regime Geral das
Contraordenações (Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, alterado, por
último, pela Lei n.º 109/2001, de 24 de dezembro), na medida em que atribui aos
tribunais judiciais competência para julgar as impugnações judiciais de
decisões das autoridades administrativas, tomadas no âmbito de processo de
contraordenação ambiental»[41].
3.2. Neste contexto constitucional, os
recursos das decisões que apliquem coimas, bem como a sua execução e a execução
das custas e de outras multas processuais, aplicadas em processo de
contraordenação, continuou confiada aos tribunais comuns, sendo as competências
executivas dos tribunais administrativos e fiscais reservadas para execução das
suas próprias decisões.
Com o Código
de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 154/91, de 23 de abril,
os processos de execução fiscal passaram a ser instaurados e tramitados pelas
Repartições de Finanças, com intervenção dos Tribunais, apenas para a prática
dos atos de natureza jurisdicional [arts. 43.º, alínea h), e 237.º, n.ºs 1 e 2[42]]. Na verdade, entre as competências da
administração tributária incluía-se, então, a de «cobrar as custas dos
processos e dar-lhes o destino legal» [art. 43.º, alínea h)]. De modo que:
«Em face da atribuição de competência aos Tribunais Tributários para cobrança
das custas e multas aplicadas pelos Tribunais Administrativos e Fiscais e da
repartição de competências entre os tribunais tributários e as Repartições de
Finanças para a prática de atos no processo de execução fiscal, aquela
referência a “processos” sempre foi interpretada como atribuindo à
administração tributária competência para a cobrança de todas as custas e
multas aplicadas pelos Tribunais Administrativos e Fiscais, sem prejuízo da
intervenção dos tribunais tributários, relativamente aos atos de natureza
judicial»[43].
O Código de
Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de
26 de outubro, manteve a mesma lógica, continuando a atribuir à Administração
Tributária competência para «cobrar as custas dos processos e dar-lhes o
destino legal» [art. 10.º, n.º 1, alínea g)], ou seja, para cobrar as custas e
multas aplicadas pelos Tribunais Administrativos e Fiscais, maxime as
multas englobadas na conta, nos termos do artigo 56.º, n.º 3, alínea b), do
Código das Custas Judiciais.
O Estatuto dos Tribunais Administrativos
e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, não contém
nenhuma norma semelhante à do anterior Estatuto [art. 62.º, n.º 1, alª c), da
versão original] e o Código de Processo nos Tribunais Administrativos limita-se
a afirmar que:
«2 - O regime das custas na jurisdição administrativa e fiscal é objeto de
regulação própria no Código das Custas Judiciais» (art. 189.º).
Com efeito, como já se referiu, o Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro,
tinha introduzido, no Código das Custas Judiciais, os artigos 73.º-A a 73.º-F,
determinando, designadamente, que o processo judicial administrativo estava
sujeito a custas, nos termos desse Código e da lei de processo administrativo;
que o processo judicial tributário, bem como os atos judiciais praticados no
âmbito do procedimento tributário, estavam sujeitos a custas, nos termos desse
Código; que em tudo o que não estivesse especialmente regulado nesse título, o
regime das custas administrativas e tributárias obedeceria às regras
estabelecidas para as custas cíveis, com as devidas adaptações (art. 73.º-A,
n.º 1, 2 e 3)[44].
Mesmo assim, embora o elemento
gramatical fosse menos claro, o Supremo Tribunal Administrativo, decidiu que:
«a) Mantêm-se em vigor, mesmo depois da vigência do ETAF de 2002 e do CPTA, os
artigos 10.º, 1, g), 148.º e 151.º do CPPT.
b) Pelo que, mesmo após a entrada em vigor do ETAF de 2002 e do CPTA o meio
processual adequado para a cobrança coerciva das custas e multas relativos a
processos judiciais da área administrativa é o processo de execução fiscal,
previsto nos artigos 148.º e seguintes do CPPT»[45].
3.3. O Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2
de outubro, emitido no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º
100/2015, de 19 de agosto[46], foi mais um marco essencial desta
progressiva evolução. No entanto, ao contrário das soluções anteriores, que,
apesar do artigo 212.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa,
respeitando a tradição jurídica, mantinham a impugnação e a execução das
contraordenações na órbita da jurisdição comum, este diploma abriu outra linha
de evolução, que parece inverter a lógica tradicional e atribuir, finalmente,
competência para o efeito aos Tribunais Administrativos e Fiscais[47]. O mesmo sucede em matéria executiva.
Apesar do silêncio do legislador, uma coisa implica a outra. Quem tem
competência para julgar a ação também deve ter competência para a sua execução.
Como se refere no preâmbulo daquele diploma legal:
«No que respeita ao ETAF, clarificam-se, desde logo, os termos da relação que
se estabelece entre o artigo 1.º e o artigo 4.º, no que respeita à determinação
do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, e, por outro lado, dá-se mais
um passo no sentido, encetado pelo atual ETAF, de fazer corresponder o âmbito
da jurisdição aos litígios de natureza administrativa e fiscal que por ela
devem ser abrangidos. Neste sentido, estende-se o âmbito da jurisdição
administrativa e fiscal às ações de (…) impugnação de decisões que apliquem
coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social por violação de normas de
direito administrativo em matéria de urbanismo. Entendeu-se, nesta fase, não
incluir no âmbito desta jurisdição administrativa um conjunto de matérias que
envolvem a apreciação de questões várias, tais como as inerentes aos processos
que têm por objeto a impugnação das decisões da Administração Pública que
apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social noutros domínios.
Pretende-se que estas matérias sejam progressivamente integradas no âmbito da
referida jurisdição, à medida que a reforma dos tribunais administrativos for
sendo executada».
Para o efeito, o artigo 4.º do Estatuto
dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19
de fevereiro, passou a dispor que:
«1 - Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação
de litígios que tenham por objeto questões relativas a:
(…)
l) Impugnações judiciais de decisões da Administração Pública que apliquem
coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social por violação de normas de
direito administrativo em matéria de urbanismo;
(...)
n) Execução da satisfação de obrigações ou respeito por limitações decorrentes
de atos administrativos que não possam ser impostos coercivamente pela
Administração».
E o artigo 157.º, do Código de Processo
nos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de fevereiro,
passou a dispor que:
«As execuções contra particulares das sentenças proferidas pelos tribunais
administrativos, assim como dos demais títulos executivos produzidos no âmbito
de relações jurídico-administrativas que careçam de execução jurisdicional,
correm termos nos tribunais administrativos, mas, na ausência de legislação
especial, regem-se pelo disposto na lei processual civil» (n.º 7).
A transmissão da competência para
conhecer das impugnações judiciais de decisões da Administração Pública que
apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social, por violação de
normas de direito administrativo, em matéria de urbanismo dos tribunais comuns
para os tribunais administrativos e fiscais, implicou a transmissão da
competência para a execução da respetiva coima (e custas) seja ela ou não,
jurisdicionalmente, confirmada.
Como refere o Tribunal de Conflitos:
«De acordo com o disposto no (…) ETAF (…) compete aos tribunais da jurisdição
administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objeto questões
relativas a impugnações judiciais de decisões da Administração Pública que
apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação por violação de normas
de direito administrativo em matéria de urbanismo.
Perante este dispositivo legal, é indubitável que compete à jurisdição administrativa
e fiscal conhecer da impugnação judicial em matéria de contraordenação por
violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo, a qual se
fica a dever à intenção legislativa expressa de fazer corresponder o âmbito da
jurisdição administrativa aos litígios de natureza administrativa.
No caso, porém, não está em causa a impugnação judicial de tal matéria, mas a
execução de coima e custas processuais resultantes da prática de
contraordenação por violação de normas de direito administrativo em matéria de
urbanismo. No entanto, nem por isso esta problemática específica deixa de
relevar, no âmbito da regra de que o tribunal competente para a ação também o
será para a execução.
Movendo-nos, deste modo, no âmbito do direito de mera ordenação social, importa
averiguar se da aplicação do seu regime específico emerge uma solução para o
problema em análise.
Nos termos do art. 89.º, n.º 1, do DL n.º 433/82, de 27 de outubro, o não
pagamento da coima dará lugar à execução, que será promovida, perante o
tribunal competente, segundo o art. 61.º.
Nos termos do disposto no art. 61.º, n.º 1, é competente para conhecer do
recurso o tribunal em cuja área territorial se tiver consumado a infração.
Sendo o Tribunal Administrativo e Fiscal o competente, em razão da matéria,
para conhecer da impugnação judicial da decisão que aplica a coima no âmbito do
ilícito de mera ordenação social, por violação de normas de direito administrativo
em matéria de urbanismo, também o Tribunal Administrativo e Fiscal será o
competente para a execução da coima, por aplicação da regra do art. 89.°, n.º
1, do DL n.º 433/82.
Por efeito deste regime específico define-se a competência material para a
execução de coima no âmbito do ilícito de mera ordenação social, por violação
de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo.
No caso vertente, não podendo interpretar-se o art. 61.º, n.º 1, do DL n.º
433/82, sem a norma legal definidora da competência material para o recurso da
decisão que aplica a coima no âmbito do ilícito de mera ordenação social, por
violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo, é
inadequado limitar o seu âmbito a uma mera regra de competência territorial,
sob pena de se perder o sentido útil da remissão consignada no art. 89.º, n.º
1, do DL n.º 433/82.
A lei, com efeito, quis afirmar que o tribunal competente para a execução de
coima era o tribunal competente para conhecer do recurso da impugnação da
decisão que aplica a coima no âmbito do ilícito de mera ordenação social,
nomeadamente por violação de normas de direito administrativo em matéria de
urbanismo.
No âmbito especificado, sendo o Tribunal Administrativo e Fiscal o competente
para conhecer o recurso da impugnação judicial da decisão de aplicação da
coima, é igualmente competente para a execução de coima, sendo certo que a lei
não distingue entre ter havido, ou não, impugnação.
Com a competência material atribuída à jurisdição administrativa e fiscal, está
excluída a dos tribunais judiciais (art, 40.º, n.º 1, da LOSJ)»[48].
Noutra decisão, o mesmo Tribunal afirmou
que:
«O que está aqui em causa é a competência para conhecer da execução da
coima aplicada por violação de regras de urbanismo.
(…) a competência para conhecer do hipotético recurso de impugnação da decisão
administrativa em causa (…) pertenceria aos Tribunais Administrativos e
Fiscais.
Por isso, a competência para a execução da coima resultante do hipotético
indeferimento da referida impugnação pertenceria aos mesmos Tribunais
Administrativos, ao abrigo do disposto no art. 157.º, n.º 5 do Código de
Processo dos Tribunais Administrativos.
Daqui resulta que a competência para a execução da mesma coima aplicada sem
impugnação, naturalmente tem de pertencer aos mesmos tribunais administrativos.
Este entendimento resulta também da aplicação do referido n.º 5 do art. 157.º,
por estar aqui em causa um título executivo que foi produzido no âmbito de uma
relação jurídico-administrativa, por decorrer de uma violação de normas
administrativas no âmbito do urbanismo - violação esta cuja coima-sanção seria
impugnável nos Tribunais Administrativos e Fiscais, como já vimos.
Deste modo, no caso em apreço, a competência em razão da matéria para conhecer
da presente execução pertence ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra»[49].
Não admira, por isso mesmo, que o
Acórdão, n.º 4/2020, do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do
Supremo Tribunal Administrativo, de 7 de maio de 2020, tenha fixado a seguinte
jurisprudência:
«A partir de 1 de setembro de 2016 e para as ações executivas que vierem a ser
instauradas em juízo desde aquela data, «ex vi» dos arts. 4.º, n.º 1, als. l) e
n), do ETAF, 157.º, n.º 5, do CPTA, 61.º e 89.º do DL n.º 433/82, de 27/10,
15.º, n.º 5, do DL n.º 214-G/2015, de 2/10, cabe à jurisdição administrativa a
competência para a execução jurisdicional das decisões administrativas que, por
violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo, hajam aplicado
coimas e tenham estas sido alvo ou não de impugnação»[50].
As restantes contraordenações, que não
consubstanciassem a violação de normas de direito administrativo em matéria de
urbanismo, continuaram a ser executadas pelos tribunais comuns, coexistindo,
assim, duas soluções legais diferentes. Retomando o preâmbulo daquele diploma
legal, ainda não era o tempo para integrar na jurisdição administrativa a
impugnação e a execução de todas as «decisões da Administração Pública que
apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social». Só a conclusão
da reforma dos tribunais administrativos permitiria tal desiderato.
4. A última peça deste complicado puzzle
legal, apesar de caminhar no mesmo sentido, não invocou qualquer desígnio de
«fazer corresponder o âmbito da jurisdição aos litígios de natureza
administrativa e fiscal que por ela devem ser abrangidos», parece, assim, ter
abandonado este objetivo. De facto, a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, que
determinou a aplicação do processo de execução fiscal à cobrança coerciva das
custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo
judicial (art. 1.º, n.º 1), tem na sua base, não esse propósito científico,
mas, antes, simples razões de mera eficiência sistémica.
Para esse efeito, este diploma alterou o
Código de Procedimento e de Processo Tributário que passou a dispor que:
«2 - Poderão ser igualmente cobradas mediante processo de execução fiscal, nos
casos e termos expressamente previstos na lei:
(…).
c) Custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo
judicial.
Da mesma forma, o referido diploma
também alterou o artigo 35.º, do Regulamento das Custas Processuais, que, sob a
epígrafe «execução», passou a dispor que:
«1 - Compete à administração tributária, nos termos do Código de Procedimento e
de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança coerciva das
custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo
judicial.
2 - Cabe à secretaria do tribunal promover a entrega à administração tributária
da certidão de liquidação, por via eletrónica, nos termos a definir por
portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da
justiça, juntamente com a decisão transitada em julgado que constitui título
executivo quanto às quantias aí discriminadas.
3 - Compete ao Ministério Público promover a execução por custas face a
devedores sediados no estrangeiro, nos termos das disposições de direito
europeu aplicáveis, mediante a obtenção de título executivo europeu.
4 - A execução por custas de parte processa-se nos termos previstos nos números
anteriores quando a parte vencedora seja a Administração Pública, ou quando lhe
tiver sido concedido apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de
justiça e demais encargos com o processo.
5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a execução por custas de parte
rege-se pelas disposições previstas no artigo 626.º do Código de Processo
Civil».
Finalmente, o legislador alterou, ainda,
o artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (Regula o regime de
custas no Tribunal Constitucional), que, sob a epígrafe «Instauração da
execução», passou a dispor que:
«1 - Decorrido o prazo de pagamento das custas ou multas sem a sua realização
ou sem que ele tenha sido possível nos termos do artigo anterior, é entregue
certidão de liquidação, por via eletrónica, à administração tributária, para
fins executivos, nos termos a definir por portaria dos membros do Governo
responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça.
2 - A execução é instaurada com base na certidão a que se refere o número
anterior.
3 - O serviço da administração tributária onde correu a execução deve remeter
imediatamente ao Tribunal Constitucional, por transferência eletrónica à ordem
deste, o valor correspondente às custas ou multas cobradas.
4 - Para controlo dos pagamentos, no Tribunal Constitucional fica duplicado da
certidão referida no n.º 1».
Assim, para além de admitir que as
custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo
judicial possam ser – nos casos previstos na lei – cobradas mediante processo
de execução fiscal, o legislador logo criou dois casos em que tal sucede:
artigo 35.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais e o artigo 12.º do
Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro. Com esta técnica remissiva, em vez de
fixar no Código de Procedimento e de Processo Tributário todos os casos em que
as custas, as multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em
processo judicial podem ser cobradas mediante processo de execução fiscal, o
legislador veio permitir que qualquer outra lei possa atribuir essa
competência, sem necessidade de alterar, de novo, este diploma legal.
Paralelamente,
o legislador introduziu outras modificações destinadas a clarificar essa
transmissão de competências: o artigo 57.º do Código de Processo Civil, que
conferia ao Ministério Público legitimidade para promover a execução por custas
e multas judiciais impostas em qualquer processo foi revogado [art. 10.º, alª
a)][51]; o artigo 469.º do Código de Processo
Penal que, para além do mais, conferia ao Ministério Público competência para
promover a execução por custas foi expurgado dessa referência (art. 7.º,
primeira parte)[52]; o artigo 491.º, do mesmo diploma legal,
segundo o qual a execução da pena de multa ou de algumas das suas prestações
seguia os termos da execução por custas, foi modificado passando a execução a
seguir as disposições previstas no Código de Processo Civil para a execução por
indemnizações (art. 7.º, segunda parte)[53]; o artigo 141.º, alª n), do Código da
Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade[54], que, sem prejuízo de outras disposições
legais, atribuía ao representante do Ministério Público, junto do tribunal de
execução das penas competência para instaurar a execução por custas, foi
revogado [art. 10.º, alª c)]; e o artigo 131.º da Lei da Organização do Sistema
Judiciário, que atribuía ao juízo ou tribunal que as tivesse proferido
competência para executar as decisões relativas a multas, custas e
indemnizações previstas na lei processual aplicável, foi expurgado de qualquer
referência a custas ou a multas não penais[55].
Deste modo, o legislador dotou a
administração tributária de competência para promover em execução fiscal a
cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias
fixadas em processo judicial e, ao mesmo tempo, retirou ao Ministério Público competência
para o efeito. Ressalvados os casos em que o devedor está sediado no
estrangeiro (art. 35.º, n.º 3, do Regulamento das Custas), o Ministério Público
já não tem competência para o efeito.
4.1. Na origem desta lei esteve a
Proposta de Lei n.º 149/XIII, cuja exposição de motivos refere:
«As custas processuais, com especial relevância para a taxa de justiça,
representam o valor imputado às partes ou sujeitos processuais decorrente da
mobilização dos meios judiciários necessários e aptos à prestação do serviço
público de administração de justiça.
Constituem-se assim como uma exigência tributária, de génese sinalagmática,
normalmente decorrente de solicitação do cidadão aos Tribunais, a fim de
assegurar a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos,
reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de
interesses públicos e privados.
Nestes termos, é pacífica e corrente a utilização do processo de execução
fiscal para a cobrança de custas judiciais no âmbito da jurisdição
administrativa e fiscal; ora, a natureza tributária destas dívidas, e o balanço
francamente positivo da utilização do processo de execução fiscal para a
cobrança de custas judiciais no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal
preconizam, assim, o repensar do processo de execução por custas na jurisdição
dos tribunais judiciais, numa lógica de coerência e unidade do sistema
jurídico.
Ademais, nas execuções por custas, os atos próprios e da competência do agente
de execução ficam a cargo dos oficiais de justiça, reclamando por isso a sua
ação nesse âmbito, em considerável detrimento de tempo e disponibilidade para a
prática de atos de sua competência nas execuções comuns, agravando o tempo de resolução
destes processos, em detrimento da confiança na atempada administração da
justiça por parte dos cidadãos e dos operadores económicos.
Ora, a transferência para a Administração Tributária e Aduaneira das cobranças
de créditos de custas judiciais dos tribunais comuns, à semelhança do que já se
verifica nos tribunais administrativos e fiscais, não causando impacto
relevante nos serviços da administração tributária, permitirá direcionar a
atividade dos oficiais de justiça para a tramitação dos processos executivos,
reforçando de forma substancial os meios humanos nos juízos de execução, desta
forma contribuindo para a diminuição da pendência.
Consequentemente, apenas a invocação de uma fundamentação tradicionalista e
anacrónica pode justificar que o regime de cobrança coerciva de custas, multas,
coimas e outras sanções pecuniárias contadas ou liquidadas a favor do Estado
não siga os mesmos termos em que são atualmente tratadas pelo sistema jurídico
as demais dívidas fiscais ou parafiscais.
A aplicação do processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas,
multas, coimas e outras quantias cobradas em processo judicial, e de outras
sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos
relativos a contraordenações ou multas, constitui uma medida com enorme impacto
sistémico, assegurando maior uniformidade de critérios e procedimentos,
permitindo aumentar a eficiência da cobrança das quantias devidas ao Estado,
libertando meios humanos, e simultaneamente mantendo intacta a garantia da
tutela jurisdicional efetiva dos devedores».
Na base desta solução, parecem estar,
portanto, sobretudo, razões de eficácia e de economia de meios, nomeadamente o
sucesso da utilização do processo de execução fiscal para a cobrança de custas
judiciais no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal. Como já referimos,
não foi aqui invocado nenhum propósito de fazer corresponder o âmbito da
jurisdição administrativa aos litígios de natureza administrativa.
4. 2. Esta proposta foi, a pedido da
Assembleia da República, objeto de parecer elaborado por um assessor do
gabinete de V.ª Ex.ª e por uma vogal do Conselho Superior do Ministério
Público, no qual se refere, inter alia, que:
«A ideia fundamental que se visa instituir merece a nossa integral
concordância. E, para tanto, acrescentando-se à exposição de motivos uma razão
que nos parece crucial, relacionada com a perda de competências do Ministério
Público para promover as execuções por custas, multas processuais, multas
criminais e coimas administrativas determinadas nos processos judiciais e
contraordenacionais.
Não se trata, assim, apenas de libertar os oficiais de justiça do cargo/função
de agentes de execução nestas concretas ações executivas, mas também as de os
próprios magistrados do Ministério Público que, deste modo, se poderão dedicar
mais ainda ao exercício da sua atividade funcional nas suas vertentes de maior
complexidade»[56].
Na mesma linha, no parecer emitido pela
Ordem dos Advogados refere-se que:
«O primeiro objetivo essencial da iniciativa legislativa é uma transferência de
competência e responsabilidades dos oficiais de justiça para os funcionários da
administração fiscal em matéria de cobrança judicial efetiva de taxas de
custas, multas, coimas e outras quantias cobradas em processo judicial, nomeadamente
sanções pecuniárias, à semelhança do que, aliás, já sucede em matéria de
tribunais administrativos e fiscais.
(…)
Do ponto de vista da substância conceitual, a iniciativa legislativa em causa
assenta (i) na natureza afinal intrinsecamente fiscal das quantias em causa
(ii) e na natureza não judicial do processamento executivo em matéria das
quantias que serão agora objeto da atuação da administração fiscal.
(…)
O mesmo princípio vigorará quanto a “outras sanções pecuniárias fixadas em
decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou
multas”, o que implica abranger as entidades com competência para a aplicação
de sanções de natureza contraordenacional»[57].
O parecer do Conselho Superior da
Magistratura, apesar de salientar o mesmo propósito legislativo, era, todavia,
muito mais comedido e mais crítico. Em causa estava, sobretudo, a verdadeira
natureza jurídica das multas e das coimas:
«ao invés do que sucede com as custas processuais, a consideração de multas,
coimas e sanções pecuniárias como “dívidas fiscais ou parafiscais” suscita
efetivas reservas, não parecendo que o legislador tenha atentado na especial
natureza daquelas, que não se deverão confundir com qualquer “exigência tributária,
de natureza sinalagmática”, nem encontram reflexo na definição de tributo
decorrente dos artigos 3.º, 4.º e 5.º da Lei Geral Tributária.
As penas de multa e as coimas aplicadas pelo Tribunal, respetivamente em
enquadramento de direito penal primário e secundário não têm cariz tributário,
nem natureza sinalagmática, representando, ao invés, o essencial reduto do
poder punitivo do Estado, o que parece justificar tratamento diferenciado na
respetiva execução.
(…)
o Código de Procedimento e de Processo Tributário assenta no pressuposto
essencial de que a quantia exequenda corresponde a uma divida tributária,
assim se justificando, por exemplo a execução de sucessores conforme decorre do
artigo 153.º e 154.º do referido diploma.
Sucede que, faltando às coimas e multas esse caráter tributário e sinalagmático
e tratando-se de sanções decorrentes de uma responsabilidade pessoal, em caso
de falecimento do executado/arguido, extingue-se a responsabilidade criminal e
contraordenacional, o que (é) frontalmente incompatível com o disposto nos
referidos preceitos. Este será apenas um exemplo da incompatibilidade e
inadequação entre regime previsto para a execução fiscal e a natureza das
coimas e penas de multa aplicadas pelos tribunais comuns»[58].
Assim,
considerando o teor da proposta inicial e dos pareceres que sobre ela recaíram,
dúvidas não restam, que (bem ou mal) a intenção inicial do legislador era (como
aí logo se anunciava) transferir para o processo de execução fiscal a «cobrança
coerciva das custas, multas, coimas e outras quantias cobradas em processo
judicial, e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas,
sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou multas»[59].
Como afirmou a, então, Secretária de
Estado Adjunta e da Justiça, na reunião plenária da Assembleia da República, de
4 de janeiro de 2019:
«A razão pela qual, hoje, aqui nos encontramos prende-se com a proposta de lei
que é do conhecimento dos Srs. Deputados e através da qual o Governo pretende
alcançar, essencialmente, um grande objetivo: o de se poder recorrer ao
processo de execução fiscal para procedermos à cobrança coerciva de todas as
custas, multas, coimas e outras quantias pecuniárias fixadas no âmbito de
processos e, ainda, outras sanções pecuniárias fixadas em decisões
administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou multas»[60].
4. 3. Não obstante este claro propósito
inicial, é certo que há algumas diferenças entre a Proposta de Lei n.º 149/XIII
e as soluções que, efetivamente, foram, depois, consagradas na Lei n.º 27/2019,
de 28 de março, revelando que o pensamento do legislador evoluiu durante o
processo legislativo.
Por um
lado, ao contrário da proposta inicial, a lei omitiu qualquer referência
expressa à cobrança das coimas ou das custas fixadas por decisão das entidades
administrativas, referindo-se, agora, apenas, «à cobrança coerciva das custas,
multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial»
[cfr. o art. 1.º, n.º 1[61], o art. 2.º (que alterou o art. 148.º do
Código de Procedimento e de Processo Tributário[62]), e o art. 3.º (que, para além do mais,
alterou o art. 35.º do Regulamento das Custas Processuais[63])].
Por outro
lado, em sentido inverso, entre outros acertos, o legislador aditou novos
preceitos, de modo que, ao contrário da proposta inicial, a Lei n.º 27/2019, de
28 de março alterou, igualmente, o artigo 131.º da Lei da Organização do
Sistema Judiciário (art. 2.º); os artigos 87.º e 88.º do Código de Processo
Civil (art. 4.º), o artigo 469.º do Código de Processo Penal (art. 7.º) e o
artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro, que regula o regime de custas no Tribunal
Constitucional. Para além disso, a referida lei eliminou o artigo 57.º do
Código de Processo Civil e a alínea n), do artigo 141.º, do Código da Execução
das Penas e Medidas Privativas da Liberdade. Finalmente, o legislador eliminou
a prevista [art. 7.º, al.ª a)] revogação da alínea b), do n.º 1, do artigo
148.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário[64], que, assim, se manteve em vigor.
Importa, por
isso, verificar se estas alterações, introduzidas sobretudo na sequência de uma
proposta de alteração, formulada em 29 de janeiro de 2019, pelo Grupo
Parlamentar do Partido Socialista, alteraram aquele propósito inicial de
remeter a cobrança coerciva das custas para a Autoridade Tributária ou, se pelo
contrário, o reforçaram ainda mais[65].
4.3.1. Durante a discussão na
generalidade, realizada em 4 de janeiro de 2019, foram apontados vários
problemas à proposta de lei. Assim, o deputado José Manuel Pureza (BE) suscitou
o problema da «inclusão, no elenco das cobranças, da cobrança de multas
criminais a serem transferidas para a competência da Autoridade Tributária,
aplicando um processo de execução fiscal» nos seguintes termos:
«Isto é algo que suscita grandes perplexidades do ponto de vista do cumprimento
das regras essenciais do Estado de direito, porque, na verdade, estamos diante
de um processo que só formalmente é um processo judicial, já que, efetivamente,
é um processo administrativo e só por impulso do próprio executado é que haverá
um controlo da legalidade por parte de um juiz. Estamos, portanto, perante um
processo que levanta grandes questões do ponto de vista da verificabilidade das
garantias efetivas de um Estado de direito para este tipo de cobranças»[66].
A deputada Vânia Dias da Silva (CDS-PP)
destacou, primeiro, a sua concordância quanto à cobrança coerciva de custas
judiciais:
«Como bem menciona a proposta de lei, as custas têm uma natureza sinalagmática,
ou seja, correspondem ao pagamento de um serviço que o Estado proporciona e,
portanto, faz sentido que esta cobrança seja transferida para a Autoridade
Tributária, quando as custas não são pagas voluntariamente. Não temos nada, portanto,
contra este princípio».
De todo o modo, apesar desta
concordância genérica com o princípio, a referida deputada destacou, depois,
que a proposta confundia penas e multas que não têm caráter sinalagmático:
«A proposta de lei confunde, não sei porquê, as duas realidades, mas elas são
distintas e não são passíveis de confusão. Portanto (…) é preciso garantir que
aqui a questão é tratada de forma diferente e, por isso, em sede de
especialidade, estaremos disponíveis para o fazer, porque estas multas podem
ser convertidas em penas de prisão e, neste caso, o tratamento não pode ser,
apenas e só, administrativo, tem de haver outro tratamento»[67].
O deputado Carlos abreu Amorim (PSD)
referiu, por seu turno que:
«A proposta do Governo começa com uma exposição de motivos um pouco panfletária
e até enganadora. Depois, no seu conteúdo normativo, capricha em amalgamar a
cobrança de créditos de custas judiciais dos tribunais comuns com outras
sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos
relativos a contraordenações ou multas. Ora, uma coisa é uma coisa e outra
coisa é outra coisa. São conceitos diferentes e a sua igualação comporta
riscos, e sérios. Como sublinha o Conselho Superior da Magistratura, as multas,
coimas e sanções pecuniárias não são dívidas fiscais ou parafiscais, como quer
significar a proposta, e pretender oferecer-lhe o mesmo regime é perigoso. Nas
execuções das multas criminais, quando se alargam ao âmbito das execuções
fiscais, não podemos ignorar que este processo pode correr do princípio até ao
fim sem a intervenção necessária de um magistrado, ou seja, tudo restará
confinado a técnicos tributários. Esta é também a opinião manifestada pelo
Conselho Superior do Ministério Público. Isto significa que esta proposta faz
equivaler o regime de cobrança de dívidas, sem consequências na privação da
liberdade, ao daquelas que têm precisamente esse efeito, o que colide com
regras do processo penal que não são bulidas e, sobretudo, com a lógica dos
direitos fundamentais, que, já agora, realço (…) não são meros tradicionalismos
e anacronismos, conforme vem dito na exposição de motivos»[68].
Finalmente o deputado António Filipe
(PCP) destacou que a eficácia da proposta será inquestionável, mas a justiça e
a aplicação da justiça têm de reger-se por outros critérios que não apenas o
critério da eficácia. Assim:
«há objeções muito sérias que são colocadas a esta proposta de lei e que
constam, designadamente, dos pareceres que nos
foram apresentados quer pelo Conselho
Superior do Ministério Público, quer pelo Conselho Superior da
Magistratura. E há uma questão central que é, de facto, a da aplicação que o
Governo pretende do processo de execução fiscal a sanções que decorrem da
responsabilidade penal. E, neste caso, o parecer do Conselho Superior do
Ministério Público não poderia ser mais elucidativo, quando diz,
inclusivamente, que será de questionar, e vou citar, “se a solução de entregar
a execução da pena de multa a um órgão administrativo que atua sem fiscalização
judicial oficiosa é a que melhor se coaduna com a consequência de que, se o
pagamento coercivo não tiver êxito, a pena de multa é convertida em prisão
subsidiária”. Ora bem, esta é uma questão central. Ou seja, o fisco não pode
mandar prender. A conversão de uma pena de multa aplicada no âmbito de um
processo penal em pena de prisão tem de ser feita obrigatoriamente com a
intervenção do poder judicial. Não pode ser a administração tributária a tomar
uma decisão dessa natureza e não está devidamente acautelado, nesta proposta de
lei, como se processa a intervenção do tribunal relativamente a uma situação
como esta, mas isso tem de ser acautelado.
(…)
Por outro lado, (…) o Conselho Superior da Magistratura chama a atenção para
uma outra questão que também está relacionada com esta. É que as coimas e as
multas, no âmbito do processo penal, não têm caráter tributário, até porque a
responsabilidade penal não se transmite aos herdeiros, ou seja, é uma
responsabilidade que se extingue. A responsabilidade penal extingue-se com a
morte do arguido, o que não acontece com as dívidas tributárias. Portanto,
obviamente, são realidades completamente distintas e não podem, portanto, ser
amalgamadas numa proposta de lei, como pretende o Governo»[69].
Foi neste
contexto, já na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
Garantias[70] que surgiu a referida proposta de
alteração do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, de 29 de janeiro de 2019,
que, em 5 de fevereiro, sofreu um aditamento; e ainda uma proposta do Grupo
Parlamentar do PSD, de 1 de fevereiro de 2019. A redação final da lei acabou
por receber os contributos de todas estas propostas[71].
4.3.2. Da análise dos debates, do parecer
da Ordem dos Advogados, do parecer elaborado por um assessor do gabinete da
Procuradora-Geral da República e uma vogal do Conselho Superior do Ministério
Público e do parecer do Conselho Superior da Magistratura e destas propostas de
alteração, parece claro que o legislador recuou na intenção inicial de, por
esta via, cobrar multas com caráter penal aplicadas em processo judicial. Foram
essas as principais críticas dirigidas à proposta inicial e foi por sua causa
que surgiram as propostas de alteração.
O processo legislativo já não permite,
contudo, perceber facilmente por que motivo foi também suprimida a referência
inicial às custas, multas, coimas e outras sanções pecuniárias fixadas em
decisões administrativas. Os motivos não são aqui tão claros.
De facto, na
base desta supressão não parecem estar, seguramente, razões de índole
prática, maxime a hipotética indisponibilidade da Autoridade
Tributária para abraçar mais esta tarefa. Como também referiu, na reunião
plenária da Assembleia da República, de 4 de janeiro de 2019, a, então,
Secretária de Estado Adjunta e da Justiça:
«Relativamente à questão de estarmos a transformar a administração tributária
numa superagência e se foi ou não feito algum estudo que habilite o Ministério
da Justiça a certificar, expor e exarar na própria nota preambular que isto não
terá nenhum impacto na atividade normal desempenhada pelo serviço competente da
administração tributária, queria dizer o seguinte: não, não vai ter impacto. O
Ministério da Justiça não fez tudo, mas o Ministério das Finanças participou no
grupo de trabalho, teve a possibilidade de avaliar a situação, mediante um
estudo comparativo, perante o trabalho que lhe dá neste momento serem eles a
processar as execuções fiscais relativamente às coimas, às multas e às taxas de
justiça não pagas, portanto, relativamente a custas não pagas no âmbito da
jurisdição administrativa e fiscal, e tendo em conta o universo que é hoje
conhecido das execuções que pendem nos tribunais comuns, e chegou à conclusão
de que, para eles, o processo é de tal ordem mecanizado que isto não lhes traz
qualquer tipo de entropia. Portanto, é esta a garantia que
temos e temos de confiar, porque é
o Ministério das Finanças que vai processar
este tipo de execuções e, portanto,
se não lhe traz impacto, melhor
assim, porque podemos nós aproveitar essa falta de impacto na
administração tributária em favor de um impacto, esse, sim, muito positivo,
na administração da justiça, uma vez
que isso vai libertar funcionários e
recursos, que deixam de estar prisioneiros de tarefas
repetitivas para poderem dirigir a sua atividade para os processos que
verdadeiramente interessam à defesa dos direitos das pessoas nos tribunais»[72].
Por isso
mesmo, a única razão que se encontra para a supressão é, também aqui, o caráter
não sinalagmático da coima e, logo, como incisivamente denunciou o parecer do
Conselho Superior de Magistratura e a generalidade dos deputados que se pronunciaram,
a hipotética impossibilidade de cobrar estes montantes através das execuções
fiscais. Esquecendo a verdadeira natureza do direito de mera ordenação social[73] e, em consequência, a verdadeira
natureza da coima[74] e que, por isso mesmo, à semelhança
do que já acontece com «as coimas e outras sanções pecuniárias decorrentes da
responsabilidade civil determinada nos termos do Regime Geral das Infrações
Tributárias» [art. 148.º, n.º 1, al.ª c), do Código de Procedimento e de
Processo Tributário[75]], nada impediria a sua cobrança em sede
de execução fiscal, o legislador alterou a proposta inicial, assim excluindo do
âmbito deste diploma a cobrança de penas de multa e de coimas[76]. Mais do que um recuo no propósito
inicial do diploma, está em causa a sua restrição apenas a dívidas de natureza
sinalagmática ou bilateral, independentemente da entidade credora, por se
julgar (mal) que as coimas não podiam ser cobradas em sede de execução fiscal.
Não foi invocada nenhuma outra razão para o efeito.
4.4. A interpretação deste novo regime
legal, pressupõe ainda, para além destes elementos relativos à mens
legislatoris, a consideração da verdadeira natureza jurídica do que está em
causa. Do ponto de vista jurídico, o que são afinal as custas?
Nos termos do artigo 92.º, n.º 3, do
Regime Geral das Contraordenações:
«As custas abrangem, nos termos gerais, a taxa de justiça, os honorários
dos defensores oficiosos, os emolumentos a pagar aos peritos e os demais
encargos resultantes do processo».
Em causa
está, portanto, desde logo, a taxa de justiça[77]. Os custos do serviço de justiça são
suportados, em parte, pela coletividade, através dos impostos e, em parte,
pelos respetivos utentes, através do pagamento da taxa de justiça[78].
Como um dia escreveu Vítor António
Duarte Faveiro:
«todos necessitam da existência de serviços de justiça (…) pela
segurança que dão à garantia e à eficácia dos direitos individuais, à defesa da
coletividade contra o crime, à certeza das situações jurídicas; mas em certos
casos só alguns têm de recorrer ativamente aos tribunais ou a
eles são chamados para decisão do seu conflito com outrem (…). Daí que os
serviços destinados à satisfação de tais necessidades, sendo embora criados
pelo Estado, e correspondendo, pela simples existência, a uma necessidade
coletiva, devam em parte, ser mantidos e sustentados por aqueles que a eles
recorrem ativamente ou que provocam a situação de necessidade desse recurso ou
procura ativa. O pagamento de custas ou de emolumentos é, nestes casos, uma
forma de distribuição do custeio de tais serviços, na parte em que deve ser
imputado ao utente»[79].
As taxas podem ser devidas mesmo quando
os particulares não beneficiam, nem solicitaram, as atividades públicas que as
justificam. É, justamente, o que sucede com a taxa de justiça, devida pelos
arguidos condenados em processo penal. Como diz Nuno Sá Gomes:
«Aqui continua a haver contrapartida de atividade desenvolvida pelo Estado, mas
dificilmente se poderá falar em vantagens, utilidades ou benefícios auferidos
pelos particulares condenados ou que não solicitaram a prestação dos serviços
de justiça»[80].
Nestes
termos, a taxa de justiça devida pela condenação num processo de
contraordenação, correspondendo à prestação de um serviço público, ainda que
não solicitado ou até vivamente recusado pelo condenado, constitui um tributo
(como, logo, sublinhou a proposta de lei), nada impedindo que a sua cobrança
siga os procedimentos executivos, previstos para arrecadação dos restantes
tributos (art. 10.º, alª g), do Código de Procedimento e de Processo Tributário[81]).
Para além
disso, estão ainda em causa os demais encargos contraídos com o processo,
nomeadamente os eventuais honorários do defensor oficioso, os emolumentos a
pagar aos peritos ou outros encargos. Mais uma vez, ainda que contra a vontade
do visado, o procedimento contraordenacional deu origem a estes custos. Assim,
independentemente de saber se eles têm ou não natureza tributária[82], a verdade é que eles podem ser cobrados
pela administração tributária.
Desde logo, porque os serviços da
administração tributária têm, para além do mais, repetimos, competência para
cobrar as custas dos processos (art. 10.º, alª g), do Código de Procedimento e
de Processo Tributário) ou seja, neste caso, para cobrar a taxa de justiça e
demais encargos (art. 92.º do Regime Geral das Contraordenações).
Depois, porque nada impede que os mesmos
sejam cobrados em sede de execução fiscal, nos termos do artigo 148.º do Código
de Procedimento e de Processo Tributário, segundo o qual:
«1 - O processo de execução fiscal abrange a cobrança coerciva das seguintes
dívidas:
a) Tributos, incluindo impostos aduaneiros, especiais e extrafiscais, taxas,
demais contribuições financeiras a favor do Estado, adicionais cumulativamente
cobrados, juros e outros encargos legais».
Atenta a
natureza tributária da taxa de justiça e o caráter legal dos restantes encargos
(art. 92.º, n.º 2, do Regime Geral das Contraordenações), nada impede que eles
sejam cobrados através do processo de execução fiscal: quanto a estes créditos,
ninguém suscitou a incompetência ou sequer inconveniência na sua cobrança pela
Autoridade Tributária. As custas só não eram já executadas pela Autoridade
Administrativa porque, na sequência daquela longa tradição histórica[83], o Regime Geral das Contraordenações, à
semelhança dos outros ramos do direito adjetivos, dispunha de normas especiais,
para o efeito, que, justamente, foram agora revogadas. Daí que o artigo 148.º,
n.º 1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário tenha
alargado a sua área de aplicação.
Aliás, ainda
que porventura assim não fosse, a verdade é que as execuções fiscais podem ser
utilizadas para a cobrança de créditos de natureza não tributária, como por
exemplo, obrigações pecuniárias que, por força de um ato administrativo, devam
ser pagas a uma pessoa coletiva pública ou por ordem desta[84] ou outras dívidas sujeitas ao
regime de tesouraria do Estado[85]. Até porque, como se referiu supra, o
Tribunal Constitucional tem excluído a fase executiva do âmbito da reserva de
jurisdição dos Tribunais Administrativos e Fiscais (art. 212.º, n.º 3, da
Constituição da República Portuguesa), aceitando que àqueles sejam atribuídas
competências para a cobrança coerciva de outros créditos[86]. Nada impediria que, atenta a alegada
eficácia das execuções fiscais, o legislador exorbitasse aquelas competências
naturais.
4.5. Considerando esta natureza
tributária e a possibilidade de cobrar aqueles encargos legais (que,
insistimos, não foram questionadas), não admira que, para além de apenas ter
restringido o seu propósito inicial à cobrança de créditos de natureza
sinalagmática, o legislador tenha, já no decurso do processo legislativo,
eliminado outras possibilidades de cobrança.
É o caso das
alterações introduzidas à Lei da Organização do Sistema Judiciário (art. 2.º da
Lei n.º 27/2019, de 28 de março) que, em vez de atribuir, ao juízo ou tribunal
que as tivesse proferido, competência para executar as decisões relativas a
multas, custas e indemnizações previstas na lei processual aplicável, passou a
atribuir-lhe apenas competência para a execução das decisões relativas a multas
penais e indemnizações previstas na lei processual aplicável (art. 131.º da Lei
da Organização do Sistema Judiciário)[87].
É, igualmente, o caso da revogação do
artigo 57.º do Código de Processo Civil, que conferia ao Ministério Público
legitimidade para promover a execução por custas e multas judiciais impostas em
qualquer processo (art. 10.º, al.ª a), da Lei n.º 27/2019, de 28 de março).
É, em terceiro lugar, o caso da
revogação do artigo 141.º, alª n), do Código da Execução das Penas e Medidas
Privativas da Liberdade, que sem prejuízo de outras disposições legais,
atribuía ao representante do Ministério Público, junto do tribunal de execução
das penas, competência para instaurar a execução por custas (art. 10.º, al.ª
c), da Lei n.º 27/2019, de 28 de março).
É,
finalmente, o caso da alteração do artigo 469.º do Código de Processo Penal
que, em vez de conferir ao Ministério Público competência para promover a
execução das penas e das medidas de segurança, bem como a execução por custas,
indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba
representar judicialmente, passou a conferir-lhe, apenas, competência
para promover a execução das penas e das medidas de segurança e, bem assim, a
execução por indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que
lhe incumba representar judicialmente (art. 7.º da Lei n.º 27/2019, de 28 de
março). O legislador entendeu que não era suficiente eliminar a referência à
execução por custas, que constava do artigo 491.º do Código de Processo Penal,
complementando, in extremis, essa supressão com a redução das
próprias competências executivas do Ministério Público.
Desta forma, em vez de enfraquecer o
propósito inicial, o legislador reforçou-o, tornando, para além do mais, claro,
que, ressalvados os casos previstos na Lei (art. 35.º, n.º 3 do Regulamento das
Custas Processuais), o Ministério Público já não tem competências, nem no
processo penal, nem, tão pouco, no processo civil, para promover a tradicional
execução das custas. As alterações introduzidas vieram, afinal, confirmar o
propósito inicial, tornando-o ainda mais claro, mediante a revogação
transversal de normas que podiam induzir em sentido contrário. O legislador não
se limitou a afirmar, de forma positiva, a competência da Autoridade
Tributária, eliminando, de forma negativa, as anteriores competências do
Ministério Público, mantidas apenas para a cobrança de custas no estrangeiro,
nos termos daquele Regulamento.
É certo que o
legislador não alterou nem clarificou outas normas, nomeadamente o disposto no
artigo 89.º, n.º 2, do Regime Geral das Contraordenações[88] ou o artigo 126.º, n.º 1, al.ª m),
da Lei da Organização do Sistema Judiciário[89], que, numa interpretação rígida, podem
sugerir que o Ministério Público manteve incólumes as suas competências[90]. De todo o modo, embora o legislador
possa ser sempre mais claro, a verdade é que nem essa interpretação é legítima,
nem essa correção se impunha. As referidas normas tratam da execução da coima e
das competências executivas civis dos juízos do trabalho, não se confundindo
com a execução das custas. Daí que sejam inaplicáveis nesta situação concreta.
Tanto mais que também elas devem ser interpretadas de acordo com o restante
sistema jurídico (art. 9.º, n.º 1, do Código Civil), de que fazem parte
integrante.
Muito mais complexa é a manutenção do
artigo 60.º, n.º 1, da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, que continua a
prescrever que:
«Decorrido o prazo de pagamento das custas sem a sua realização, a autoridade
administrativa envia, nos 20 dias úteis seguintes, o processo ao Ministério
Público para a instauração da competente ação executiva».
O legislador eliminou as competências
executivas do Ministério Público mas manteve este preceito intacto. Isto não
significa que ele continue em vigor. Na verdade, ele é incompatível com as
novas disposições, que, num duplo movimento, remeteram a execução por custas
para as execuções fiscais e, ressalvada a cobrança de custas no estrangeiro,
eliminaram as competências do Ministério Público nesta matéria. Daí que este
preceito deva considerar-se tacitamente revogado (art. 8.º, n.º 2, do Código
Civil): o legislador nunca demonstrou qualquer vontade de excecionar estes
regimes. Antes pelo contrário, sempre invocou o caráter geral de reforma.
4.6. Acresce que, já em termos
teleológicos, não faria, sequer, sentido que o legislador remetesse para a
Autoridade Tributária a execução das custas fixadas nos tribunais comuns e
conservasse nos tribunais comuns as custas fixadas na fase administrativa do
processo de contraordenação, onde, justamente, a natureza administrativa do
processo é, ainda, mais evidente. O mesmo facto tributário (condenação em
custas decorrentes da participação em processo de contraordenação) daria lugar
a duas entidades executivas diversas, consoante tivesse havido ou não recurso
aos tribunais.
Por outro
lado, esta solução (remeter para as execuções fiscais as custas judiciais mas
conservar as custas fixadas na fase administrativa dos processos de
contraordenação) também não permitiria alcançar os ganhos de eficácia,
eficiência e deflação do sistema judiciário, que estiveram na base da alteração[91], continuando os tribunais judiciais
assoberbados com a cobrança destas dívidas. A reforma seria apenas parcelar.
A ausência de uma qualquer referência às
decisões de condenação em custas proferidas pelas Entidades Administrativas
deve-se, assim, certamente, não à vontade de as excluir, mas à circunstância
decisiva da sua inutilidade, atento o teor do artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do
Código de Procedimento e de Processo Tributário. Não é necessário voltar a
referir aquilo que já está referido na lei. A omissão destas decisões não
significa, portanto, uma qualquer lacuna legal, a preencher nos termos gerais.
Está em causa a mera cobrança coerciva de um verdadeiro tributo e dos
respetivos encargos legais, já admissível nos termos gerais.
Tanto mais que, continuando o artigo
92.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, a remeter para os preceitos
reguladores das custas em processo criminal, só se poderá concluir que as
custas fixadas na fase administrativa do processo de mera ordenação social
seguem o mesmo regime adjetivo: também elas obedecem ao regime agora consagrado
no artigo 35.º do Regulamento das Custas. Se o legislador tivesse querido submeter
estas custas a um regime processual diferente, mantendo as competências
tradicionais do Ministério Público, não as poderia ter revogado e teria
alterado também esta norma. Para excluir as custas fixadas pelas entidades
administrativas, o legislador teria que ter alterado também o artigo 92.º, n.º
1, do Regime Geral das Contraordenações, por forma a criar um sistema
autossuficiente.
4.7. O Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de
janeiro, que aprova o Regime Jurídico das Contraordenações Económicas[92] confirma esta nova opção do
legislador, prescrevendo, no artigo 64.º, que:
«1 - Da decisão condenatória da autoridade administrativa não impugnada
judicialmente é extraída certidão de dívida, de acordo com os requisitos do
artigo 163.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, procedendo-se
à cobrança coerciva, em processo de execução fiscal, da competência da
Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).
2 - A entrega da certidão de dívida é efetuada através da plataforma eletrónica
da AT ou por via eletrónica».
Deste modo,
apesar de continuar a atribuir aos tribunais judiciais competência para a fase
judicial do processo de contraordenação (art. 72.º)[93], o legislador, mantendo a mesma solução
adjetiva, remeteu a execução da coima e das custas para a Autoridade
Tributária. Ele não seguiu o exemplo dos regimes das contraordenações em
matéria tributária ou urbanística, integralmente remetidos para a jurisdição administrativa,
mas, ainda assim, utilizou as competências da Autoridade Tributária para a
cobrança coerciva daqueles montantes.
II
Como deverão
proceder os magistrados do Ministério Público relativamente ao expediente que
lhes for remetido pelas diversas autoridades administrativas para cobrança de
custas não pagas?
A segunda questão colocada consiste em
saber «como deverão proceder os magistrados do Ministério Público relativamente
ao expediente que para o efeito lhes for remetido pelas diversas autoridades
administrativas – deverá tal expediente ser-lhes devolvido, para os fins tidos
por convenientes, acompanhado de despacho onde constem as razões pelas quais se
entende que o Ministério Público não é legalmente competente para o efeito? Ou
deverá tal expediente, por mera economia de meios, ser reencaminhado
diretamente à Autoridade Tributária, com conhecimento à autoridade
administrativa que o remeteu, acompanhado do referido despacho?»
1. Nem o Regime Geral das
Contraordenações, nem os restantes regimes especiais contêm normas que permitam
responder à pergunta formulada. O regime ora implementado, apesar de estar na
génese do problema, também não o resolve, porventura, no espírito do
legislador, porque tudo ficou claro, devendo a entidade administrativa remeter
o expediente para o local certo: o legislador nem sequer pensou que tal
expediente pudesse ser remetido para entidade incompetente para promover a
execução. Isto não significa, todavia, que se esteja perante uma verdadeira
lacuna do regime de mera ordenação social, a integrar segundo a norma aplicável
aos casos análogos (art. 10.º, n.º 1, do Código Civil) ou, na sua falta,
segundo a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar
dentro do espírito do sistema (art. 10.º, n.º 3, do mesmo diploma legal). Na
verdade, sempre que (como é o caso) o contrário não resulte do regime geral de
contraordenações, são aplicáveis, devidamente adaptados, os preceitos
reguladores do processo criminal, que não sejam incompatíveis com ele (art. 41.º[94]). É aí que primeiro se deve procurar a
solução para o problema. As normas adjetivas do direito de mera ordenação
social não se restringem aos preceitos consagrados naquele regime geral (ou
naqueles regimes especiais), incluindo, nos casos aí omissos, todo o processo
penal que se harmonize com ele ou seja que respeite a sua teleologia própria.
2. O Código de Processo Penal também não
contém nenhuma norma, per si, capaz de resolver,
imediatamente, o problema. Como seria de esperar, atentas as finalidades deste
Código, não é possível encontrar aí uma resposta direta, expressamente,
plasmada no texto da lei. As relações entre as entidades administrativas
competentes para o processo de contraordenação e o Ministério Público não
tinham que ser reguladas no processo penal, que é alheio a esse problema.
Mesmo assim,
não obstante esta omissão, a solução deverá ser procurada no processo
penal, maxime através dos mecanismos de integração das lacunas
aí existentes, ou seja, aplicando, sucessivamente, por analogia, os restantes
preceitos processuais penais, as normas do processo civil que se harmonizem com
o processo penal ou, em última instância, os princípios gerais do processo
penal (art. 4.º)[95]. A aplicação subsidiária do processo
penal ao regime de mera ordenação social compreende, nos casos omissos, o
recurso a estas formas de integração das lacunas processuais penais. O artigo
4.º do Código de Processo Penal ainda é um preceito regulador do processo criminal,
sendo a forma extrema de resolver as lacunas do processo de mera ordenação
social, que não tenham sido previamente integradas pelas restantes normas do
processo penal. O legislador remeteu para todo o sistema processual penal, aí
se incluindo a forma legal de ultrapassar as suas lacunas.
E não se diga
que esta solução legislativa não salvaguarda a autonomia do direito de mera
ordenação social[96] e que, portanto, a resposta para a
integração de uma lacuna deverá ser autonomamente procurada dentro desse mesmo
direito, maxime através da aplicação analógica do artigo 40.º,
n.ºs 1 e 2, do Regime Geral das Contraordenações, segundo os quais, caso a
autoridade administrativa tenha remetido o processo ao Ministério Público, por
entender que a infração constitui afinal um crime, o Ministério Público
devolverá o processo à mesma autoridade se considerar que não há lugar para a
responsabilidade criminal.
Na verdade, as situações são muito
diversas, havendo aí razões válidas para a devolução do processo à entidade
administrativa, que aqui não se justificam. Com efeito, a devolução do processo
à entidade administrativa, por se considerar que não existe crime, destina-se a
permitir que ela prossiga com o processo de contraordenação, eventualmente
aplicando uma coima e diligenciando pela sua execução: sem o processo, nada
disso será possível. Com a decisão do Ministério Público, a entidade
administrativa recupera as suas competências, prosseguindo (ou não) com ele.
Nada disso acontece neste caso, tendo a
decisão proferida transitado em julgado, de modo que falta apenas a sua
execução. A devolução do processo (ou do expediente remetido para execução) não
terá aqui qualquer consequência, para além da obrigação de o remeter à
Autoridade Tributária. Não há, por isso mesmo, aqui nenhuma analogia de
situações. Aquela norma não pode ser convocada para solucionar a questão.
Ainda que
assim não fosse, sempre se diria que, independentemente da discussão, de iure
constituendo, sobre a verdadeira localização do direito de mera ordenação
social, o intérprete nunca poderia sobrepor a sua conceção pessoal à solução
legitimamente consagrada pelo legislador, que (repetimos) remete a resolução
desses casos para o universo processual penal, desde que essa adaptação não
viole regras ou princípios contraordenacionais[97]. Procurar uma situação análoga dentro do
Regime Geral das Contraordenações, em vez de recorrer ao direito subsidiário,
consubstancia uma metodologia jurídica inadmissível, que subverte as regras
fixadas pelo legislador. Bem ou mal, ele tomou a sua opção: só se aplica aquilo
que não contrarie a intencionalidade própria do direito de mera ordenação
social. De modo que, não obstante aquela remissão imediata, a sua autonomia está
perfeitamente assegurada.
Assim, mesmo que, aparentemente,
contenham a melhor solução para o caso concreto, as regras de outros ramos
adjetivos do ordenamento jurídico (nomeadamente do direito administrativo) não
são aqui aplicáveis.
2.1. Nos termos do artigo 33.º, n.º 1,
do Código de Processo Penal:
«1 - Declarada a incompetência do tribunal, o processo é remetido para o
tribunal competente, o qual anula os atos que se não teriam praticado se
perante ele tivesse corrido o processo e ordena a repetição dos atos
necessários para conhecer da causa».
Em vez de
devolver o processo ao Ministério Púbico (para que este o remeta ao tribunal
competente), o tribunal que se considera incompetente deverá remeter o processo
ao tribunal que julga ser competente. Na base desta solução está, obviamente, a
celeridade e a economia de meios[98]. Sendo a declaração de incompetência
irrelevante para o posterior exercício do ius puniendi estadual,
não faria sentido devolver o processo ao Ministério Público para que este
depois o remetesse ao tribunal competente. Proceder dessa forma seria praticar
um ato inútil.
O mesmo acontece no decurso do próprio
inquérito, porquanto:
«1 - Se, no decurso do inquérito, se apurar que a competência pertence a
diferente magistrado ou agente do Ministério Público, os autos são transmitidos
ao magistrado ou agente do Ministério Público competente» (art. 266.º, n.º 1)[99].
Também aqui a solução adjetiva é exatamente
a mesma: transmissão direta do processo ao Ministério Público competente, com
aproveitamento dos atos de inquérito antes realizados, que sejam válidos (n.º
2). Mais uma vez, por razões de economia e de celeridade, não há devolução do
inquérito à sua procedência.
Finalmente, o mesmo princípio aflora,
ainda, no regime processual da denúncia efetuada perante entidade incompetente
para o procedimento. Com efeito:
«A denúncia feita a entidade diversa do Ministério Público é transmitida a este
no mais curto prazo, que não pode exceder 10 dias» (art. 245.º[100]).
Em vez de devolver o expediente ao
denunciante, a solução legal consiste na sua rápida transmissão à entidade
competente.
Em todas
estas situações processuais, a incompetência do órgão chamado a praticar um
determinado ato processual penal determina, portanto, a imediata remessa dos autos
para a entidade competente e não a sua devolução burocrática à procedência.
Será uma perda de tempo e de meios devolver o processo à entidade procedente,
apenas para que esta o remeta, depois, à entidade, afinal, competente. Embora
(como já iremos ver) seja oriundo do processo civil, o princípio da economia
processual contaminou outros ramos do direito adjetivo, como o processo penal,
sendo estas normas uma clara manifestação da sua valência geral[101]. Também no processo penal, a prática de
atos inúteis é proibida. A celeridade, que o direito a ser julgado no mais
curto prazo compatível com as garantias de defesa (art. 32.º, n.º 2, CRP) ou de
que a causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável (art.
20.º, n.º 4, CRP) demanda, impõe esta solução. Tudo aquilo que, sem qualquer
justificação racional, maxime a defesa de direitos ou pretensões
de um qualquer interessado ou da própria sociedade, provoque o arrastamento do
processo deverá ser excluído. Até porque, segundo Jorge de Figueiredo Dias:
«o efeito de prevenção geral do sistema penal (ao qual, por toda a parte, a opinião
pública e os meios de comunicação social se mostram tão sensíveis) não depende
em quase nada de uma grande severidade das penas; mas depende em extremo grau
da probabilidade da punição e do lapso de tempo dentro do qual ela
venha a efetivar-se»[102].
O timing da
execução da sanção também não é despiciendo. A necessidade de celeridade
permanece mesmo depois do trânsito em julgado. Tanto mais que os prazos de
prescrição das coimas são fulminantes (sem prejuízo da sua suspensão ou da sua
interrupção, um ou três anos – art. 29.º do Regime Geral das Contraordenações):
não há, por isso, tempo para diligências inúteis.
2.1.1. Embora seja possível convocar a
aplicação analógica de qualquer uma destas três normas processuais penais, a
norma que melhor responde à situação concreta é a norma que permite ao
Ministério Público transmitir os autos ao magistrado competente (art. 266.º,
n.º 1, do Código de Processo Penal). Desde logo, porque está em causa um ato do
próprio Ministério Público e não um ato do juiz (art. 33.º) ou de outra
entidade qualquer (art. 245.º). Depois porque o princípio consagrado nesta
norma deverá ser alargado a outras situações para além da simples incompetência
territorial. Também nos casos em que o Ministério Público não seja
materialmente competente para a prática do ato solicitado, a solução deverá ser
a remessa do expediente à entidade competente para o efeito.
2.2. A solução não seria muito
diferente se estas normas processuais penais não pudessem ser aplicadas
analogicamente às situações que originaram o presente pedido de Parecer, nos
termos previstos no artigo 41.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações e
no artigo 4.º do Código de Processo Penal.
Segundo um
velho princípio processual, que remonta ao Código de Processo Civil, de 1939
(art. 138.º[103], atual art. 130.º), não é lícito
realizar no processo atos inúteis. Na verdade, «deve procurar-se o máximo
resultado processual com o mínimo emprego de atividade; o máximo rendimento com
o mínimo custo». O processo deve «comportar só os atos e formalidades
indispensáveis ou úteis (economia de atos e economia de formalidades)»[104]. Deste ponto de vista, a devolução do
processo à entidade administrativa para posterior remessa à Autoridade
Tributária não tem qualquer utilidade para a execução da coima e, como tal, está
proibida.
Se não fosse possível encontrar uma
solução (analógica) no próprio processo penal, por aplicação deste velho
preceito processual civil (art. 130.º), sempre se teria de concluir que ao
Ministério Público está vedado o ato inútil de devolver o expediente à
procedência. Esse procedimento não tem qualquer utilidade processual ou extra
processual (não salvaguarda qualquer direito dos intervenientes), retardando
apenas a devida execução coerciva da decisão da entidade administrativa.
2.3. E não se diga que, desta forma, a
entidade administrativa não toma conhecimento do erro cometido e das suas
consequências nefastas, continuando a remeter este tipo de expediente para o
Ministério Público, em vez de o remeter para a entidade devida. Na verdade, como
o próprio pedido de parecer sugere, o Ministério Público deverá informar a
entidade administrativa da sua incompetência em razão da matéria e da,
consequente, remessa do processo para a Autoridade Tributária. Dessa forma,
através dessa simples comunicação, a entidade administrativa ficará a saber que
o Ministério Público entende que já não pode promover a execução da taxa de
justiça e demais encargos legais e que, portanto, não lhe deverá remeter esse
expediente.
É certo que o Ministério Púbico não tem
qualquer poder hierárquico sobre a entidade administrativa em causa e que esta
poderá ter um entendimento diverso. A administração poderá continuar a defender
que ele ainda conserva aquele poder de executar as coimas aplicadas em processo
de contraordenação. De todo o modo, esta possibilidade teórica, tanto pode
acontecer nos casos de devolução do processo, como nos casos de mera informação
da sua remessa para a Autoridade Tributária, sendo, nesta perspetiva, a escolha
por uma das duas soluções possíveis irrelevante. A resolução para esse eventual
conflito só será possível noutra sede, não passando pela tramitação que o
Ministério Público venha a adotar.
III
Conclusões
Em face do exposto, formulam-se as
seguintes conclusões:
1.ª Na sua versão original, o Regime
Geral das Contraordenações remetia a execução das custas para o disposto nos
artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais, assim atribuindo ao
Ministério Público competência para promover a sua execução junto dos tribunais
judiciais (art. 202.º, n.º 2, daquele Código);
2.ª Esta solução, apesar das inúmeras
alterações legislativas que enfrentou, manteve-se quase inalterada até à
entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de março, relativa à aplicação do
processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas, multas não penais e
outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial;
3.ª Com efeito, considerando a
natureza tributária das custas e seguindo o exemplo da jurisdição
administrativa e fiscal, o legislador inverteu aquele paradigma, remetendo para
a execução fiscal a cobrança coerciva das custas fixadas em processo judicial;
4.ª Para esse efeito, a Lei n.º
27/2019, de 28 de março, alterou o Código de Procedimento e de Processo
Tributário que passou a dispor que «Poderão ser igualmente cobradas mediante
processo de execução fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei:
(…) Custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo
judicial [art. 148.º, n.º 2, alª c)];
5.ª Bem como o artigo 35.º, n.º 1, do
Regulamento das Custas Processuais, que sob a epígrafe «execução», passou a
dispor que: «Compete à administração tributária, nos termos do Código de Procedimento
e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança coerciva das
custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo
judicial»;
6.ª Embora nem a Lei n.º 27/2019, de
28 de março, nem as normas que ela alterou, o digam expressamente, deve
entender-se que este regime é aplicável às custas fixadas na fase
administrativa do processo de mera ordenação social, competindo à Administração
Tributária proceder à sua cobrança coerciva;
7.ª Desde logo, porque, continuando o
artigo 92.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, a remeter para os
preceitos reguladores das custas em processo criminal, será aqui aplicável o
disposto no artigo 35.º do Regulamento das Custas;
8.ª Depois, porque, atenta a sua
natureza, tais custas estão incluídas no âmbito do artigo 148.º, n.º 1, al.ª
a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, segundo o qual o
processo de execução fiscal abrange, para além do mais, a cobrança coerciva de
taxas, demais contribuições financeiras a favor do Estado, adicionais
cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais;
9.ª Em terceiro lugar, porque, em vez
de atribuir ao juízo ou tribunal que as tenha proferido competência para
executar as decisões relativas a multas, custas e indemnizações previstas na
lei processual aplicável, o legislador passou a atribuir-lhe, apenas,
competência para a execução das decisões relativas a multas penais e
indemnizações previstas na lei processual aplicável (art. 131.º da Lei da
Organização do Sistema Judiciário);
10.ª Em quarto lugar, porque o
legislador restringiu os poderes do Ministério Público, maxime o
poder de promover a execução por custas, conferindo-lhe, agora, apenas, competência
para promover a execução das penas e das medidas de segurança e, bem assim, a
execução por indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que
lhe incumba representar judicialmente (art. 469.º do Código de Processo Penal);
11.ª Finalmente, porque o legislador
eliminou a referência à execução por custas, que constava do artigo 491.º, n.º
2, do Código de Processo Penal, passando a mesma a ser da competência exclusiva
da Administração Tributária;
12.ª Com estas alterações, para além de
ter atribuído à Administração Tributária competência para proceder à cobrança
coerciva das custas, o legislador eliminou as normas que antes atribuíam ao
Ministério Público competência para promover a sua execução e aos tribunais
judiciais competência para a tramitar;
13.ª Desta forma, o artigo 148.º, n.º
1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, passou a
incluir a cobrança da taxa de justiça e dos encargos legais, que, por força de
disposições legais especiais, antes lhe estava subtraída; e
14.ª Se
as entidades administrativas remeterem ao Ministério Público expediente
destinado à cobrança de custas fixadas em processo de contraordenação, tal
expediente deverá, por mera economia de meios, ser reencaminhado diretamente à
Autoridade Tributária, com conhecimento ao remetente.
[1] Aprovado
pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agostos e alterado pela Lei n.º 2/2020, de 31 de
março.
[2] Era a
seguinte a redação original desta norma: «Compete ao Ministério Público
promover a execução das penas, imposto de justiça, indemnização de perdas e
danos e mais quantias devidas ao Estado»; Sobre esta norma, a sua origem e
soluções de direito comparado, por todos, Luís Osório da Gama e Castro de
Oliveira Batista, Comentário ao Código de Processo Penal Português,
Coimbra, Coimbra Editora, 1934, p. 228 e ss.
[3] Sobre
este regime, por exemplo, José Alberto dos Reis, Comentário ao Código
de Processo Civil, Coimbra, Coimbra Editora, 1960, 1, p. 276/7.
[4] Aprovado
pelo Decreto-Lei n.º 44329, de 8 de maio de 1962; e alterado pelo Decreto-Lei
n.º 47692, de 11 de maio de 1967; pelo Decreto-Lei n.º 48853, de 30 de janeiro
de 1969; pelo Decreto-Lei n.º 49213, de 29 de agosto de 1969; pelo Decreto-Lei
n.º 270/72, de 2 de agosto; pelo Decreto-Lei n.º 297/1973, de 22 de dezembro;
pelo Decreto-Lei n.º 161/76, de 27 de fevereiro; pelo Decreto-Lei n.º 364/77,
de 2 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 533/77, de 30 de dezembro; pelo
Decreto-Lei n.º 366/80, de 10 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 224/82, de 8 de
junho; pela lei n.º 3/83, de 26 de fevereiro; pelo Decreto-Lei n.º 223/83, de
27 de maio; pelo Decreto-Lei n.º 118/85, de 19 de abril; pelo Decreto-Lei n.º
242/85, de 9 de julho; pelo Decreto-Lei n.º 225/85, de 30 de setembro; pela Lei
n.º 31/86, de 29 de agosto; pelo Decreto-Lei n.º 214/87, de 28 de maio; pelo
Decreto-Lei n.º 387-D/87, de 29 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 92/88, de 17
de março; pelo Decreto-Lei n.º 212/89, de 30 de junho; pela Lei n.º 30-C/92, de
28 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de abril; pelo Decreto-Lei
n.º 254/93, de 15 de julho; pelo Decreto-Lei n.º227/94, de 8 de setembro; pelo
Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de fevereiro; e revogado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96,
de 26 de novembro.
[5] Em
1973, Eduardo Correia tinha defendido que os tribunais administrativos deviam
ser competentes para o efeito, nomeadamente porque «admitir um recurso para os
tribunais comuns, seria, afinal criminalizar decisões que, justamente, se quer
que não tenham o sentido das sentenças que aplicam penas criminais» («Direito
Penal e Direito de Mera Ordenação Social», AA.VV. Direito Penal
Económico e Direito Europeu: Textos Doutrinários, Coimbra, Coimbra Editora,
1998, 1, p. 15).
[6] Para as
origens deste diploma e o nascimento do direito de mera ordenação social, cfr.,
entre outros, Tiago Lopes de Azevedo, Lições de direito das
contraordenações, Coimbra, Almedina, 2020, p. 18 e ss.; Idem, Da
subsidiariedade do direito das contraordenações: problemas, críticas e
sugestões práticas, Coimbra, Coimbra Editora, 2011, p. 59 e ss.; Augusto
Silva Dias, Direito das Contraordenações, Coimbra, Almedina, 2020,
p. 27; Nuno Brandão, Crimes e Contraordenações: da Cisão à Convergência
Material, Coimbra, Coimbra Editora, 2016, p. 180 e ss.; Alexandra
Vilela, O Direito de Mera Ordenação Social: Entre a Ideia de
“Recorrência” e a de ”Erosão” do Direito Penal Clássico, Coimbra, Coimbra
Editora, 2013, p. 156 e ss.; José Lobo Moutinho, Direito das
contraordenações: ensinar e investigar, Lisboa, Publicações
Universidade Católica, 2008, p. 22 e ss.
[7] Cuja
redação, vigente à data, na sequência das alterações que lhe tinham
introduzidas pelo Decreto-Lei 377/77, de 6 de setembro, era a seguinte:
«Findo o prazo de pagamento da multa ou
de alguma das prestações sem que o réu efetue o pagamento, procede-se à
execução patrimonial nos termos seguintes:
1.º Tendo o réu bens suficientes e
desembaraçados de que o tribunal tenha conhecimento ou que o réu indique no
prazo de pagamento, comprovando a sua titularidade, o Ministério Público
promoverá logo a execução, que seguirá nos termos das execuções por custas, com
observância do disposto no artigo 1696.º do Código Civil;
2.º Responderão sempre pelo pagamento da
multa todos os instrumentos utilizados na prática da infração e os seus
produtos, salvo os que pela prática da infração ficarem perdidos para o Estado
e os que, pertencendo a terceiro, tiverem sido utilizados sem o seu
conhecimento ou contra a sua vontade. Para os efeitos do disposto neste número,
poderão ser apreendidos os instrumentos e produtos, sempre que os infratores
não garantam de modo adequado o pagamento da multa provável. São nulos os atos
de disposição dos referidos instrumentos e produtos, levados a efeito após a
prática da infração, que prejudiquem o pagamento da multa, ressalvando-se os
direitos dos adquirentes de boa-fé, conforme o estipulado na lei civil».
[8] Era a
seguinte a redação desta norma: «2 - A execução será promovida pelo
representante do Ministério Público junto do tribunal competente e obedecerá
aos termos da execução por custas, aplicando-se, devidamente adaptado, o
disposto no artigo 640.º do Código de Processo Penal».
[9] Era a
seguinte a redação completa desta norma:
«Artigo 78.º
(Princípios gerais)
1 - Se o contrário não resultar desta
lei, as custas em processo de contraordenação regular-se-ão pelo disposto nos
artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais.
2 - As decisões das autoridades
administrativas que decidam sobre a matéria do processo deverão fixar o
montante das custas e determinar quem as deve suportar.
3 - As custas abrangem, nos termos
normais, o imposto de justiça, os honorários dos defensores oficiosos, os
emolumentos a pagar aos peritos e os demais encargos resultantes do processo».
[10] Aprovado
pelo Decreto-Lei 433/82, de 27 de outubro, alterado pela Declaração de 6 de
janeiro de 1983; pelo Decreto-Lei n.º 356/89, de 17 de outubro; pela Declaração
de 31 de outubro de 1989; pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de setembro; pelo
Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de dezembro; e pela Lei n.º 109/2001, de 24 de
dezembro.
[11] Apesar
das múltiplas alterações que o Código das Custas Judiciais sofreu o artigo
202.º, n.º 2, permaneceu quase intocado, tendo sido alterado pelo Decreto-Lei
n.º 161/76, de 27 de fevereiro, que lhe deu a seguinte redação, vigente à data
da entrada em vigor do Regime Geral das Contraordenações: «2. Se forem
conhecidos bens que possam ser imediatamente executados ou o réu os indicar,
comprovando a sua titularidade, o Ministério Público instaurará execução no
tribunal da condenação, a qual seguirá os termos das execuções por custas
reguladas na parte cível, com observância do disposto no artigo 1696.º do
Código Civil».
[12] Como o
legislador reconhece no próprio preâmbulo: «dois diplomas que, pelo seu papel
no contexto da ordem jurídica portuguesa, em muitos casos estreitaram
drasticamente o espectro das alternativas disponíveis, enquanto noutros casos
predeterminaram o sentido e o alcance das soluções a consagrar em processo
penal».
[13] Salvador
da Costa (Código das Custas Judiciais: anotado e comentado, Coimbra, Almedina,
1990, p. 246) defendia, então, que o artigo 488.º, n.º 2, do Código de Processo
penal revogou tacitamente aquele artigo 202.º, n.º 2, do Código das Custas
Judiciais, uma vez que «é injustificada a duplicidade de regime e dele ressalta
intenção de abrangência, na medida em que a eficácia da indicação de bens à
penhora pelo arguido deixou de depender da comprovação por ele da respetiva
titularidade».
[14] O
Decreto-Lei n.º 356/89, de 17 de outubro, no intuito de aproximar a justiça dos
seus destinatários (cfr. o respetivo preâmbulo) tinha, entretanto, alterado o
artigo 61.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, passando a ser
competente para conhecer do recurso o tribunal em cuja área territorial se
tiver praticado a infração e não o tribunal em cuja área territorial tem a sua
sede a autoridade que aplicou a coima. Solução que, para além daquele propósito
confessado pelo legislador, também se afigura mais próxima do processo penal
(segundo o art. 19.º, n.º 1, «é competente para conhecer de um crime o tribunal
em cuja área se tiver verificado a consumação»).
[15] Cfr. o
preâmbulo do referido diploma.
[16] Como se
diz no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de novembro, «aprovado o
Código de Processo Penal pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro, as
normas sobre responsabilidade por custas, no sentido pacificamente abrangente
da taxa de justiça e dos encargos, que passaram a figurar no seu livro XI,
entraram em colisão com disposições do Código das Custas Judiciais, as quais,
não obstante a sua instrumentalidade, continuaram a ser objeto de uma aplicação
acrítica, em clara sobreposição com disposições que deviam traçar-lhes os
limites».
[17] O novo
Código das Custas judiciais regulava as custas criminais nos artigos 74.º e ss.
Para a interpretação de tais artigos, Salvador da Costa, Código das
Custas Judiciais anotado e comentado, Coimbra, Almedina, 1997, p. 261 e ss.
[18]
Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro. Em bom rigor, em
abono da verdade, importa referir que o regime das custas administrativas e
tributárias já tinha sido introduzido no Código da Custas Judiciais (art.
73.º-A) pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro.
[19]
Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro (Ret. n.º 22/2008, de
24 de abril) e alterado pela Lei n.º 43/2008, de 27 de agosto; pelo Decreto-Lei
n.º 181/2008, de 28 de agosto; pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro; pela
Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril; pelo Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de abril;
pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro (Retificação n.º 16/2012, de 26 de
março); pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º
126/2013, de 30 de agosto; pela Lei n.º 72/2014, de 2 de setembro; pela Lei n.º
7-A/2016, de 30 de março; pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro; pela Lei n.º
49/2018, de 14 de agosto; pelo Decreto-lei n.º 86/2018, de 29 de outubro; pela
Lei n.º 27/2019, de 28 de março; e pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.
[20] Lei n.º
62/2013, de 26 de agosto (na versão da Retificação n.º 42/2013, de 24 de
outubro), alterada pela Lei n.º 40-A/2016, de 22 de dezembro; pela Lei n.º
94/2017, de 23 de agosto; pela Lei Orgânica n.º 4/2017, de 25 de agosto; pela
Lei n.º 23/2018, de 5 de junho; pelo DL n.º 110/2018, de 10 de dezembro; pela Lei
n.º 19/2019, de 19 de fevereiro; pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março; pela Lei
n.º 55/2019, de 05 de agosto e pela Lei n.º 107/2019, de 9 de
setembro.
[21] A
redação original foi, entretanto, alterada pela Lei n.º 63/2013, de 27 de
agosto, e pela Lei n.º 55/2017, de 17 de julho.
[22] Era a
seguinte a redação do referido preceito: «7 - Das decisões proferidas nos
processos por contraordenação cabe recurso para o tribunal fiscal aduaneiro
territorialmente competente, segundo as regras do n.º 5».
[23] Era a
seguinte a redação do referido preceito: «3 - Se o resultado obtido nos termos
do artigo anterior não atingir a importância das quantias devidas, feita a
distribuição da quantia que se tiver executado, será o processo remetido ao
tribunal tributário de 1.ª instância competente para a realização da execução,
que seguirá a forma do processo de execução fiscal previsto no Código de
Processo das Contribuições e Impostos».
[24] Aprovado
pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro e alterado pela Lei n.º 3-B/2000,
de 4 de abril; pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 15/2001,
de 5 de junho; pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro; pela Lei n.º
32-B/2002, de 30 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 08 de março;
pelo Decreto-Lei n.º 160/2003, de 19 de julho; pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de
dezembro; pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º
76-A/2006, de 29 de março; pelo Decreto-Lei n.º 238/2006, de 20 de dezembro;
pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de
dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro; pela Lei n.º
40/2008, de 11 de agosto; pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro; pela Lei
n.º 3-B/2010, de 28 de abril; pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro; pela
Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de
dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 6/2013, de 17 de janeiro; pela Lei n.º
83-C/2013, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro; pela
Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de
dezembro; pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março; pela Lei n.º 13/2016, de 23 de
maio; pelo Decreto-Lei n.º 36/2016, de 1 de julho; pela Lei n.º 42/2016, de 28
de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 93/2017, de 1 de agosto; pela Lei n.º
100/2017, de 28 de agosto; pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro; pela Lei
n.º 71/2018, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março; pela Lei
n.º 32/2019, de 3 de maio; pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro; pela Lei
n.º 119/2019, de 18 de setembro; pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março e pela Lei
n.º 7/2021, de 26 de fevereiro.
[25] É a
seguinte a redação da referida norma: «1 - As decisões de aplicação das coimas
e sanções acessórias podem ser objeto de recurso para o tribunal tributário de
1.ª instância, no prazo de 30 dias após a sua notificação, a apresentar no
serviço tributário onde tiver sido instaurado o processo de contraordenação».
[26] É a
seguinte a redação da referida norma: «1 - As coimas aplicadas em processo de
contraordenação tributário são cobradas coercivamente em processo de execução
fiscal».
[27] Este
diploma foi corrigido pela Ret. n.º 15/2001, de 4 de agosto e alterado pela Lei
n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro; Decreto-Lei n.º 229/2002, de 31 de outubro;
pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 107-B/2003, de 31 de
dezembro; pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 39-A/2005, de
29 de julho; pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 53-A/2006,
de 29 de dezembro; pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho; pelo Decreto-Lei n.º
307-A/2007, de 31 de agosto; pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro; pela
Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril;
pelo Decreto-Lei DL n.º 73/2010, de 21 de junho; pela Lei n.º 55-A/2010, de 31
de dezembro; pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 20/2012,
de 14 de maio; pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º
6/2013, de 17 de janeiro; pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro; pela Lei
n.º 75-A/2014, de 30 de setembro; pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro;
pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de
março; pela Lei n.º 24/2016, de 22 de agosto; pelo Decreto-Lei DL n.º 64/2016,
de 11 de outubro; pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro; pelo Decreto-Lei DL
n.º 93/2017, de 1 de agosto; pela Lei n.º 92/2017, de 22 de agosto; pela Lei
n.º 98/2017, de 24 de agosto; pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro; pela
Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 17/2019, de 14 de fevereiro;
pela Lei n.º 98/2019, de 4 de setembro; pela Lei n.º 119/2019, de 18 de
setembro; pela Lei n.º 58/2020, de 31 de agosto; e pela Lei n.º 7/2021, de 26
de fevereiro.
[28] Mário
Aroso de Almeida, in Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição
da República Portuguesa Anotada, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, 3, p.
144.
[29] Gomes
Canotilho e Vital Moreira consideravam, então, os Tribunais Administrativos e
Fiscais como uma categoria constitucional facultativa, geradora de alguma
perplexidade, uma vez que ficava «dependente da lei uma categoria de tribunais
que goza(va) de uma posição solidamente sedimentada no atual sistema judicial»
(Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, Coimbra Editora,
1985, 2, p. 324).
[30] Alterado
pela Lei n.º 4/86, de 31 de março; pela Lei n.º 46/91, de 8 de março; pela Lei
n.º 11/93, de 6 de abril; pela Lei n.º 49/96, de 9 de abril; pelo Decreto-Lei
n.º 229/96, de 29 de novembro; pelo Decreto-Lei n.º 301-A/99, de 5 de agosto;
pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho
e revogado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro (artigo 8.º, alª c). A
aprovação deste estatuto revestiu-se da maior importância uma vez que, apesar
daquelas hesitações constitucionais, optou por separar os tribunais que julgam
a matéria administrativa e fiscal dos tribunais que julgam a matéria civil e
criminal lançando as bases para a revisão Constitucional de 1989. Neste
sentido, Mário Aroso de Almeida, Constituição …, p 145.
[31] Com as
alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 229/96, de 29 de novembro, a
referida norma passou a constar do artigo 62.º, n.º 1, alª o).
[32] Decreto-Lei
n.º 267/85, de 16 de julho (na versão da ratificação n.º 200/1985, de 31 de
agosto); alterado pelo Decreto-Lei n.º 4/86, de 6 de janeiro; pela Lei n.º
12/86, de 21 de maio; pelo Decreto-Lei n.º 326/89, de 26 de setembro; pelo Decreto-Lei
n.º 229/96, de 29 de novembro; pelo Decreto-Lei n.º 231/97, de 3 de setembro;
pelo Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de dezembro e revogado pela Lei n.º
15/2002, de 22 de fevereiro.
[33] Aprovada
pelo Decreto-Lei n.º 45005, de 27 de abril de 1963 e alterado pelo Decreto-Lei
n.º 45400, de 30 de novembro; pelo Decreto-Lei n.º 48699, de 23 de novembro;
pelo Decreto-Lei n.º 217/76, de 25 de março; pelo Decreto-Lei n.º 434/77, de 17
de outubro; pelo Decreto-Lei n.º 500/79, de 22 de Dezembro; pelo Decreto-Lei
n.º 362/82, de 8 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 485/82, de 28 de dezembro;
pelo Decreto-Lei n.º 177/86, de 2 de julho; pelo Decreto-Lei n.º 414/86, de 10
de novembro e revogado pelo Decreto-Lei n.º 154/91, de 23 de abril.
[34] Neste
sentido, Mário Aroso de Almeida, Constituição …, p 145.
[35] O
artigo 136.º da Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de setembro, alterou a
numeração deste artigo, que passou a ser o artigo 212.º, mas manteve a sua
redação original.
[36] A
Justiça Administrativa (Lições), Coimbra, Coimbra Editora, 2017, p.
97.
[37] José
Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa…, p. 98; Mário
Aroso de Almeida, Constituição …, p 148/9.
[38] Ac.
607/95, de 8 de novembro.
[39] Ac. n.º
371/94, de 11 de maio e, depois, acs. n.ºs 372/94, de 11 de maio; 508/94, de 14
de julho; 610/94, de 22 de novembro; 629/94, de 22 de novembro, ou 630/94, de 22
de novembro.
[40] José
Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa…, p. 98 e ss.; Mário
Aroso de Almeida, Constituição …, p 148/9; Diogo Freitas do
Amaral/Mário Aroso de Almeida, Grandes Linhas da Reforma do Contencioso
Administrativo, Coimbra, Almedina, 2002, p. 23 e ss.; Paulo Castro
Rangel, Repensar o Poder Judicial Fundamentos e Fragmentos, Porto,
Universidade Católica Editora, 2001, p. 202 e ss.
[41] Ac.
522/2008, de 29 de outubro. Para o efeito, o referido acórdão invoca, inter
alia, que «sendo inegável a natureza administrativa (no caso, em matéria
ambiental) do processo de contraordenação e das situações jurídicas que lhe
estão subjacentes, a verdade é que o processo contraordenacional, pelo menos na
fase judicial, está gizado à imagem do processo penal (cfr. artigos 41.º e 59.º
e s., maxime, 62.º e s., do RGCO, e artigo 52.º Lei n.º 50/2006, de 29 de
agosto, que estabelece o regime aplicável às contraordenações ambientais).
Neste contexto, em que coexistem matérias administrativas com modelos
processuais penalistas, a “remissão” para os tribunais judiciais das
impugnações judiciais no âmbito de processos de contraordenação (ambiental) não
se afigura atentatória do figurino típico que a Constituição quis consagrar
quanto ao âmbito material da justiça administrativa».
[42] Era a
seguinte a redação da referia norma:
Artigo 237.º
Competência
1 - É competente para o processo de
execução fiscal a repartição de finanças do domicílio ou sede do devedor, salvo
tratando-se de coima fiscal e respetivas custas, caso em que será a repartição
de finanças onde tiver corrido o processo da sua aplicação.
2 - Compete ao tribunal tributário de
1.ª instância da área onde correr a execução, depois de ouvido o Ministério
Público, nos termos do n.º 2 do artigo 41.º, decidir os incidentes, os
embargos, a oposição, a verificação e graduação de créditos e a anulação da
venda bem como os recursos referidos no artigo 355.º
3 - Compete ainda ao tribunal tributário
de 1.ª instância o conhecimento de todas as questões relativas à legitimidade
dos responsáveis subsidiários, incluindo a culpa das pessoas referidas nos artigos
12.º e 13.º, devendo a prova ser feita na oposição».
[43] Ac. do
Pleno da 1.ª Seção do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de junho de 2007,
proferido no processo n.º 01172/06.
[44] Solução,
como já se viu, depois confirmada pelo Regulamento das Custas de 2008.
[45] Ac. do
Pleno da 1.ª Seção do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de junho de 2007,
proferido no processo n.º 01172/06; no mesmo sentido, já havia decidido o Ac.
do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
de 8 de junho de 2005, proferido no processo n.º 0413/05; na doutrina, sobre
esta jurisprudência, cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento
e Processo Tributário, Lisboa, Áreas Editora, 2011, 1, p. 146 e ss.
[46]
Alterou o Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o Estatuto dos
Tribunais Administrativos e Fiscais, o Código dos Contratos Públicos, o Regime
Jurídico da Urbanização e da Edificação, a Lei de Participação Procedimental e
de Ação Popular, o Regime Jurídico da Tutela Administrativa, a Lei de Acesso
aos Documentos Administrativos e a Lei de Acesso à Informação sobre Ambiente.
[47] Embora
este diploma legal seja, normalmente, apontado como uma mudança de paradigma, a
verdade é que a Lei n.º 77/2013, de 21 de novembro, que cria a Comissão para o
Acompanhamento dos Auxiliares da Justiça já tinha antes caminhado no mesmo
sentido, dispondo que «Das sanções disciplinares e das contraordenações
aplicadas pela CAAJ aos auxiliares da justiça cabe recurso para os tribunais
administrativos competentes, a instaurar no prazo de 20 dias contados da data
de notificação da decisão que as aplica» (art. 8.º, n.º 2). A Lei n.º 58/2019,
de 8 de agosto, que assegura a execução, na ordem jurídica nacional, do
Regulamento (UE)2016/679 do Parlamento e do Conselho, de 27 de abril de 2016,
relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de
dados pessoais e à livre circulação desses dados seguiu a mesma lógica,
remetendo a impugnação das decisões, proferidas pela Comissão Nacional de
Proteção de Dados em processo de contraordenação, para os tribunais
administrativos (art. 34.º, n.º s 1 e 2).
[48] Ac. do
Tribunal de Conflitos, de 11 de janeiro de 2018, proferido no processo n.º
60/2017.
[49] Ac. de
8 de fevereiro 2018, proferido no processo n.º 66/17. Embora inicialmente tenha
decidido em sentido contrário, em virtude destas decisões, o TCAS passou também
a decidir no mesmo sentido. É o caso dos acs. de 15-02-2018, proferido no
processo n.º 783/17.9BESNT; de 19 de abril de 2018, proferido no processo n.º
368/17.0BESNT, ou de 14 de junho de 2018, proferido no do processo n.º 1190/17.9BESNT.
[50] O
próprio legislador acabou por «intervir no conflito», uma vez que introduziu o atual
artigo 98.º, n.º 12, do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação,
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, que, depois das
alterações concretizadas pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, passou a ter
a seguinte redação: «Após o decurso dos prazos do recurso de impugnação
judicial e de pagamento voluntário da coima, segue-se o regime de execução de
obrigações pecuniárias, previsto no artigo 179.º do Código de Procedimento
Administrativo.»
[51] Era a
seguinte a redação daquele artigo:
«Artigo 57.º
Legitimidade do Ministério Público como
exequente
Compete ao Ministério Público promover a
execução por custas e multas judiciais impostas em qualquer processo».
[52] Assim,
em vez de afirmar que: «compete ao Ministério Público promover a execução das
penas e das medidas de segurança e, bem assim, a execução por custas,
indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba
representar judicialmente» este artigo passou a referir que: «compete ao
Ministério Público promover a execução das penas e das medidas de segurança e,
bem assim, a execução por indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a
pessoas que lhe incumba representar judicialmente».
[53] Assim,
em vez de afirmar que: «tendo o condenado bens suficientes e desembaraçados de
que o tribunal tenha conhecimento ou que ele indique no prazo de pagamento, o
Ministério Público promove logo a execução, que segue os termos da execução por
custas» esta norma passou a referir que «tendo o condenado bens penhoráveis
suficientes de que o tribunal tenha conhecimento ou que ele indique no prazo de
pagamento, o Ministério Público promove logo a execução, que segue as
disposições previstas no Código de Processo Civil para a execução por
indemnizações».
[54] Aprovado
pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro; alterada pela Lei n.º 33/2010, de 2 de
setembro; pela Lei n.º 40/2010, de 3 de setembro; pela Lei n.º 21/2013, de 21
de fevereiro; pela Lei n.º 94/2017, de 23 de agosto; e pela Lei n.º 27/2019, de
28 de março.
[55] Assim,
em vez de ser «execução por multas, custas e indemnizações» a epígrafe passou a
ser «Execução por multas penais e indemnizações» e o corpo do artigo em vez de
ser «a execução das decisões relativas a multas, custas e indemnizações
previstas na lei processual aplicável compete ao juízo ou tribunal que as tenha
proferido», passou a ser: «a execução das decisões relativas a multas penais e
indemnizações previstas na lei processual aplicável compete ao juízo ou
tribunal que as tenha proferido».
[56] Este
parecer pode ser consultado em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/
Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=43085.
Apesar de louvar a ideia fundamental da Proposta de Lei, este parecer não
deixou de criticar a atribuição à Administração Tributária da competência para
a execução de multas criminais, que poderia suscitar algumas reservas quanto à
sua verdadeira natureza jurídica e à efetiva salvaguarda dos direitos de
defesa.
[57] Este
parecer pode ser consultado em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/
Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=43085.
[58] Este
parecer pode ser consultado em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/
Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=43085.
[59] Cfr. o
art. 1.º da referida proposta.
[60] Diário
da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 16.
[61] Era a
seguinte a redação inicial do projeto:
«Artigo 1.º
1 - A presente lei procede à aplicação
do processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas, multas, coimas e
outras quantias cobradas em processo judicial, e outras sanções pecuniárias
fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a
contraordenações ou multas».
[62] Era a
seguinte a redação inicial do projeto:
«Artigo 2.º
Alteração ao Código de Procedimento e de
Processo Tributário
O artigo 148.º do Código de Procedimento
e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de
outubro, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 148.º
[…]
1 -[…]:
a) […];
b) [Revogada];
c) […].
2 -[…]:
a) […];
b) […];
c) Custas, multas, coimas e outras
quantias cobradas em processo judicial, e outras sanções pecuniárias fixadas em
decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou
multas».
[63] Era a
seguinte a redação inicial do projeto:
Artigo 3.º
Alteração ao Regulamento das Custas Processuais
Os artigos 26.º e 35.º do Regulamento
das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de
fevereiro, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:
(…)
Artigo 35.º
[…]
1 -Compete à Autoridade Tributária e Aduaneira,
nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover a
cobrança coerciva das custas, multas, coimas ou de outras quantias cobradas de
acordo com os artigos anteriores, e dos juros de mora devidos».
[64] Cuja
redação é a seguinte:
«1 - O processo de execução fiscal
abrange a cobrança coerciva das seguintes dívidas:
(…)
b) Coimas e outras sanções pecuniárias
fixadas em decisões, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações
tributárias, salvo quando aplicadas pelos tribunais comuns.
[65] Esta
proposta de alteração pode ser consultada em
https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=43085.
[66] Diário
da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 18.
[67] Diário
da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 19.
[68] Diário
da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p.
20/21.
[69] Diário
da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p.
21/22.
[70] Submetida
à votação na generalidade, esta proposta de Lei «foi aprovada, com votos a
favor do PS, do PAN e do Deputado não inscrito Paulo Trigo Pereira, votos
contra do PCP e de Os Verdes e abstenções do PSD, do BE e do CDS-PP (Diário da
Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 48).
[71] Conforme
consta do Diário da Assembleia da República (I Série -A – número 57, de 7 de
fevereiro de 2019, p. 123/4), a votação na especialidade teve o seguinte
resultado: «n.º 1 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro
(constante do artigo 5.º-A/renumerado como artigo 8.º) – aprovado, com votos a
favor do PS e do BE, votos contra do PCP e abstenções do PSD e do CDS-PP.
Demais artigos da proposta de lei (na redação das propostas de alteração
apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PS, com as alterações introduzidas
oralmente no que se refere ao artigo 35.º do Regulamento das Custas Processuais
(n.ºs 1, 2 e 3), conforme a redação proposta pelo Grupo Parlamentar do PSD –
aprovados, com votos a favor do PSD, do PS e do BE, votos contra do PCP e a
abstenção do CDS-PP). Proposta de alteração do Grupo Parlamentar do PS ao
artigo 5.º da PPL (renumerado como art. 7.º), referente ao artigo 469.º do
Código de Processo Penal – aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do BE,
votos contra do PCP e a abstenção do CDS-PP).
[72] Diário
da Assembleia da República I Série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p.
22/23.
[73] A doutrina
portuguesa tem debatido a verdadeira natureza do direito de mera ordenação
social, oscilando entre uma natureza administrativa (Tiago Lopes de
Azevedo, Lições de direito …, p. 34; Augusto Silva Dias, Direito
das…., p. 41) e a sua classificação, à semelhança da doutrina e da
jurisprudência alemãs, como direito penal em sentido amplo [José de Faria
Costa, Noções Fundamentais de Direito Penal (framenta iuris poenalis):
Introdução, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 29 e 46; Alexandra
Vilela, O Direito…, p. 157 e ss., 251 e 349 e ss.; Nuno
Brandão, Crimes…, p. 863 e ss.
[74] Como
referiu este Conselho, no Parecer n.º 17/2020 de 10 de setembro de 2020,
«constituindo o tipo de sanção um elemento identitário das contraordenações,
ela assume o papel de mera admonição, como especial advertência ou reprimenda,
relacionada com a observância de certas proibições ou imposições
legislativas (…), tendo em vista finalidades distintas das sanções
penais, conforme se evidencia da leitura do artigo 18.º, n.º 1, do RGCO - as
finalidades da coima são em larga medida estranhas a sentidos positivos de
prevenção (…) -, considerando-se que poderá assumir especial relevância
uma finalidade de prevenção geral e especial negativa (…). Na verdade, a
admonição que preside à aplicação da coima, desprovida de qualquer sentido
ético, tem, em muitos casos, um efeito intimidatório sobre toda a comunidade e
sobre o próprio agente, atuando como um desincentivo à prática de novas
infrações».
[75] O mesmo
sucede, como já se viu (supra 3.3.), apesar da letra da lei, com as
coimas aplicadas no âmbito do ilícito de mera ordenação social em matéria de
urbanismo e irá suceder, no futuro, como já iremos ver, nos termos do artigo
64.º do Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de janeiro, que aprova o Regime Jurídico
das Contraordenações Económicas.
[76] Para
além de não respeitar aquela progressiva passagem do ilícito de mera ordenação
social para a jurisdição administrativa, esta solução tem a consequência
perversa de gerar duas execuções: uma nos tribunais comuns para cobrança das
coimas; outra nas execuções fiscais para cobrança das custas. Em vez da
poupança de meios e da eficiência poderá, assim, representar uma estranha
duplicação de esforços, que deveria ser repensada pelo legislador.
[77] Na
velha definição deste Conselho (Parecer n.º 184/80, de 18 de dezembro, BMJ,
1981, 306, p. 141) as taxas são: «o preço autoritariamente estabelecido, pago
pela utilização individual de bens semipúblicos, tendo a sua contrapartida numa
atividade do Estado ou de outro ente público, especialmente dirigida ao
obrigado ao pagamento». Da mesma forma, nos termos do artigo 4.º, n.º 2, da Lei
Geral Tributária (aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, que,
entretanto, sofreu inúmeras alterações): «2 - As taxas assentam na prestação
concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou
na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares».
[78] Salvador
da Costa, Código…, 1997, p. 30. O artigo 1.º, n.º 2, do Decreto-Lei
n.º 44329, de 8 de maio de 1962, ainda reputava a atual taxa de justiça,
imposto de justiça. Esta denominação foi, todavia, alterada pelo Decreto-Lei
n.º 387-D/87, de 29 de dezembro, uma vez que, efetivamente, está em causa uma
taxa e não um imposto. Neste sentido, António L. de Sousa Franco, Finanças
Públicas e Direito Financeiro, Coimbra, Almedina, 2012, 2, p. 64; Salvador
da Costa, Código…, 1990, p. 15; J. Teixeira Ribeiro, Noção
jurídica de taxa Revista de Legislação e de Jurisprudência, 1985,117,
p. 291; António Braz Teixeira, Princípios de Direito Fiscal, Coimbra,
Almedina, 1985, I, p. 43 e ss.; Vítor António Duarte Faveiro, Noções
Fundamentais de Direito Fiscal Português, Coimbra, Coimbra Editora,
1984, I, p. 49 e ss.; Nuno Sá Gomes, Lições de Direito Fiscal,
Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1984, 133, p. 84 e ss.;
Carlos Pamplona Corte-Real, Curso de Direito Fiscal, Cadernos de
Ciência e Técnica Fiscal, 1981, 124, p. 162 e ss. ou Alberto Xavier, Manual
de Direito Fiscal, Lisboa (s.n.) 1974,I, p. 49. Neste Conselho, cfr. o
Parecer n.º 18/2010, de 1 de julho de 2010; na jurisprudência ac. do TC n.º
412/89, de 31 de maio.
[79] Noções
Fundamentais…, p. 49/50.
[80] Lições…,
p. 86; no mesmo sentido, J. Teixeira Ribeiro, «Noção…, p. 291; Carlos
Pamplona Corte-Real, Curso…, p. 163; António L. de Sousa
Franco, Finanças Públicas…, p. 64.
[81] É a
seguinte a redação do preceito: «1 - Aos serviços da administração tributária
cabe: (…) g) Cobrar as custas dos processos e dar-lhes o destino legal».
[82] Alberto
Xavier (Manual…, p. 49) defende que «os encargos não têm caráter
tributário, antes são simples reembolsos de despesas efetuadas pelos serviços».
[83] Recenseada supra,
1 e ss.
[84] Artigo
179.º do Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
4/2015, de 7 de janeiro e alterado pela Lei n.º 72/2020, de 16 de novembro.
[85] Art.
22.º, n.ºs 1, al.ª b), 3 e 3, do Decreto-Lei n.º 191/99, de 5 de junho, que
aprova o regime da tesouraria do Estado; na doutrina, sobre estas duas
possibilidades, cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento…,
3, p. 31 e ss.
[86] Supra, 3.1.
Na doutrina, sobre esta possibilidade, cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código
de Procedimento…, 3, p. 28 e ss. Como refere Carlos Paiva, embora
tenha nos tributos o seu objeto essencial, a execução fiscal tem um âmbito
relativamente abrangente (Processo de Execução Fiscal, Coimbra,
Almedina, 2016, p. 136).
[87] Supra 4.
[88] É a
seguinte a redação da referida norma:
«2 - A execução é promovida pelo
representante do Ministério Público junto do tribunal competente, aplicando-se,
com as necessárias adaptações, o disposto no Código de Processo Penal sobre a
execução da multa».
[89] Naquilo
que ora nos interessa é a seguinte a redação da referida norma:
«1 - Compete aos juízos do trabalho
conhecer, em matéria cível:
(…)
m) Das execuções fundadas nas suas
decisões ou noutros títulos executivos, ressalvada a competência atribuída a
outros tribunais».
[90] Atento
o expediente anexo os partidários da tese a manutenção das competências
executivas do Ministério Público apoiam-se, justamente, nestas normas.
[91] Supra, 4.1.
[92] Nos
termos do artigo 183.º, este diploma entrará em vigor 180 dias após a sua
publicação.
[93] O
legislador (agora com outra composição politica) não foi sensível à ideia de,
progressivamente, integrar no âmbito da jurisdição administrativa, à medida que
a sua reforma seja executada, a impugnação das decisões da Administração
Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social,
consagrada no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro.
[94] Neste
sentido, Tiago Lopes de Azevedo, Lições de direito …, p. 57;
Augusto Silva Dias, Direito das…., p. 194.
[95] Para a
interpretação deste artigo, por último, Tiago Caiado Milheiro, AA.VV. Comentário
Judiciário do Código de Processo Penal, Coimbra, Almedina, 2019, 1, p.
93 e ss.
[96] A já
referida divergência relativa à verdadeira natureza do direito de mera
ordenação social não impede a doutrina de reconhecer, una voce, a
sua autonomia.
[97] Tiago
Lopes de Azevedo, Lições de direito …, p. 57; na
jurisprudência cfr. o ac. do STJ n.º 1/2009, de 4 de dezembro de 2008, segundo
o qual «havendo norma expressa no diploma legal de que se ocupa, não é lícito
ao aplicador lançar mão de direito subsidiário de tal diploma. O direito
subsidiário destina -se, como é sabido, a regular os aspetos deixados sem
previsão legal no diploma em causa, dela carecendo, e não para se sobrepor às
disposições da lei a que é subsidiariamente aplicável».
[98] Neste
sentido, já João Conde Correia, AA.VV. Comentário Judiciário do Código
de Processo Penal, Coimbra, Almedina, 2019, 1, p. 1281.
[99] Para
este artigo, Paulo Dá Mesquita, AA.VV. Comentário Judiciário do Código
de Processo Penal, Coimbra, Almedina, 2021, 3, p. 913 e ss. (em curso
de publicação).
[100] Para
este artigo, António Gama, AA.VV. Comentário Judiciário do Código de
Processo Penal, Coimbra, Almedina, 2021, 3, p. 743 e ss. (em curso de
publicação).
[101] Para a
sua aplicabilidade no processo penal, Acs. do STJ: de 12 de março de 2009,
proferido no processo n.º 08P3168; de 13 de janeiro de 2011, proferido no
processo n.º 3/09.0YGLSB.S1; ou de 11 de fevereiro de 2016, proferido no
processo n.º 15/14.1UGLSB.S2.
[102] «Para
uma reforma global do processo penal português: da sua necessidade e de algumas
orientações fundamentais», AA.VV, Para uma nova justiça penal,
Coimbra, Almedina, 1996, p. 222.
[103] Para o
caráter inovador desta norma, cfr. Alberto dos Reis, Comentário ao
Código de Processo Civil, Coimbra, Coimbra Editora, 1945, 2, p. 32 e
ss.
[104] Manuel A. Domingues de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, Coimbra Editora, 1979, p.