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quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Competência para a instauração de execução tendente à cobrança coerciva de custas aplicadas por entidade administrativa. Fase administrativa do procedimento contraordenacional

 

A instauração de execução tendente à cobrança coerciva de custas aplicadas por entidade administrativa na fase administrativa do procedimento contraordenacional é um tema que deve ser analisado com algum cuidado após a entrada em vigor do Dl n.º 27/2019. Ministério Público ou Autoridade tributária?

Segue o Parecer da Procuradoria-Geral da República n.º 27/2020, de 15/04/2021.

Questões:

  «Em face da entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de março (que procedeu à alteração da Lei da Organização do Sistema Judiciário, ao Código de Procedimento e de Processo Tributário, ao Código de Processo Civil, ao Regulamento das Custas Processuais, ao Código de Processo Penal, ao Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade e ao diploma legal que prevê o regime de custas no Tribunal Constitucional), a quem compete a instauração de execução tendente à cobrança coerciva de custas aplicadas por entidade administrativa e não pagas voluntariamente, na fase administrativa do procedimento contraordenacional – ao Ministério Público ou à Autoridade Tributária?

               Caso se entenda que a legitimidade é da Autoridade Tributária, como deverão proceder os magistrados do Ministério Público relativamente ao expediente que para o efeito lhes for remetido pelas diversas autoridades administrativas – deverá tal expediente ser-lhes devolvido, para os fins tidos por convenientes, acompanhado de despacho onde constem as razões pelas quais se entende que o Ministério Público não é legalmente competente para o efeito? Ou deverá tal expediente, por mera economia de meios, ser reencaminhado diretamente à Autoridade Tributária, com conhecimento à autoridade administrativa que o remeteu, acompanhado do referido despacho?»

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Conclusões

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

               1.ª Na sua versão original, o Regime Geral das Contraordenações remetia a execução das custas para o disposto nos artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais, assim atribuindo ao Ministério Público competência para promover a sua execução junto dos tribunais judiciais (art. 202.º, n.º 2, daquele Código);

               2.ª Esta solução, apesar das inúmeras alterações legislativas que enfrentou, manteve-se quase inalterada até à entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de março, relativa à aplicação do processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial;

               3.ª Com efeito, considerando a natureza tributária das custas e seguindo o exemplo da jurisdição administrativa e fiscal, o legislador inverteu aquele paradigma, remetendo para a execução fiscal a cobrança coerciva das custas fixadas em processo judicial;

               4.ª Para esse efeito, a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, alterou o Código de Procedimento e de Processo Tributário que passou a dispor que «Poderão ser igualmente cobradas mediante processo de execução fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei: (…) Custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial [art. 148.º, n.º 2, alª c)];           

               5.ª Bem como o artigo 35.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais, que sob a epígrafe «execução», passou a dispor que: «Compete à administração tributária, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial»;

               6.ª Embora nem a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, nem as normas que ela alterou, o digam expressamente, deve entender-se que este regime é aplicável às custas fixadas na fase administrativa do processo de mera ordenação social, competindo à Administração Tributária proceder à sua cobrança coerciva;

               7.ª Desde logo, porque, continuando o artigo 92.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, a remeter para os preceitos reguladores das custas em processo criminal, será aqui aplicável o disposto no artigo 35.º do Regulamento das Custas;

                8.ª Depois, porque, atenta a sua natureza, tais custas estão incluídas no âmbito do artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, segundo o qual o processo de execução fiscal abrange, para além do mais, a cobrança coerciva de taxas, demais contribuições financeiras a favor do Estado, adicionais cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais;

               9.ª Em terceiro lugar, porque, em vez de atribuir ao juízo ou tribunal que as tenha proferido competência para executar as decisões relativas a multas, custas e indemnizações previstas na lei processual aplicável, o legislador passou a atribuir-lhe, apenas, competência para a execução das decisões relativas a multas penais e indemnizações previstas na lei processual aplicável (art. 131.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário);

               10.ª Em quarto lugar, porque o legislador restringiu os poderes do Ministério Público, maxime o poder de promover a execução por custas, conferindo-lhe, agora, apenas, competência para promover a execução das penas e das medidas de segurança e, bem assim, a execução por indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar judicialmente (art. 469.º do Código de Processo Penal);

               11.ª Finalmente, porque o legislador eliminou a referência à execução por custas, que constava do artigo 491.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, passando a mesma a ser da competência exclusiva da Administração Tributária;

               12.ª Com estas alterações, para além de ter atribuído à Administração Tributária competência para proceder à cobrança coerciva das custas, o legislador eliminou as normas que antes atribuíam ao Ministério Público competência para promover a sua execução e aos tribunais judiciais competência para a tramitar;

               13.ª Desta forma, o artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, passou a incluir a cobrança da taxa de justiça e dos encargos legais, que, por força de disposições legais especiais, antes lhe estava subtraída; e

               14.ª Se as entidades administrativas remeterem ao Ministério Público expediente destinado à cobrança de custas fixadas em processo de contraordenação, tal expediente deverá, por mera economia de meios, ser reencaminhado diretamente à Autoridade Tributária, com conhecimento ao remetente.

 

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Comentário:

 

Um documento completo que permite aprofundar conhecimentos sobre documento que permite aprofundar conhecimentos sobre a competência para a instauração de execução tendente à cobrança coerciva de custas aplicadas por entidade administrativa face as alterações provocadas pela entrada em vigor da L n.º 27/2019, de 28 de março. Recomendado.

 

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Parecer da Procuradoria-Geral da República n.º 27/2020, de 15/04/2021

 

 

Senhora Procuradora-Geral da República

Excelência:

Submeteu Vossa Excelência, nos termos dos artigos 44.º, alª d) e 45.º, n.º 2, do Estatuto do Ministério Público[1], pedido de Parecer a este Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, nos seguintes termos:

             

              «Em face da entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de março (que procedeu à alteração da Lei da Organização do Sistema Judiciário, ao Código de Procedimento e de Processo Tributário, ao Código de Processo Civil, ao Regulamento das Custas Processuais, ao Código de Processo Penal, ao Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade e ao diploma legal que prevê o regime de custas no Tribunal Constitucional), a quem compete a instauração de execução tendente à cobrança coerciva de custas aplicadas por entidade administrativa e não pagas voluntariamente, na fase administrativa do procedimento contraordenacional – ao Ministério Público ou à Autoridade Tributária?

               Caso se entenda que a legitimidade é da Autoridade Tributária, como deverão proceder os magistrados do Ministério Público relativamente ao expediente que para o efeito lhes for remetido pelas diversas autoridades administrativas – deverá tal expediente ser-lhes devolvido, para os fins tidos por convenientes, acompanhado de despacho onde constem as razões pelas quais se entende que o Ministério Público não é legalmente competente para o efeito? Ou deverá tal expediente, por mera economia de meios, ser reencaminhado diretamente à Autoridade Tributária, com conhecimento à autoridade administrativa que o remeteu, acompanhado do referido despacho?»

O referido pedido de parecer foi instruído com informação do gabinete de V.ª Ex.ª, que relata a diversidade de procedimentos e a necessidade de os uniformizar (de modo a que todo o Ministério Público proceda da mesma forma) e, em síntese, preconiza que o Ministério Público já não é competente para o efeito, devendo a ação executiva ser promovida pela Autoridade Tributária.

 

 Competência para a instauração de execução das custas aplicadas na fase administrativa do processo de contraordenação

Traçar a evolução do regime de execução das custas, aplicadas na fase administrativa dos processos de contraordenação, desde que surgiu, entre nós, o direito de mera ordenação social, até à atualidade, não é uma tarefa fácil, tantos são, apesar da quase constante continuidade normativa e, consequente, manutenção do paradigma, os diplomas envolvidos. Para além do desenvolvimento da instância executiva nos tribunais comuns, importará considerar também o seu desenvolvimento nos tribunais administrativos e fiscais, resultando a solução da conjugação das duas soluções.

1. O Código de Processo Penal, de 1929, na sequência de soluções anteriores, dispunha, desde a sua versão inicial, aprovada pelo Decreto n.º 16487, de 15 e fevereiro de 1929, que competia ao Ministério Público promover a execução das penas, imposto de justiça, indemnização de perdas e danos e mais quantias devidas ao Estado (art. 627.º[2]). Na mesma linha, o artigo 59.º do Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto n.º 29637, de 28 de maio de 1939, atribuía ao Ministério Público legitimidade para promover a execução de multas impostas em qualquer processo, bem como executar custas ou quaisquer importâncias devidas ao Estado.

Estas execuções eram instauradas por apenso ao processo no qual se tivesse feito a notificação da respetiva conta ou liquidação (art. 92.º do Código de Processo Civil), exceto se o processo estivesse no Tribunal da Relação ou no Supremo Tribunal de Justiça, caso em que correria termos no tribunal de primeira instância onde o processo tivesse sido instaurado, com base numa certidão emitida para o efeito (art. 93.º do mesmo diploma legal)[3]. Competentes para a execução eram, portanto, os tribunais comuns. Quem tinha competência para julgar o caso ou a causa também tinha competência para cobrar as custas dele emergentes.

Complementando este regime, que se manteve com o Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44129, de 28 de dezembro de 1961, o Código das Custas Judiciais[4] veio regular o pagamento coercivo das custas, tanto em matéria civil (arts. 152.º e ss.), como em matéria criminal (art. 202.º). Aí se dizia, nomeadamente, que a execução era instaurada por apenso ao processo em que tivesse tido lugar o aviso de pagamento, autuando-se o requerimento de nomeação de bens à penhora e observando-se os demais termos do processo sumaríssimo (art. 154.º, n.º 1).

2. O direito de mera ordenação social foi introduzido no ordenamento jurídico nacional, pelo Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de junho, que, apesar das hesitações[5] iniciais, optou por atribuir aos tribunais comuns a competência para conhecer do recurso de impugnação judicial e demais atos jurisdicionais[6]. Na fórmula do próprio preâmbulo do diploma:

               «Após algumas hesitações, optou-se por atribuir aos tribunais comuns a competência para conhecer do recurso de impugnação judicial.

               Reconhece-se de boamente que a pureza dos princípios levaria a privilegiar a competência dos tribunais administrativos. Ponderadas, contudo, as vantagens e desvantagens que qualquer das soluções irrecusavelmente comporta, considerou-se mais oportuna a solução referida, pelo menos como solução imediata e eventualmente provisória.

               E isso por ser a solução normal em direito comparado. E ainda por se revelar mais adequada a uma fase de viragem tão significativa como a que a introdução do direito de ordenação social representa. Além do mais, afiguram-se mais facilmente vencíveis as naturais resistências ou reservas da comunidade dos utentes do novo meio de impugnação judicial».

Não admira, por isso mesmo, que a execução da coima e das custas fosse promovida pelo representante do Ministério Público junto do tribunal da comarca em cuja área tivesse a sua sede a autoridade que tivesse aplicado a coima (salvo quando a decisão exequenda tivesse sido proferida pelo Tribunal da Relação, caso em que a execução poderia também ser promovida perante o tribunal da comarca do domicílio do executado) que esta obedecesse aos termos da execução por custas, aplicando-se, devidamente adaptado, o disposto no artigo 640.º do Código de Processo Penal[7], relativo à execução da pena de multa (art. 76.º, n.º 2[8]) e que, se o contrário não resultasse daquela lei, as custas seriam reguladas pelo disposto nos artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais, relativas à matéria criminal (art. 78.º, n.º 1[9]).

2.1. Pouco tempo depois, o Regime Geral das Contraordenações[10], sob a epígrafe «Princípios gerais», veio confirmar estas opções iniciais, prescrevendo, naquilo que nos interessa, que:

             

              «1 - Se o contrário não resultar desta lei, as custas em processo de contraordenação regular-se-ão pelo disposto nos artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais» (art. 92.º).

Assim, por força desta remissão, atento o artigo 202.º, n.º 2, daquele Código[11], o Ministério Público era competente para instaurar a execução para pagamento daquelas custas, que seguia os termos das execuções por custas reguladas na parte cível daquele diploma, com observância do disposto no artigo 1696.º do Código Civil. Terminado o processo de contraordenação, caso as custas não fossem pagas voluntariamente, o Ministério Público tinha o encargo de proceder à sua cobrança coerciva e os tribunais comuns eram competentes para conhecer das questões daí emergentes.

2.2. O novo Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro, apesar de integrar as exigências da Constituição da República Portuguesa de 1976 e do Código Penal de 1982[12], manteve as soluções já consagradas nos artigos 627.º e 640.º do Código de Processo Penal de 1929. Assim, confirmando as competências executivas do Ministério Público e dos tribunais comuns, passou a prescrever que:

               

               «1 - Compete ao Ministério Público promover a execução das penas e das medidas de segurança e, bem assim, a execução por imposto de justiça, custas, indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar judicialmente» (art. 469.º, n.º 1)[13].

Prosseguindo na mesma linha de raciocínio, em 1995[14], o Decreto-lei n.º 244/95, de 14 de setembro, procurando, justamente, «proceder ao aperfeiçoamento da coerência interna do regime geral de mera ordenação social, bem como da coordenação deste com o disposto na legislação penal e processual penal»[15] vigente, alterou aquele artigo 92.º do Regime Geral das Contraordenações, que passou a prescrever que:

               «1 - Se o contrário não resultar desta lei, as custas em processo de contraordenação regular-se-ão pelos preceitos reguladores das custas em processo criminal».

Dessa forma, o legislador articulou o Regime Geral das Contraordenações com o novo Código de Processo Penal que, para além de ser direito subsidiário (art. 41.º do Regime Geral das Contraordenações), como acabámos de ver, na sequência da nossa tradição jurídica, assumira a regulamentação da competência para promover a execução do imposto de justiça, das custas e demais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar judicialmente (arts. 469.º, n.º 1 e 488.º, n.º 2). De todo o modo, no essencial, as soluções são as mesmas, cabendo ao Ministério Público promover perante os tribunais comuns, a execução das custas ou de multas emergentes dos processos de contraordenação.

2. 3. Um ano depois, atentas as reformas operadas no processo civil através do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de dezembro e do Decreto-Lei n.º 180/96, de 25 de setembro, e procurando reforçar a coerência entre o regime das custas judiciais e o Código de Processo Penal[16], o legislador revogou o anterior Código das Custas Judiciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44329, de 8 de maio de 1962. Em seu lugar, surgiu um novo Código das Custas Judiciais (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de novembro), que, sendo «em grande parte, um diploma complementar da legislação processual» continuou a prever que:

               

               «O Ministério Público instaurará execução se ao devedor de custas ou multas forem conhecidos bens penhoráveis» (art. 116.º, n.º 1) e que:

               «as execuções por custas, multas e outros valores contados são instauradas por apenso ao processo em que teve lugar a notificação para pagamento, autuando-se o requerimento inicial e observando-se os demais termos do processo sumário» (art. 117.º, n.º 1)[17].

               2.4. Alguns anos mais tarde, em 2008, no intuito de uniformizar e de simplificar o sistema de custas processuais e conforma anunciado na nota preambular, o legislador:

            

               «procurou concentrar todas as regras quantitativas e de procedimento sobre custas devidas em qualquer processo, independentemente da natureza judicial, administrativa ou fiscal num só diploma - o novo Regulamento das Custas Processuais - mantendo algumas regras fundamentais, de carácter substantivo, nas leis de processo.

               Assim, as normas centrais relativas à responsabilidade pelo pagamento de custas podem encontrar-se no Código de Processo Civil e no Código de Processo Penal, os quais serão aplicáveis, a título subsidiário, aos processos administrativos e fiscais e aos processos contraordenacionais, respetivamente. Em contrapartida, para todos estes processos, os operadores judiciais poderão encontrar regras simples e uniformes no Regulamento das Custas Processuais, no que respeita à quantificação da taxa de justiça, ao modo de pagamento das custas ou processamento da correspetiva conta»[18].

Para o efeito, o Regulamento das Custas Processuais[19] revogou o Código das Custas Judiciais vigente [art. 25.º, n.º 2, al.ª a)] e instituiu um novo regime, aplicável aos processos que correm termos nos tribunais judiciais, nos tribunais administrativos e fiscais e no balcão nacional de injunções.

No que respeita à execução das custas, a filosofia base era, no entanto, a mesma: 

            

               «1 - Não tendo sido possível obter-se o pagamento das custas, multas e outras quantias cobradas de acordo com os artigos anteriores, é entregue certidão da liquidação da conta de custas ao Ministério Público, para efeitos executivos, quando se conclua pela existência de bens penhoráveis» (artigo 35.º, n.º 1).

 Complementando todas estas normas, localizadas no Código de Processo Penal, no Código de Processo Civil e no Regulamento das Custas Processuais, o artigo 131.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário[20], sob a epígrafe, «Execução por multas, custas e indemnizações» dispunha que:

                    

               «Os tribunais de competência territorial alargada, as secções da instância central e as secções de competência genérica da instância local são ainda competentes para executar as decisões por si proferidas relativas a custas, multas ou indemnizações previstas na lei processual aplicável».  

2.5. Durante quase 40 anos, apesar das dúvidas iniciais, com maior ou menor clareza legal, o Ministério Público foi, assim, competente para promover a execução das custas emergentes da fase administrativa dos processos de contraordenação e os tribunais comuns competentes para dela conhecer. Não admira, portanto, que, para além do Regime Geral das Contraordenações, outros diplomas especiais sigam, ainda hoje, a mesma opção inicial.

É o caso da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto (que aprovou a lei quadro das contraordenações ambientais), segundo a qual:

              

               «1 - Decorrido o prazo de pagamento das custas sem a sua realização, a autoridade administrativa envia, nos 20 dias úteis seguintes, o processo ao Ministério Público para a instauração da competente ação executiva» (art. 60.º, n.º 1).

É, igualmente, o caso do disposto na Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro[21], que aprova o regime processual aplicável às contraordenações laborais e de segurança social, que se limita a dizer que «sempre que o contrário não resulte da presente lei, são aplicáveis, com as devidas adaptações, as disposições do regulamento das custas processuais» (art. 59.º), dessa forma remetendo, então, a matéria para a esfera de competências do Ministério Público.

Já não era, todavia, assim, em matéria de contraordenações fiscais e aduaneiras, por força do Regime Jurídico das Infrações Fiscais e Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 376-A/89, de 25 de outubro, que (como se destacou logo no respetivo preâmbulo) atribuiu aos tribunais fiscais e aduaneiros competência para conhecer dos recursos interpostos (art. 60.º, n.º 7[22]) e aos tribunais tributários de primeira instância competência para proceder à execução da coima e das custas (art. 69.º, n.º 3[23]). Solução especial que foi salvaguardada pelo Código de Procedimento e de Processo Tributário[24], segundo o qual, o processo de execução fiscal abrange a cobrança coerciva das coimas e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações tributárias, salvo quando aplicadas pelos tribunais comuns [art. 148.º, n.º 1, alª b)]. E que, mais tarde, transitou para o Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho (artigos 80.º, n.º 1[25], e 65.º, n.º 1[26], respetivamente)[27].

      

3. Esta solução parece ser a consequência da implementação de uma verdadeira jurisdição administrativa. De facto, no rescaldo da revolução, a Lei Constitucional n.º 3/74, de 14 de maio, veio esclarecer que «as funções jurisdicionais serão exercidas exclusivamente por tribunais integrados no poder jurisdicional» (art. 18.º) e, depois, o Decreto-Lei n.º 250/74, de 12 de junho, incluiu os Tribunais Administrativos na dependência funcional do Ministério da Justiça, juntamente com os demais tribunais. Deixaram de «ser órgãos administrativos independentes, na dependência do Ministério do Interior, para passar a ser verdadeiros tribunais»[28]. Mesmo assim, a Constituição da República Portuguesa, de 2 de abril de 1976, refletindo as dúvidas então existentes, limitou-se a dizer que «poderá haver tribunais administrativos e fiscais» (art. 212.º, n.º 3), deixando ao legislador liberdade para a sua criação[29].

Utilizando esta margem de conformação, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de abril[30], lançando os fundamentos da evolução futura, veio esclarecer que:

               «Incumbe aos tribunais administrativos e fiscais, na administração da justiça, assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, reprimir a violação da legalidade e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativas e fiscais» (art. 3.º).

Dessa forma, como se dizia logo no respetivo preâmbulo, o legislador fixou «em termos precisos a natureza e os limites da jurisdição administrativa e tributária». Naquilo que ora nos interessa, na sequência dessa mesma fixação, o Estatuto atribuiu aos Tribunais Tributários de primeira instância competência para a «cobrança coerciva de dívidas a pessoas de direito público, nos casos previstos na lei, bem como de custas e multas aplicadas pelos tribunais administrativos e fiscais» [art. 62.º, n.º 1, alª c)][31].

A Lei de Processo dos Tribunais Administrativos[32], complementando estas disposições, sob a epígrafe, «Execuções por custas e multas», prescreveu, depois, que:      

               «As execuções por custas e multas impostas em tribunal administrativo são instauradas nos tribunais tributários com base em certidão executiva, quando aquele tribunal não puder obter o pagamento por meio do levantamento de depósito que o devedor tenha à sua ordem ou por desconto nos respetivos vencimentos, ordenados ou salários, nos termos do Código das Custas Judiciais» (art. 75.º).

As execuções fiscais eram, então, reguladas pelo Código de Processo das Contribuições e Impostos[33], segundo o qual tais execuções corriam termos pelos Tribunais de 1.ª instância das Contribuições e Impostos de Lisboa e Porto, relativamente aos devedores domiciliados nos respetivos concelhos (art. 152.º, § 1.º daquele Código) e, fora daqueles, nas Repartições de Finanças dos concelhos ou bairros fiscais, desempenhando os respetivos chefes as funções de juízes auxiliares, nos termos do § único do art. 40.º deste Código, sem prejuízo da intervenção dos tribunais respetivos nos casos previstos na sua alínea d).

3.1. Refletindo todo este desenvolvimento seminal, provocado pelo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais[34], a Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de julho, sob a epígrafe «Tribunais Administrativos e Fiscais», veio esclarecer que: 

               «1. O Supremo Tribunal Administrativo é o órgão superior da hierarquia dos tribunais administrativos e fiscais, sem prejuízo da competência própria do Tribunal Constitucional.

               2. O Presidente do Supremo Tribunal Administrativo é eleito de entre e pelos respetivos juízes.

               3. Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais» (art. 214.º, atual art. 212.º[35]).

O número três desta norma constitucional suscitou, de imediato, para além do mais, a momentosa questão colocada por José Carlos Vieira de Andrade:

               «saber se aí se consagra uma reserva material absoluta de jurisdição atribuída aos tribunais administrativos, no duplo sentido de que, por um lado, os tribunais administrativos só poderão julgar questões de direito administrativo, e de que, por outro lado, só eles poderão julgar tais questões»[36].

No que à primeira vertente da questão diz respeito (saber se os Tribunais Administrativos e Fiscais só podem julgar litígios emergentes de uma relação jurídico-administrativa), a doutrina caminhou no sentido de admitir que lhes seja atribuída competência para o julgamento de outras questões, como, por exemplo, para julgar ações sobre contratos privados da administração ou para julgar ações de responsabilidade civil extracontratual por atos de gestão privada da administração[37].

Ainda quanto à repartição das competências, em matéria de execução, fulcral para o presente parecer, o Tribunal Constitucional, independentemente de saber se aquele artigo da Lei Fundamental «atribui aos tribunais administrativos uma reserva material absoluta de jurisdição» ou «se, aí, apenas se consagram os tribunais administrativos como os tribunais comuns em matérias administrativas»[38], considerou acerca de tal preceito que:  

              

               «[está] direcionado ao julgamento das ações e recursos que versem sobre relações jurídicas administrativas e fiscais litigiosas, não podendo a lei ordinária extravasar para outra coisa que não sejam tais relações, mas sem que isso signifique que, de todo em todo, se tenha impedido relegar para a mesma lei qualquer parcela definidora ou integradora da competência dos tribunais administrativos e fiscais, no que toca a processos executivos.

               E, com efeito, na sua formulação típica, a ação executiva não envolve qualquer julgamento - uma atividade de cariz declaratório a culminar na apreciação de mérito de determinada relação jurídica - limitando-se, em princípio, à adoção das providências materiais adequadas à satisfação de direitos já previamente reconhecidos no título executivo»[39].  

Por isso mesmo, continuando a seguir aquela jurisprudência, o artigo 214.º, n.º 3, da Constituição não impediria a utilização das execuções fiscais noutras situações, como, por exemplo, a execução de créditos da Caixa Geral de Depósitos.

No que respeita à segunda vertente da questão (saber se só os Tribunais Administrativos e Fiscais podem julgar litígios emergentes de uma relação jurídico-administrativa), a resposta da doutrina maioritária, porventura devido à inexistência de uma rede de tribunais suficientemente alargada e dotada dos recursos humanos imprescindíveis para dar resposta adequada, também foi no sentido de que não se trata de uma reserva absoluta e de que o legislador dispõe de uma certa margem de conformação, podendo, sem prejuízo de um núcleo irredutível de matérias, atribuir à jurisdição comum competência para a execução de coimas e multas processuais aplicadas em processos de contraordenação[40].

A jurisprudência navegou nas mesmas águas, tendo o Tribunal Constitucional, justamente, decidido:

               «não julgar inconstitucional a norma do artigo 55.º, n.º 3, do Regime Geral das Contraordenações (Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, alterado, por último, pela Lei n.º 109/2001, de 24 de dezembro), na medida em que atribui aos tribunais judiciais competência para julgar as impugnações judiciais de decisões das autoridades administrativas, tomadas no âmbito de processo de contraordenação ambiental»[41].

3.2. Neste contexto constitucional, os recursos das decisões que apliquem coimas, bem como a sua execução e a execução das custas e de outras multas processuais, aplicadas em processo de contraordenação, continuou confiada aos tribunais comuns, sendo as competências executivas dos tribunais administrativos e fiscais reservadas para execução das suas próprias decisões.

Com o Código de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 154/91, de 23 de abril, os processos de execução fiscal passaram a ser instaurados e tramitados pelas Repartições de Finanças, com intervenção dos Tribunais, apenas para a prática dos atos de natureza jurisdicional [arts. 43.º, alínea h), e 237.º, n.ºs 1 e 2[42]]. Na verdade, entre as competências da administração tributária incluía-se, então, a de «cobrar as custas dos processos e dar-lhes o destino legal» [art. 43.º, alínea h)]. De modo que:

               «Em face da atribuição de competência aos Tribunais Tributários para cobrança das custas e multas aplicadas pelos Tribunais Administrativos e Fiscais e da repartição de competências entre os tribunais tributários e as Repartições de Finanças para a prática de atos no processo de execução fiscal, aquela referência a “processos” sempre foi interpretada como atribuindo à administração tributária competência para a cobrança de todas as custas e multas aplicadas pelos Tribunais Administrativos e Fiscais, sem prejuízo da intervenção dos tribunais tributários, relativamente aos atos de natureza judicial»[43].

O Código de Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro, manteve a mesma lógica, continuando a atribuir à Administração Tributária competência para «cobrar as custas dos processos e dar-lhes o destino legal» [art. 10.º, n.º 1, alínea g)], ou seja, para cobrar as custas e multas aplicadas pelos Tribunais Administrativos e Fiscais, maxime as multas englobadas na conta, nos termos do artigo 56.º, n.º 3, alínea b), do Código das Custas Judiciais.

O Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, não contém nenhuma norma semelhante à do anterior Estatuto [art. 62.º, n.º 1, alª c), da versão original] e o Código de Processo nos Tribunais Administrativos limita-se a afirmar que:

               «2 - O regime das custas na jurisdição administrativa e fiscal é objeto de regulação própria no Código das Custas Judiciais» (art. 189.º).

              Com efeito, como já se referiu, o Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro, tinha introduzido, no Código das Custas Judiciais, os artigos 73.º-A a 73.º-F, determinando, designadamente, que o processo judicial administrativo estava sujeito a custas, nos termos desse Código e da lei de processo administrativo; que o processo judicial tributário, bem como os atos judiciais praticados no âmbito do procedimento tributário, estavam sujeitos a custas, nos termos desse Código; que em tudo o que não estivesse especialmente regulado nesse título, o regime das custas administrativas e tributárias obedeceria às regras estabelecidas para as custas cíveis, com as devidas adaptações (art. 73.º-A, n.º 1, 2 e 3)[44].

              

Mesmo assim, embora o elemento gramatical fosse menos claro, o Supremo Tribunal Administrativo, decidiu que:       

               «a) Mantêm-se em vigor, mesmo depois da vigência do ETAF de 2002 e do CPTA, os artigos 10.º, 1, g), 148.º e 151.º do CPPT.

                b) Pelo que, mesmo após a entrada em vigor do ETAF de 2002 e do CPTA o meio processual adequado para a cobrança coerciva das custas e multas relativos a processos judiciais da área administrativa é o processo de execução fiscal, previsto nos artigos 148.º e seguintes do CPPT»[45].

3.3. O Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, emitido no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 100/2015, de 19 de agosto[46], foi mais um marco essencial desta progressiva evolução. No entanto, ao contrário das soluções anteriores, que, apesar do artigo 212.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, respeitando a tradição jurídica, mantinham a impugnação e a execução das contraordenações na órbita da jurisdição comum, este diploma abriu outra linha de evolução, que parece inverter a lógica tradicional e atribuir, finalmente, competência para o efeito aos Tribunais Administrativos e Fiscais[47]. O mesmo sucede em matéria executiva. Apesar do silêncio do legislador, uma coisa implica a outra. Quem tem competência para julgar a ação também deve ter competência para a sua execução. Como se refere no preâmbulo daquele diploma legal:

              «No que respeita ao ETAF, clarificam-se, desde logo, os termos da relação que se estabelece entre o artigo 1.º e o artigo 4.º, no que respeita à determinação do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, e, por outro lado, dá-se mais um passo no sentido, encetado pelo atual ETAF, de fazer corresponder o âmbito da jurisdição aos litígios de natureza administrativa e fiscal que por ela devem ser abrangidos. Neste sentido, estende-se o âmbito da jurisdição administrativa e fiscal às ações de (…) impugnação de decisões que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo. Entendeu-se, nesta fase, não incluir no âmbito desta jurisdição administrativa um conjunto de matérias que envolvem a apreciação de questões várias, tais como as inerentes aos processos que têm por objeto a impugnação das decisões da Administração Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social noutros domínios. Pretende-se que estas matérias sejam progressivamente integradas no âmbito da referida jurisdição, à medida que a reforma dos tribunais administrativos for sendo executada».

Para o efeito, o artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, passou a dispor que:     

               «1 - Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objeto questões relativas a:

               (…)

                l) Impugnações judiciais de decisões da Administração Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo;

               (...)

               n) Execução da satisfação de obrigações ou respeito por limitações decorrentes de atos administrativos que não possam ser impostos coercivamente pela Administração».

E o artigo 157.º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de fevereiro, passou a dispor que:          

               «As execuções contra particulares das sentenças proferidas pelos tribunais administrativos, assim como dos demais títulos executivos produzidos no âmbito de relações jurídico-administrativas que careçam de execução jurisdicional, correm termos nos tribunais administrativos, mas, na ausência de legislação especial, regem-se pelo disposto na lei processual civil» (n.º 7).

A transmissão da competência para conhecer das impugnações judiciais de decisões da Administração Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social, por violação de normas de direito administrativo, em matéria de urbanismo dos tribunais comuns para os tribunais administrativos e fiscais, implicou a transmissão da competência para a execução da respetiva coima (e custas) seja ela ou não, jurisdicionalmente, confirmada.

Como refere o Tribunal de Conflitos:

              «De acordo com o disposto no (…) ETAF (…) compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objeto questões relativas a impugnações judiciais de decisões da Administração Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo.

               Perante este dispositivo legal, é indubitável que compete à jurisdição administrativa e fiscal conhecer da impugnação judicial em matéria de contraordenação por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo, a qual se fica a dever à intenção legislativa expressa de fazer corresponder o âmbito da jurisdição administrativa aos litígios de natureza administrativa.

               No caso, porém, não está em causa a impugnação judicial de tal matéria, mas a execução de coima e custas processuais resultantes da prática de contraordenação por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo. No entanto, nem por isso esta problemática específica deixa de relevar, no âmbito da regra de que o tribunal competente para a ação também o será para a execução.

               Movendo-nos, deste modo, no âmbito do direito de mera ordenação social, importa averiguar se da aplicação do seu regime específico emerge uma solução para o problema em análise.

               Nos termos do art. 89.º, n.º 1, do DL n.º 433/82, de 27 de outubro, o não pagamento da coima dará lugar à execução, que será promovida, perante o tribunal competente, segundo o art. 61.º.

               Nos termos do disposto no art. 61.º, n.º 1, é competente para conhecer do recurso o tribunal em cuja área territorial se tiver consumado a infração.

               Sendo o Tribunal Administrativo e Fiscal o competente, em razão da matéria, para conhecer da impugnação judicial da decisão que aplica a coima no âmbito do ilícito de mera ordenação social, por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo, também o Tribunal Administrativo e Fiscal será o competente para a execução da coima, por aplicação da regra do art. 89.°, n.º 1, do DL n.º 433/82.

               Por efeito deste regime específico define-se a competência material para a execução de coima no âmbito do ilícito de mera ordenação social, por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo.

               No caso vertente, não podendo interpretar-se o art. 61.º, n.º 1, do DL n.º 433/82, sem a norma legal definidora da competência material para o recurso da decisão que aplica a coima no âmbito do ilícito de mera ordenação social, por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo, é inadequado limitar o seu âmbito a uma mera regra de competência territorial, sob pena de se perder o sentido útil da remissão consignada no art. 89.º, n.º 1, do DL n.º 433/82.

               A lei, com efeito, quis afirmar que o tribunal competente para a execução de coima era o tribunal competente para conhecer do recurso da impugnação da decisão que aplica a coima no âmbito do ilícito de mera ordenação social, nomeadamente por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo.

               No âmbito especificado, sendo o Tribunal Administrativo e Fiscal o competente para conhecer o recurso da impugnação judicial da decisão de aplicação da coima, é igualmente competente para a execução de coima, sendo certo que a lei não distingue entre ter havido, ou não, impugnação.

               Com a competência material atribuída à jurisdição administrativa e fiscal, está excluída a dos tribunais judiciais (art, 40.º, n.º 1, da LOSJ)»[48].

Noutra decisão, o mesmo Tribunal afirmou que:       

               «O que está aqui em causa é a competência para conhecer da execução da coima aplicada por violação de regras de urbanismo.

               (…) a competência para conhecer do hipotético recurso de impugnação da decisão administrativa em causa (…) pertenceria aos Tribunais Administrativos e Fiscais.

               Por isso, a competência para a execução da coima resultante do hipotético indeferimento da referida impugnação pertenceria aos mesmos Tribunais Administrativos, ao abrigo do disposto no art. 157.º, n.º 5 do Código de Processo dos Tribunais Administrativos.

               Daqui resulta que a competência para a execução da mesma coima aplicada sem impugnação, naturalmente tem de pertencer aos mesmos tribunais administrativos.

               Este entendimento resulta também da aplicação do referido n.º 5 do art. 157.º, por estar aqui em causa um título executivo que foi produzido no âmbito de uma relação jurídico-administrativa, por decorrer de uma violação de normas administrativas no âmbito do urbanismo - violação esta cuja coima-sanção seria impugnável nos Tribunais Administrativos e Fiscais, como já vimos.

               Deste modo, no caso em apreço, a competência em razão da matéria para conhecer da presente execução pertence ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra»[49].

Não admira, por isso mesmo, que o Acórdão, n.º 4/2020, do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, de 7 de maio de 2020, tenha fixado a seguinte jurisprudência:

               

               «A partir de 1 de setembro de 2016 e para as ações executivas que vierem a ser instauradas em juízo desde aquela data, «ex vi» dos arts. 4.º, n.º 1, als. l) e n), do ETAF, 157.º, n.º 5, do CPTA, 61.º e 89.º do DL n.º 433/82, de 27/10, 15.º, n.º 5, do DL n.º 214-G/2015, de 2/10, cabe à jurisdição administrativa a competência para a execução jurisdicional das decisões administrativas que, por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo, hajam aplicado coimas e tenham estas sido alvo ou não de impugnação»[50].

As restantes contraordenações, que não consubstanciassem a violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo, continuaram a ser executadas pelos tribunais comuns, coexistindo, assim, duas soluções legais diferentes. Retomando o preâmbulo daquele diploma legal, ainda não era o tempo para integrar na jurisdição administrativa a impugnação e a execução de todas as «decisões da Administração Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social». Só a conclusão da reforma dos tribunais administrativos permitiria tal desiderato.

4. A última peça deste complicado puzzle legal, apesar de caminhar no mesmo sentido, não invocou qualquer desígnio de «fazer corresponder o âmbito da jurisdição aos litígios de natureza administrativa e fiscal que por ela devem ser abrangidos», parece, assim, ter abandonado este objetivo. De facto, a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, que determinou a aplicação do processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial (art. 1.º, n.º 1), tem na sua base, não esse propósito científico, mas, antes, simples razões de mera eficiência sistémica.

Para esse efeito, este diploma alterou o Código de Procedimento e de Processo Tributário que passou a dispor que:              

               «2 - Poderão ser igualmente cobradas mediante processo de execução fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei:

                (…).

                c) Custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial.

Da mesma forma, o referido diploma também alterou o artigo 35.º, do Regulamento das Custas Processuais, que, sob a epígrafe «execução», passou a dispor que:

              «1 - Compete à administração tributária, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial.

               2 - Cabe à secretaria do tribunal promover a entrega à administração tributária da certidão de liquidação, por via eletrónica, nos termos a definir por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, juntamente com a decisão transitada em julgado que constitui título executivo quanto às quantias aí discriminadas.

               3 - Compete ao Ministério Público promover a execução por custas face a devedores sediados no estrangeiro, nos termos das disposições de direito europeu aplicáveis, mediante a obtenção de título executivo europeu.

               4 - A execução por custas de parte processa-se nos termos previstos nos números anteriores quando a parte vencedora seja a Administração Pública, ou quando lhe tiver sido concedido apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.

               5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a execução por custas de parte rege-se pelas disposições previstas no artigo 626.º do Código de Processo Civil».

Finalmente, o legislador alterou, ainda, o artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (Regula o regime de custas no Tribunal Constitucional), que, sob a epígrafe «Instauração da execução», passou a dispor que:

              

               «1 - Decorrido o prazo de pagamento das custas ou multas sem a sua realização ou sem que ele tenha sido possível nos termos do artigo anterior, é entregue certidão de liquidação, por via eletrónica, à administração tributária, para fins executivos, nos termos a definir por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça.

               2 - A execução é instaurada com base na certidão a que se refere o número anterior.

               3 - O serviço da administração tributária onde correu a execução deve remeter imediatamente ao Tribunal Constitucional, por transferência eletrónica à ordem deste, o valor correspondente às custas ou multas cobradas.

               4 - Para controlo dos pagamentos, no Tribunal Constitucional fica duplicado da certidão referida no n.º 1».

Assim, para além de admitir que as custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial possam ser – nos casos previstos na lei – cobradas mediante processo de execução fiscal, o legislador logo criou dois casos em que tal sucede: artigo 35.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais e o artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro. Com esta técnica remissiva, em vez de fixar no Código de Procedimento e de Processo Tributário todos os casos em que as custas, as multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial podem ser cobradas mediante processo de execução fiscal, o legislador veio permitir que qualquer outra lei possa atribuir essa competência, sem necessidade de alterar, de novo, este diploma legal.

Paralelamente, o legislador introduziu outras modificações destinadas a clarificar essa transmissão de competências: o artigo 57.º do Código de Processo Civil, que conferia ao Ministério Público legitimidade para promover a execução por custas e multas judiciais impostas em qualquer processo foi revogado [art. 10.º, alª a)][51]; o artigo 469.º do Código de Processo Penal que, para além do mais, conferia ao Ministério Público competência para promover a execução por custas foi expurgado dessa referência (art. 7.º, primeira parte)[52]; o artigo 491.º, do mesmo diploma legal, segundo o qual a execução da pena de multa ou de algumas das suas prestações seguia os termos da execução por custas, foi modificado passando a execução a seguir as disposições previstas no Código de Processo Civil para a execução por indemnizações (art. 7.º, segunda parte)[53]; o artigo 141.º, alª n), do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade[54], que, sem prejuízo de outras disposições legais, atribuía ao representante do Ministério Público, junto do tribunal de execução das penas competência para instaurar a execução por custas, foi revogado [art. 10.º, alª c)]; e o artigo 131.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, que atribuía ao juízo ou tribunal que as tivesse proferido competência para executar as decisões relativas a multas, custas e indemnizações previstas na lei processual aplicável, foi expurgado de qualquer referência a custas ou a multas não penais[55].

Deste modo, o legislador dotou a administração tributária de competência para promover em execução fiscal a cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial e, ao mesmo tempo, retirou ao Ministério Público competência para o efeito. Ressalvados os casos em que o devedor está sediado no estrangeiro (art. 35.º, n.º 3, do Regulamento das Custas), o Ministério Público já não tem competência para o efeito.

4.1. Na origem desta lei esteve a Proposta de Lei n.º 149/XIII, cuja exposição de motivos refere:

               «As custas processuais, com especial relevância para a taxa de justiça, representam o valor imputado às partes ou sujeitos processuais decorrente da mobilização dos meios judiciários necessários e aptos à prestação do serviço público de administração de justiça.

               Constituem-se assim como uma exigência tributária, de génese sinalagmática, normalmente decorrente de solicitação do cidadão aos Tribunais, a fim de assegurar a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados.

                Nestes termos, é pacífica e corrente a utilização do processo de execução fiscal para a cobrança de custas judiciais no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal; ora, a natureza tributária destas dívidas, e o balanço francamente positivo da utilização do processo de execução fiscal para a cobrança de custas judiciais no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal preconizam, assim, o repensar do processo de execução por custas na jurisdição dos tribunais judiciais, numa lógica de coerência e unidade do sistema jurídico.

               Ademais, nas execuções por custas, os atos próprios e da competência do agente de execução ficam a cargo dos oficiais de justiça, reclamando por isso a sua ação nesse âmbito, em considerável detrimento de tempo e disponibilidade para a prática de atos de sua competência nas execuções comuns, agravando o tempo de resolução destes processos, em detrimento da confiança na atempada administração da justiça por parte dos cidadãos e dos operadores económicos.

               Ora, a transferência para a Administração Tributária e Aduaneira das cobranças de créditos de custas judiciais dos tribunais comuns, à semelhança do que já se verifica nos tribunais administrativos e fiscais, não causando impacto relevante nos serviços da administração tributária, permitirá direcionar a atividade dos oficiais de justiça para a tramitação dos processos executivos, reforçando de forma substancial os meios humanos nos juízos de execução, desta forma contribuindo para a diminuição da pendência.

               Consequentemente, apenas a invocação de uma fundamentação tradicionalista e anacrónica pode justificar que o regime de cobrança coerciva de custas, multas, coimas e outras sanções pecuniárias contadas ou liquidadas a favor do Estado não siga os mesmos termos em que são atualmente tratadas pelo sistema jurídico as demais dívidas fiscais ou parafiscais.

               A aplicação do processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas, multas, coimas e outras quantias cobradas em processo judicial, e de outras sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou multas, constitui uma medida com enorme impacto sistémico, assegurando maior uniformidade de critérios e procedimentos, permitindo aumentar a eficiência da cobrança das quantias devidas ao Estado, libertando meios humanos, e simultaneamente mantendo intacta a garantia da tutela jurisdicional efetiva dos devedores».

Na base desta solução, parecem estar, portanto, sobretudo, razões de eficácia e de economia de meios, nomeadamente o sucesso da utilização do processo de execução fiscal para a cobrança de custas judiciais no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal. Como já referimos, não foi aqui invocado nenhum propósito de fazer corresponder o âmbito da jurisdição administrativa aos litígios de natureza administrativa.

4. 2. Esta proposta foi, a pedido da Assembleia da República, objeto de parecer elaborado por um assessor do gabinete de V.ª Ex.ª e por uma vogal do Conselho Superior do Ministério Público, no qual se refere, inter alia, que:

                «A ideia fundamental que se visa instituir merece a nossa integral concordância. E, para tanto, acrescentando-se à exposição de motivos uma razão que nos parece crucial, relacionada com a perda de competências do Ministério Público para promover as execuções por custas, multas processuais, multas criminais e coimas administrativas determinadas nos processos judiciais e contraordenacionais.

                Não se trata, assim, apenas de libertar os oficiais de justiça do cargo/função de agentes de execução nestas concretas ações executivas, mas também as de os próprios magistrados do Ministério Público que, deste modo, se poderão dedicar mais ainda ao exercício da sua atividade funcional nas suas vertentes de maior complexidade»[56].

Na mesma linha, no parecer emitido pela Ordem dos Advogados refere-se que:

               «O primeiro objetivo essencial da iniciativa legislativa é uma transferência de competência e responsabilidades dos oficiais de justiça para os funcionários da administração fiscal em matéria de cobrança judicial efetiva de taxas de custas, multas, coimas e outras quantias cobradas em processo judicial, nomeadamente sanções pecuniárias, à semelhança do que, aliás, já sucede em matéria de tribunais administrativos e fiscais.

               (…)

               Do ponto de vista da substância conceitual, a iniciativa legislativa em causa assenta (i) na natureza afinal intrinsecamente fiscal das quantias em causa (ii) e na natureza não judicial do processamento executivo em matéria das quantias que serão agora objeto da atuação da administração fiscal.

               (…)

               O mesmo princípio vigorará quanto a “outras sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou multas”, o que implica abranger as entidades com competência para a aplicação de sanções de natureza contraordenacional»[57].

O parecer do Conselho Superior da Magistratura, apesar de salientar o mesmo propósito legislativo, era, todavia, muito mais comedido e mais crítico. Em causa estava, sobretudo, a verdadeira natureza jurídica das multas e das coimas:

              

                «ao invés do que sucede com as custas processuais, a consideração de multas, coimas e sanções pecuniárias como “dívidas fiscais ou parafiscais” suscita efetivas reservas, não parecendo que o legislador tenha atentado na especial natureza daquelas, que não se deverão confundir com qualquer “exigência tributária, de natureza sinalagmática”, nem encontram reflexo na definição de tributo decorrente dos artigos 3.º, 4.º e 5.º da Lei Geral Tributária.

               As penas de multa e as coimas aplicadas pelo Tribunal, respetivamente em enquadramento de direito penal primário e secundário não têm cariz tributário, nem natureza sinalagmática, representando, ao invés, o essencial reduto do poder punitivo do Estado, o que parece justificar tratamento diferenciado na respetiva execução.

               (…)

               o Código de Procedimento e de Processo Tributário assenta no pressuposto essencial de que a quantia exequenda corresponde a  uma divida tributária, assim se justificando, por exemplo a execução de sucessores conforme decorre do artigo 153.º e 154.º do referido diploma.

               Sucede que, faltando às coimas e multas esse caráter tributário e sinalagmático e tratando-se de sanções decorrentes de uma responsabilidade pessoal, em caso de falecimento do executado/arguido, extingue-se a responsabilidade criminal e contraordenacional, o que (é) frontalmente incompatível com o disposto nos referidos preceitos. Este será apenas um exemplo da incompatibilidade e inadequação entre regime previsto para a execução fiscal e a natureza das coimas e penas de multa aplicadas pelos tribunais comuns»[58].

Assim, considerando o teor da proposta inicial e dos pareceres que sobre ela recaíram, dúvidas não restam, que (bem ou mal) a intenção inicial do legislador era (como aí logo se anunciava) transferir para o processo de execução fiscal a «cobrança coerciva das custas, multas, coimas e outras quantias cobradas em processo judicial, e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou multas»[59].

Como afirmou a, então, Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, na reunião plenária da Assembleia da República, de 4 de janeiro de 2019:

   

               «A razão pela qual, hoje, aqui nos encontramos prende-se com a proposta de lei que é do conhecimento dos Srs. Deputados e através da qual o Governo pretende alcançar, essencialmente, um grande objetivo: o de se poder recorrer ao processo de execução fiscal para procedermos à cobrança coerciva de todas as custas, multas, coimas e outras quantias pecuniárias fixadas no âmbito de processos e, ainda, outras sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou multas»[60].
 

4. 3. Não obstante este claro propósito inicial, é certo que há algumas diferenças entre a Proposta de Lei n.º 149/XIII e as soluções que, efetivamente, foram, depois, consagradas na Lei n.º 27/2019, de 28 de março, revelando que o pensamento do legislador evoluiu durante o processo legislativo.

 Por um lado, ao contrário da proposta inicial, a lei omitiu qualquer referência expressa à cobrança das coimas ou das custas fixadas por decisão das entidades administrativas, referindo-se, agora, apenas, «à cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial» [cfr. o art. 1.º, n.º 1[61], o art. 2.º (que alterou o art. 148.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário[62]), e o art. 3.º (que, para além do mais, alterou o art. 35.º do Regulamento das Custas Processuais[63])].  

Por outro lado, em sentido inverso, entre outros acertos, o legislador aditou novos preceitos, de modo que, ao contrário da proposta inicial, a Lei n.º 27/2019, de 28 de março alterou, igualmente, o artigo 131.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário (art. 2.º); os artigos 87.º e 88.º do Código de Processo Civil (art. 4.º), o artigo 469.º do Código de Processo Penal (art. 7.º) e o artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro, que regula o regime de custas no Tribunal Constitucional. Para além disso, a referida lei eliminou o artigo 57.º do Código de Processo Civil e a alínea n), do artigo 141.º, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade. Finalmente, o legislador eliminou a prevista [art. 7.º, al.ª a)] revogação da alínea b), do n.º 1, do artigo 148.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário[64], que, assim, se manteve em vigor.

Importa, por isso, verificar se estas alterações, introduzidas sobretudo na sequência de uma proposta de alteração, formulada em 29 de janeiro de 2019, pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, alteraram aquele propósito inicial de remeter a cobrança coerciva das custas para a Autoridade Tributária ou, se pelo contrário, o reforçaram ainda mais[65].

4.3.1. Durante a discussão na generalidade, realizada em 4 de janeiro de 2019, foram apontados vários problemas à proposta de lei. Assim, o deputado José Manuel Pureza (BE) suscitou o problema da «inclusão, no elenco das cobranças, da cobrança de multas criminais a serem transferidas para a competência da Autoridade Tributária, aplicando um processo de execução fiscal» nos seguintes termos:

               «Isto é algo que suscita grandes perplexidades do ponto de vista do cumprimento das regras essenciais do Estado de direito, porque, na verdade, estamos diante de um processo que só formalmente é um processo judicial, já que, efetivamente, é um processo administrativo e só por impulso do próprio executado é que haverá um controlo da legalidade por parte de um juiz. Estamos, portanto, perante um processo que levanta grandes questões do ponto de vista da verificabilidade das garantias efetivas de um Estado de direito para este tipo de cobranças»[66].

A deputada Vânia Dias da Silva (CDS-PP) destacou, primeiro, a sua concordância quanto à cobrança coerciva de custas judiciais:

                «Como bem menciona a proposta de lei, as custas têm uma natureza sinalagmática, ou seja, correspondem ao pagamento de um serviço que o Estado proporciona e, portanto, faz sentido que esta cobrança seja transferida para a Autoridade Tributária, quando as custas não são pagas voluntariamente. Não temos nada, portanto, contra este princípio».            

De todo o modo, apesar desta concordância genérica com o princípio, a referida deputada destacou, depois, que a proposta confundia penas e multas que não têm caráter sinalagmático:

               «A proposta de lei confunde, não sei porquê, as duas realidades, mas elas são distintas e não são passíveis de confusão. Portanto (…) é preciso garantir que aqui a questão é tratada de forma diferente e, por isso, em sede de especialidade, estaremos disponíveis para o fazer, porque estas multas podem ser convertidas em penas de prisão e, neste caso, o tratamento não pode ser, apenas e só, administrativo, tem de haver outro tratamento»[67].

O deputado Carlos abreu Amorim (PSD) referiu, por seu turno que:

               «A proposta do Governo começa com uma exposição de motivos um pouco panfletária e até enganadora. Depois, no seu conteúdo normativo, capricha em amalgamar a cobrança de créditos de custas judiciais dos tribunais comuns com outras sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou multas. Ora, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. São conceitos diferentes e a sua igualação comporta riscos, e sérios. Como sublinha o Conselho Superior da Magistratura, as multas, coimas e sanções pecuniárias não são dívidas fiscais ou parafiscais, como quer significar a proposta, e pretender oferecer-lhe o mesmo regime é perigoso. Nas execuções das multas criminais, quando se alargam ao âmbito das execuções fiscais, não podemos ignorar que este processo pode correr do princípio até ao fim sem a intervenção necessária de um magistrado, ou seja, tudo restará confinado a técnicos tributários. Esta é também a opinião manifestada pelo Conselho Superior do Ministério Público. Isto significa que esta proposta faz equivaler o regime de cobrança de dívidas, sem consequências na privação da liberdade, ao daquelas que têm precisamente esse efeito, o que colide com regras do processo penal que não são bulidas e, sobretudo, com a lógica dos direitos fundamentais, que, já agora, realço (…) não são meros tradicionalismos e anacronismos, conforme vem dito na exposição de motivos»[68].

Finalmente o deputado António Filipe (PCP) destacou que a eficácia da proposta será inquestionável, mas a justiça e a aplicação da justiça têm de reger-se por outros critérios que não apenas o critério da eficácia. Assim:

               «há objeções muito sérias que são colocadas a esta proposta de lei e que constam, designadamente,  dos  pareceres  que  nos  foram  apresentados  quer  pelo  Conselho  Superior  do Ministério Público, quer pelo Conselho Superior da Magistratura. E há uma questão central que é, de facto, a da aplicação que o Governo pretende do processo de execução fiscal a sanções que decorrem da responsabilidade penal. E, neste caso, o parecer do Conselho Superior do Ministério Público não poderia ser mais elucidativo, quando diz, inclusivamente, que será de questionar, e vou citar, “se a solução de entregar a execução da pena de multa a um órgão administrativo que atua sem fiscalização judicial oficiosa é a que melhor se coaduna com a consequência de que, se o pagamento coercivo não tiver êxito, a pena de multa é convertida em prisão subsidiária”. Ora bem, esta é uma questão central. Ou seja, o fisco não pode mandar prender. A conversão de uma pena de multa aplicada no âmbito de um processo penal em pena de prisão tem de ser feita obrigatoriamente com a intervenção do poder judicial. Não pode ser a administração tributária a tomar uma decisão dessa natureza e não está devidamente acautelado, nesta proposta de lei, como se processa a intervenção do tribunal relativamente a uma situação como esta, mas isso tem de ser acautelado.

(…)

               Por outro lado, (…) o Conselho Superior da Magistratura chama a atenção para uma outra questão que também está relacionada com esta. É que as coimas e as multas, no âmbito do processo penal, não têm caráter tributário, até porque a responsabilidade penal não se transmite aos herdeiros, ou seja, é uma responsabilidade que se extingue. A responsabilidade penal extingue-se com a morte do arguido, o que não acontece com as dívidas tributárias. Portanto, obviamente, são realidades completamente distintas e não podem, portanto, ser amalgamadas numa proposta de lei, como pretende o Governo»[69].

Foi neste contexto, já na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias[70] que surgiu a referida proposta de alteração do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, de 29 de janeiro de 2019, que, em 5 de fevereiro, sofreu um aditamento; e ainda uma proposta do Grupo Parlamentar do PSD, de 1 de fevereiro de 2019. A redação final da lei acabou por receber os contributos de todas estas propostas[71].

4.3.2. Da análise dos debates, do parecer da Ordem dos Advogados, do parecer elaborado por um assessor do gabinete da Procuradora-Geral da República e uma vogal do Conselho Superior do Ministério Público e do parecer do Conselho Superior da Magistratura e destas propostas de alteração, parece claro que o legislador recuou na intenção inicial de, por esta via, cobrar multas com caráter penal aplicadas em processo judicial. Foram essas as principais críticas dirigidas à proposta inicial e foi por sua causa que surgiram as propostas de alteração.

O processo legislativo já não permite, contudo, perceber facilmente por que motivo foi também suprimida a referência inicial às custas, multas, coimas e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas. Os motivos não são aqui tão claros.

De facto, na base desta supressão não parecem estar, seguramente, razões de índole prática, maxime a hipotética indisponibilidade da Autoridade Tributária para abraçar mais esta tarefa. Como também referiu, na reunião plenária da Assembleia da República, de 4 de janeiro de 2019, a, então, Secretária de Estado Adjunta e da Justiça:

               «Relativamente à questão de estarmos a transformar a administração tributária numa superagência e se foi ou não feito algum estudo que habilite o Ministério da Justiça a certificar, expor e exarar na própria nota preambular que isto não terá nenhum impacto na atividade normal desempenhada pelo serviço competente da administração tributária, queria dizer o seguinte: não, não vai ter impacto. O Ministério da Justiça não fez tudo, mas o Ministério das Finanças participou no grupo de trabalho, teve a possibilidade de avaliar a situação, mediante um estudo comparativo, perante o trabalho que lhe dá neste momento serem eles a processar as execuções fiscais relativamente às coimas, às multas e às taxas de justiça não pagas, portanto, relativamente a custas não pagas no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, e tendo em conta o universo que é hoje conhecido das execuções que pendem nos tribunais comuns, e chegou à conclusão de que, para eles, o processo é de tal ordem mecanizado que isto não lhes traz qualquer tipo de entropia. Portanto, é esta a  garantia que  temos  e  temos  de  confiar,  porque  é  o  Ministério  das  Finanças  que  vai processar  este  tipo  de  execuções  e,  portanto,  se  não  lhe  traz  impacto,  melhor  assim,  porque  podemos  nós aproveitar essa falta de impacto na administração tributária em favor de um impacto, esse, sim, muito positivo, na  administração  da  justiça,  uma  vez  que  isso  vai  libertar  funcionários  e  recursos,  que  deixam  de  estar prisioneiros de tarefas repetitivas para poderem dirigir a sua atividade para os processos que verdadeiramente interessam à defesa dos direitos das pessoas nos tribunais»[72].

Por isso mesmo, a única razão que se encontra para a supressão é, também aqui, o caráter não sinalagmático da coima e, logo, como incisivamente denunciou o parecer do Conselho Superior de Magistratura e a generalidade dos deputados que se pronunciaram, a hipotética impossibilidade de cobrar estes montantes através das execuções fiscais. Esquecendo a verdadeira natureza do direito de mera ordenação social[73] e, em consequência, a verdadeira natureza da coima[74] e que, por isso mesmo, à semelhança do que já acontece com «as coimas e outras sanções pecuniárias decorrentes da responsabilidade civil determinada nos termos do Regime Geral das Infrações Tributárias» [art. 148.º, n.º 1, al.ª c), do Código de Procedimento e de Processo Tributário[75]], nada impediria a sua cobrança em sede de execução fiscal, o legislador alterou a proposta inicial, assim excluindo do âmbito deste diploma a cobrança de penas de multa e de coimas[76]. Mais do que um recuo no propósito inicial do diploma, está em causa a sua restrição apenas a dívidas de natureza sinalagmática ou bilateral, independentemente da entidade credora, por se julgar (mal) que as coimas não podiam ser cobradas em sede de execução fiscal. Não foi invocada nenhuma outra razão para o efeito.

4.4. A interpretação deste novo regime legal, pressupõe ainda, para além destes elementos relativos à mens legislatoris, a consideração da verdadeira natureza jurídica do que está em causa. Do ponto de vista jurídico, o que são afinal as custas?

Nos termos do artigo 92.º, n.º 3, do Regime Geral das Contraordenações:

             

               «As custas abrangem, nos termos gerais, a taxa de justiça, os honorários dos defensores oficiosos, os emolumentos a pagar aos peritos e os demais encargos resultantes do processo».

Em causa está, portanto, desde logo, a taxa de justiça[77]. Os custos do serviço de justiça são suportados, em parte, pela coletividade, através dos impostos e, em parte, pelos respetivos utentes, através do pagamento da taxa de justiça[78].

Como um dia escreveu Vítor António Duarte Faveiro:

                   «todos necessitam da existência de serviços de justiça (…) pela segurança que dão à garantia e à eficácia dos direitos individuais, à defesa da coletividade contra o crime, à certeza das situações jurídicas; mas em certos casos só alguns têm de recorrer ativamente aos tribunais ou a eles são chamados para decisão do seu conflito com outrem (…). Daí que os serviços destinados à satisfação de tais necessidades, sendo embora criados pelo Estado, e correspondendo, pela simples existência, a uma necessidade coletiva, devam em parte, ser mantidos e sustentados por aqueles que a eles recorrem ativamente ou que provocam a situação de necessidade desse recurso ou procura ativa. O pagamento de custas ou de emolumentos é, nestes casos, uma forma de distribuição do custeio de tais serviços, na parte em que deve ser imputado ao utente»[79].

As taxas podem ser devidas mesmo quando os particulares não beneficiam, nem solicitaram, as atividades públicas que as justificam. É, justamente, o que sucede com a taxa de justiça, devida pelos arguidos condenados em processo penal. Como diz Nuno Sá Gomes:

               «Aqui continua a haver contrapartida de atividade desenvolvida pelo Estado, mas dificilmente se poderá falar em vantagens, utilidades ou benefícios auferidos pelos particulares condenados ou que não solicitaram a prestação dos serviços de justiça»[80].

Nestes termos, a taxa de justiça devida pela condenação num processo de contraordenação, correspondendo à prestação de um serviço público, ainda que não solicitado ou até vivamente recusado pelo condenado, constitui um tributo (como, logo, sublinhou a proposta de lei), nada impedindo que a sua cobrança siga os procedimentos executivos, previstos para arrecadação dos restantes tributos (art. 10.º, alª g), do Código de Procedimento e de Processo Tributário[81]).

Para além disso, estão ainda em causa os demais encargos contraídos com o processo, nomeadamente os eventuais honorários do defensor oficioso, os emolumentos a pagar aos peritos ou outros encargos. Mais uma vez, ainda que contra a vontade do visado, o procedimento contraordenacional deu origem a estes custos. Assim, independentemente de saber se eles têm ou não natureza tributária[82], a verdade é que eles podem ser cobrados pela administração tributária.

Desde logo, porque os serviços da administração tributária têm, para além do mais, repetimos, competência para cobrar as custas dos processos (art. 10.º, alª g), do Código de Procedimento e de Processo Tributário) ou seja, neste caso, para cobrar a taxa de justiça e demais encargos (art. 92.º do Regime Geral das Contraordenações).

Depois, porque nada impede que os mesmos sejam cobrados em sede de execução fiscal, nos termos do artigo 148.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, segundo o qual:

             

              «1 - O processo de execução fiscal abrange a cobrança coerciva das seguintes dívidas:

               a) Tributos, incluindo impostos aduaneiros, especiais e extrafiscais, taxas, demais contribuições financeiras a favor do Estado, adicionais cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais».

Atenta a natureza tributária da taxa de justiça e o caráter legal dos restantes encargos (art. 92.º, n.º 2, do Regime Geral das Contraordenações), nada impede que eles sejam cobrados através do processo de execução fiscal: quanto a estes créditos, ninguém suscitou a incompetência ou sequer inconveniência na sua cobrança pela Autoridade Tributária. As custas só não eram já executadas pela Autoridade Administrativa porque, na sequência daquela longa tradição histórica[83], o Regime Geral das Contraordenações, à semelhança dos outros ramos do direito adjetivos, dispunha de normas especiais, para o efeito, que, justamente, foram agora revogadas. Daí que o artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário tenha alargado a sua área de aplicação.

Aliás, ainda que porventura assim não fosse, a verdade é que as execuções fiscais podem ser utilizadas para a cobrança de créditos de natureza não tributária, como por exemplo, obrigações pecuniárias que, por força de um ato administrativo, devam ser pagas a uma pessoa coletiva pública ou por ordem desta[84] ou outras dívidas sujeitas ao regime de tesouraria do Estado[85]. Até porque, como se referiu supra, o Tribunal Constitucional tem excluído a fase executiva do âmbito da reserva de jurisdição dos Tribunais Administrativos e Fiscais (art. 212.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa), aceitando que àqueles sejam atribuídas competências para a cobrança coerciva de outros créditos[86]. Nada impediria que, atenta a alegada eficácia das execuções fiscais, o legislador exorbitasse aquelas competências naturais.

4.5. Considerando esta natureza tributária e a possibilidade de cobrar aqueles encargos legais (que, insistimos, não foram questionadas), não admira que, para além de apenas ter restringido o seu propósito inicial à cobrança de créditos de natureza sinalagmática, o legislador tenha, já no decurso do processo legislativo, eliminado outras possibilidades de cobrança.

É o caso das alterações introduzidas à Lei da Organização do Sistema Judiciário (art. 2.º da Lei n.º 27/2019, de 28 de março) que, em vez de atribuir, ao juízo ou tribunal que as tivesse proferido, competência para executar as decisões relativas a multas, custas e indemnizações previstas na lei processual aplicável, passou a atribuir-lhe apenas competência para a execução das decisões relativas a multas penais e indemnizações previstas na lei processual aplicável (art. 131.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário)[87].

É, igualmente, o caso da revogação do artigo 57.º do Código de Processo Civil, que conferia ao Ministério Público legitimidade para promover a execução por custas e multas judiciais impostas em qualquer processo (art. 10.º, al.ª a), da Lei n.º 27/2019, de 28 de março).

 É, em terceiro lugar, o caso da revogação do artigo 141.º, alª n), do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, que sem prejuízo de outras disposições legais, atribuía ao representante do Ministério Público, junto do tribunal de execução das penas, competência para instaurar a execução por custas (art. 10.º, al.ª c), da Lei n.º 27/2019, de 28 de março).

É, finalmente, o caso da alteração do artigo 469.º do Código de Processo Penal que, em vez de conferir ao Ministério Público competência para promover a execução das penas e das medidas de segurança, bem como a execução por custas, indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar judicialmente,  passou a conferir-lhe, apenas, competência para promover a execução das penas e das medidas de segurança e, bem assim, a execução por indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar judicialmente (art. 7.º da Lei n.º 27/2019, de 28 de março). O legislador entendeu que não era suficiente eliminar a referência à execução por custas, que constava do artigo 491.º do Código de Processo Penal, complementando, in extremis, essa supressão com a redução das próprias competências executivas do Ministério Público.

Desta forma, em vez de enfraquecer o propósito inicial, o legislador reforçou-o, tornando, para além do mais, claro, que, ressalvados os casos previstos na Lei (art. 35.º, n.º 3 do Regulamento das Custas Processuais), o Ministério Público já não tem competências, nem no processo penal, nem, tão pouco, no processo civil, para promover a tradicional execução das custas. As alterações introduzidas vieram, afinal, confirmar o propósito inicial, tornando-o ainda mais claro, mediante a revogação transversal de normas que podiam induzir em sentido contrário. O legislador não se limitou a afirmar, de forma positiva, a competência da Autoridade Tributária, eliminando, de forma negativa, as anteriores competências do Ministério Público, mantidas apenas para a cobrança de custas no estrangeiro, nos termos daquele Regulamento.

É certo que o legislador não alterou nem clarificou outas normas, nomeadamente o disposto no artigo 89.º, n.º 2, do Regime Geral das Contraordenações[88] ou o artigo 126.º, n.º 1, al.ª m), da Lei da Organização do Sistema Judiciário[89], que, numa interpretação rígida, podem sugerir que o Ministério Público manteve incólumes as suas competências[90]. De todo o modo, embora o legislador possa ser sempre mais claro, a verdade é que nem essa interpretação é legítima, nem essa correção se impunha. As referidas normas tratam da execução da coima e das competências executivas civis dos juízos do trabalho, não se confundindo com a execução das custas. Daí que sejam inaplicáveis nesta situação concreta. Tanto mais que também elas devem ser interpretadas de acordo com o restante sistema jurídico (art. 9.º, n.º 1, do Código Civil), de que fazem parte integrante.

Muito mais complexa é a manutenção do artigo 60.º, n.º 1, da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, que continua a prescrever que:

               «Decorrido o prazo de pagamento das custas sem a sua realização, a autoridade administrativa envia, nos 20 dias úteis seguintes, o processo ao Ministério Público para a instauração da competente ação executiva».

O legislador eliminou as competências executivas do Ministério Público mas manteve este preceito intacto. Isto não significa que ele continue em vigor. Na verdade, ele é incompatível com as novas disposições, que, num duplo movimento, remeteram a execução por custas para as execuções fiscais e, ressalvada a cobrança de custas no estrangeiro, eliminaram as competências do Ministério Público nesta matéria. Daí que este preceito deva considerar-se tacitamente revogado (art. 8.º, n.º 2, do Código Civil): o legislador nunca demonstrou qualquer vontade de excecionar estes regimes. Antes pelo contrário, sempre invocou o caráter geral de reforma.

4.6. Acresce que, já em termos teleológicos, não faria, sequer, sentido que o legislador remetesse para a Autoridade Tributária a execução das custas fixadas nos tribunais comuns e conservasse nos tribunais comuns as custas fixadas na fase administrativa do processo de contraordenação, onde, justamente, a natureza administrativa do processo é, ainda, mais evidente. O mesmo facto tributário (condenação em custas decorrentes da participação em processo de contraordenação) daria lugar a duas entidades executivas diversas, consoante tivesse havido ou não recurso aos tribunais.

Por outro lado, esta solução (remeter para as execuções fiscais as custas judiciais mas conservar as custas fixadas na fase administrativa dos processos de contraordenação) também não permitiria alcançar os ganhos de eficácia, eficiência e deflação do sistema judiciário, que estiveram na base da alteração[91], continuando os tribunais judiciais assoberbados com a cobrança destas dívidas. A reforma seria apenas parcelar.

A ausência de uma qualquer referência às decisões de condenação em custas proferidas pelas Entidades Administrativas deve-se, assim, certamente, não à vontade de as excluir, mas à circunstância decisiva da sua inutilidade, atento o teor do artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Não é necessário voltar a referir aquilo que já está referido na lei. A omissão destas decisões não significa, portanto, uma qualquer lacuna legal, a preencher nos termos gerais. Está em causa a mera cobrança coerciva de um verdadeiro tributo e dos respetivos encargos legais, já admissível nos termos gerais.

Tanto mais que, continuando o artigo 92.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, a remeter para os preceitos reguladores das custas em processo criminal, só se poderá concluir que as custas fixadas na fase administrativa do processo de mera ordenação social seguem o mesmo regime adjetivo: também elas obedecem ao regime agora consagrado no artigo 35.º do Regulamento das Custas. Se o legislador tivesse querido submeter estas custas a um regime processual diferente, mantendo as competências tradicionais do Ministério Público, não as poderia ter revogado e teria alterado também esta norma. Para excluir as custas fixadas pelas entidades administrativas, o legislador teria que ter alterado também o artigo 92.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, por forma a criar um sistema autossuficiente.

4.7. O Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de janeiro, que aprova o Regime Jurídico das Contraordenações Económicas[92] confirma esta nova opção do legislador, prescrevendo, no artigo 64.º, que:

              

               «1 - Da decisão condenatória da autoridade administrativa não impugnada judicialmente é extraída certidão de dívida, de acordo com os requisitos do artigo 163.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, procedendo-se à cobrança coerciva, em processo de execução fiscal, da competência da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).

               2 - A entrega da certidão de dívida é efetuada através da plataforma eletrónica da AT ou por via eletrónica».

Deste modo, apesar de continuar a atribuir aos tribunais judiciais competência para a fase judicial do processo de contraordenação (art. 72.º)[93], o legislador, mantendo a mesma solução adjetiva, remeteu a execução da coima e das custas para a Autoridade Tributária. Ele não seguiu o exemplo dos regimes das contraordenações em matéria tributária ou urbanística, integralmente remetidos para a jurisdição administrativa, mas, ainda assim, utilizou as competências da Autoridade Tributária para a cobrança coerciva daqueles montantes.

II

Como deverão proceder os magistrados do Ministério Público relativamente ao expediente que lhes for remetido pelas diversas autoridades administrativas para cobrança de custas não pagas?

A segunda questão colocada consiste em saber «como deverão proceder os magistrados do Ministério Público relativamente ao expediente que para o efeito lhes for remetido pelas diversas autoridades administrativas – deverá tal expediente ser-lhes devolvido, para os fins tidos por convenientes, acompanhado de despacho onde constem as razões pelas quais se entende que o Ministério Público não é legalmente competente para o efeito? Ou deverá tal expediente, por mera economia de meios, ser reencaminhado diretamente à Autoridade Tributária, com conhecimento à autoridade administrativa que o remeteu, acompanhado do referido despacho?»

1. Nem o Regime Geral das Contraordenações, nem os restantes regimes especiais contêm normas que permitam responder à pergunta formulada. O regime ora implementado, apesar de estar na génese do problema, também não o resolve, porventura, no espírito do legislador, porque tudo ficou claro, devendo a entidade administrativa remeter o expediente para o local certo: o legislador nem sequer pensou que tal expediente pudesse ser remetido para entidade incompetente para promover a execução. Isto não significa, todavia, que se esteja perante uma verdadeira lacuna do regime de mera ordenação social, a integrar segundo a norma aplicável aos casos análogos (art. 10.º, n.º 1, do Código Civil) ou, na sua falta, segundo a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema (art. 10.º, n.º 3, do mesmo diploma legal). Na verdade, sempre que (como é o caso) o contrário não resulte do regime geral de contraordenações, são aplicáveis, devidamente adaptados, os preceitos reguladores do processo criminal, que não sejam incompatíveis com ele (art. 41.º[94]). É aí que primeiro se deve procurar a solução para o problema. As normas adjetivas do direito de mera ordenação social não se restringem aos preceitos consagrados naquele regime geral (ou naqueles regimes especiais), incluindo, nos casos aí omissos, todo o processo penal que se harmonize com ele ou seja que respeite a sua teleologia própria.

2. O Código de Processo Penal também não contém nenhuma norma, per si, capaz de resolver, imediatamente, o problema. Como seria de esperar, atentas as finalidades deste Código, não é possível encontrar aí uma resposta direta, expressamente, plasmada no texto da lei. As relações entre as entidades administrativas competentes para o processo de contraordenação e o Ministério Público não tinham que ser reguladas no processo penal, que é alheio a esse problema.

Mesmo assim, não obstante esta omissão, a solução deverá ser procurada no processo penal, maxime através dos mecanismos de integração das lacunas aí existentes, ou seja, aplicando, sucessivamente, por analogia, os restantes preceitos processuais penais, as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal ou, em última instância, os princípios gerais do processo penal (art. 4.º)[95]. A aplicação subsidiária do processo penal ao regime de mera ordenação social compreende, nos casos omissos, o recurso a estas formas de integração das lacunas processuais penais. O artigo 4.º do Código de Processo Penal ainda é um preceito regulador do processo criminal, sendo a forma extrema de resolver as lacunas do processo de mera ordenação social, que não tenham sido previamente integradas pelas restantes normas do processo penal. O legislador remeteu para todo o sistema processual penal, aí se incluindo a forma legal de ultrapassar as suas lacunas.

E não se diga que esta solução legislativa não salvaguarda a autonomia do direito de mera ordenação social[96] e que, portanto, a resposta para a integração de uma lacuna deverá ser autonomamente procurada dentro desse mesmo direito, maxime através da aplicação analógica do artigo 40.º, n.ºs 1 e 2, do Regime Geral das Contraordenações, segundo os quais, caso a autoridade administrativa tenha remetido o processo ao Ministério Público, por entender que a infração constitui afinal um crime, o Ministério Público devolverá o processo à mesma autoridade se considerar que não há lugar para a responsabilidade criminal.

Na verdade, as situações são muito diversas, havendo aí razões válidas para a devolução do processo à entidade administrativa, que aqui não se justificam. Com efeito, a devolução do processo à entidade administrativa, por se considerar que não existe crime, destina-se a permitir que ela prossiga com o processo de contraordenação, eventualmente aplicando uma coima e diligenciando pela sua execução: sem o processo, nada disso será possível. Com a decisão do Ministério Público, a entidade administrativa recupera as suas competências, prosseguindo (ou não) com ele.

Nada disso acontece neste caso, tendo a decisão proferida transitado em julgado, de modo que falta apenas a sua execução. A devolução do processo (ou do expediente remetido para execução) não terá aqui qualquer consequência, para além da obrigação de o remeter à Autoridade Tributária. Não há, por isso mesmo, aqui nenhuma analogia de situações. Aquela norma não pode ser convocada para solucionar a questão.

Ainda que assim não fosse, sempre se diria que, independentemente da discussão, de iure constituendo, sobre a verdadeira localização do direito de mera ordenação social, o intérprete nunca poderia sobrepor a sua conceção pessoal à solução legitimamente consagrada pelo legislador, que (repetimos) remete a resolução desses casos para o universo processual penal, desde que essa adaptação não viole regras ou princípios contraordenacionais[97]. Procurar uma situação análoga dentro do Regime Geral das Contraordenações, em vez de recorrer ao direito subsidiário, consubstancia uma metodologia jurídica inadmissível, que subverte as regras fixadas pelo legislador. Bem ou mal, ele tomou a sua opção: só se aplica aquilo que não contrarie a intencionalidade própria do direito de mera ordenação social. De modo que, não obstante aquela remissão imediata, a sua autonomia está perfeitamente assegurada.

Assim, mesmo que, aparentemente, contenham a melhor solução para o caso concreto, as regras de outros ramos adjetivos do ordenamento jurídico (nomeadamente do direito administrativo) não são aqui aplicáveis.

2.1. Nos termos do artigo 33.º, n.º 1, do Código de Processo Penal:

              «1 - Declarada a incompetência do tribunal, o processo é remetido para o tribunal competente, o qual anula os atos que se não teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo e ordena a repetição dos atos necessários para conhecer da causa».

Em vez de devolver o processo ao Ministério Púbico (para que este o remeta ao tribunal competente), o tribunal que se considera incompetente deverá remeter o processo ao tribunal que julga ser competente. Na base desta solução está, obviamente, a celeridade e a economia de meios[98]. Sendo a declaração de incompetência irrelevante para o posterior exercício do ius puniendi estadual, não faria sentido devolver o processo ao Ministério Público para que este depois o remetesse ao tribunal competente. Proceder dessa forma seria praticar um ato inútil.

O mesmo acontece no decurso do próprio inquérito, porquanto:

               «1 - Se, no decurso do inquérito, se apurar que a competência pertence a diferente magistrado ou agente do Ministério Público, os autos são transmitidos ao magistrado ou agente do Ministério Público competente» (art. 266.º, n.º 1)[99].

Também aqui a solução adjetiva é exatamente a mesma: transmissão direta do processo ao Ministério Público competente, com aproveitamento dos atos de inquérito antes realizados, que sejam válidos (n.º 2). Mais uma vez, por razões de economia e de celeridade, não há devolução do inquérito à sua procedência.

Finalmente, o mesmo princípio aflora, ainda, no regime processual da denúncia efetuada perante entidade incompetente para o procedimento. Com efeito:

               «A denúncia feita a entidade diversa do Ministério Público é transmitida a este no mais curto prazo, que não pode exceder 10 dias» (art. 245.º[100]).

Em vez de devolver o expediente ao denunciante, a solução legal consiste na sua rápida transmissão à entidade competente.

Em todas estas situações processuais, a incompetência do órgão chamado a praticar um determinado ato processual penal determina, portanto, a imediata remessa dos autos para a entidade competente e não a sua devolução burocrática à procedência. Será uma perda de tempo e de meios devolver o processo à entidade procedente, apenas para que esta o remeta, depois, à entidade, afinal, competente. Embora (como já iremos ver) seja oriundo do processo civil, o princípio da economia processual contaminou outros ramos do direito adjetivo, como o processo penal, sendo estas normas uma clara manifestação da sua valência geral[101]. Também no processo penal, a prática de atos inúteis é proibida. A celeridade, que o direito a ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa (art. 32.º, n.º 2, CRP) ou de que a causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável (art. 20.º, n.º 4, CRP) demanda, impõe esta solução. Tudo aquilo que, sem qualquer justificação racional, maxime a defesa de direitos ou pretensões de um qualquer interessado ou da própria sociedade, provoque o arrastamento do processo deverá ser excluído. Até porque, segundo Jorge de Figueiredo Dias:

               «o efeito de prevenção geral do sistema penal (ao qual, por toda a parte, a opinião pública e os meios de comunicação social se mostram tão sensíveis) não depende em quase nada de uma grande severidade das penas; mas depende em extremo grau da probabilidade da punição e do lapso de tempo dentro do qual ela venha a efetivar-se»[102].

timing da execução da sanção também não é despiciendo. A necessidade de celeridade permanece mesmo depois do trânsito em julgado. Tanto mais que os prazos de prescrição das coimas são fulminantes (sem prejuízo da sua suspensão ou da sua interrupção, um ou três anos – art. 29.º do Regime Geral das Contraordenações): não há, por isso, tempo para diligências inúteis.

2.1.1. Embora seja possível convocar a aplicação analógica de qualquer uma destas três normas processuais penais, a norma que melhor responde à situação concreta é a norma que permite ao Ministério Público transmitir os autos ao magistrado competente (art. 266.º, n.º 1, do Código de Processo Penal). Desde logo, porque está em causa um ato do próprio Ministério Público e não um ato do juiz (art. 33.º) ou de outra entidade qualquer (art. 245.º). Depois porque o princípio consagrado nesta norma deverá ser alargado a outras situações para além da simples incompetência territorial. Também nos casos em que o Ministério Público não seja materialmente competente para a prática do ato solicitado, a solução deverá ser a remessa do expediente à entidade competente para o efeito.

2.2. A solução não seria muito diferente se estas normas processuais penais não pudessem ser aplicadas analogicamente às situações que originaram o presente pedido de Parecer, nos termos previstos no artigo 41.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações e no artigo 4.º do Código de Processo Penal.

Segundo um velho princípio processual, que remonta ao Código de Processo Civil, de 1939 (art. 138.º[103], atual art. 130.º), não é lícito realizar no processo atos inúteis. Na verdade, «deve procurar-se o máximo resultado processual com o mínimo emprego de atividade; o máximo rendimento com o mínimo custo». O processo deve «comportar só os atos e formalidades indispensáveis ou úteis (economia de atos e economia de formalidades)»[104]. Deste ponto de vista, a devolução do processo à entidade administrativa para posterior remessa à Autoridade Tributária não tem qualquer utilidade para a execução da coima e, como tal, está proibida.

Se não fosse possível encontrar uma solução (analógica) no próprio processo penal, por aplicação deste velho preceito processual civil (art. 130.º), sempre se teria de concluir que ao Ministério Público está vedado o ato inútil de devolver o expediente à procedência. Esse procedimento não tem qualquer utilidade processual ou extra processual (não salvaguarda qualquer direito dos intervenientes), retardando apenas a devida execução coerciva da decisão da entidade administrativa.

2.3. E não se diga que, desta forma, a entidade administrativa não toma conhecimento do erro cometido e das suas consequências nefastas, continuando a remeter este tipo de expediente para o Ministério Público, em vez de o remeter para a entidade devida. Na verdade, como o próprio pedido de parecer sugere, o Ministério Público deverá informar a entidade administrativa da sua incompetência em razão da matéria e da, consequente, remessa do processo para a Autoridade Tributária. Dessa forma, através dessa simples comunicação, a entidade administrativa ficará a saber que o Ministério Público entende que já não pode promover a execução da taxa de justiça e demais encargos legais e que, portanto, não lhe deverá remeter esse expediente.

É certo que o Ministério Púbico não tem qualquer poder hierárquico sobre a entidade administrativa em causa e que esta poderá ter um entendimento diverso. A administração poderá continuar a defender que ele ainda conserva aquele poder de executar as coimas aplicadas em processo de contraordenação. De todo o modo, esta possibilidade teórica, tanto pode acontecer nos casos de devolução do processo, como nos casos de mera informação da sua remessa para a Autoridade Tributária, sendo, nesta perspetiva, a escolha por uma das duas soluções possíveis irrelevante. A resolução para esse eventual conflito só será possível noutra sede, não passando pela tramitação que o Ministério Público venha a adotar.

III

Conclusões

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

               1.ª Na sua versão original, o Regime Geral das Contraordenações remetia a execução das custas para o disposto nos artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais, assim atribuindo ao Ministério Público competência para promover a sua execução junto dos tribunais judiciais (art. 202.º, n.º 2, daquele Código);

               2.ª Esta solução, apesar das inúmeras alterações legislativas que enfrentou, manteve-se quase inalterada até à entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de março, relativa à aplicação do processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial;

               3.ª Com efeito, considerando a natureza tributária das custas e seguindo o exemplo da jurisdição administrativa e fiscal, o legislador inverteu aquele paradigma, remetendo para a execução fiscal a cobrança coerciva das custas fixadas em processo judicial;

               4.ª Para esse efeito, a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, alterou o Código de Procedimento e de Processo Tributário que passou a dispor que «Poderão ser igualmente cobradas mediante processo de execução fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei: (…) Custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial [art. 148.º, n.º 2, alª c)];             

               5.ª Bem como o artigo 35.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais, que sob a epígrafe «execução», passou a dispor que: «Compete à administração tributária, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial»;

               6.ª Embora nem a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, nem as normas que ela alterou, o digam expressamente, deve entender-se que este regime é aplicável às custas fixadas na fase administrativa do processo de mera ordenação social, competindo à Administração Tributária proceder à sua cobrança coerciva;

               7.ª Desde logo, porque, continuando o artigo 92.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, a remeter para os preceitos reguladores das custas em processo criminal, será aqui aplicável o disposto no artigo 35.º do Regulamento das Custas;

                8.ª Depois, porque, atenta a sua natureza, tais custas estão incluídas no âmbito do artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, segundo o qual o processo de execução fiscal abrange, para além do mais, a cobrança coerciva de taxas, demais contribuições financeiras a favor do Estado, adicionais cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais;

               9.ª Em terceiro lugar, porque, em vez de atribuir ao juízo ou tribunal que as tenha proferido competência para executar as decisões relativas a multas, custas e indemnizações previstas na lei processual aplicável, o legislador passou a atribuir-lhe, apenas, competência para a execução das decisões relativas a multas penais e indemnizações previstas na lei processual aplicável (art. 131.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário);

               10.ª Em quarto lugar, porque o legislador restringiu os poderes do Ministério Público, maxime o poder de promover a execução por custas, conferindo-lhe, agora, apenas, competência para promover a execução das penas e das medidas de segurança e, bem assim, a execução por indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar judicialmente (art. 469.º do Código de Processo Penal);

               11.ª Finalmente, porque o legislador eliminou a referência à execução por custas, que constava do artigo 491.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, passando a mesma a ser da competência exclusiva da Administração Tributária;

               12.ª Com estas alterações, para além de ter atribuído à Administração Tributária competência para proceder à cobrança coerciva das custas, o legislador eliminou as normas que antes atribuíam ao Ministério Público competência para promover a sua execução e aos tribunais judiciais competência para a tramitar;

               13.ª Desta forma, o artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, passou a incluir a cobrança da taxa de justiça e dos encargos legais, que, por força de disposições legais especiais, antes lhe estava subtraída; e

               14.ª Se as entidades administrativas remeterem ao Ministério Público expediente destinado à cobrança de custas fixadas em processo de contraordenação, tal expediente deverá, por mera economia de meios, ser reencaminhado diretamente à Autoridade Tributária, com conhecimento ao remetente.

 

 

[1] Aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agostos e alterado pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.

[2] Era a seguinte a redação original desta norma: «Compete ao Ministério Público promover a execução das penas, imposto de justiça, indemnização de perdas e danos e mais quantias devidas ao Estado»; Sobre esta norma, a sua origem e soluções de direito comparado, por todos, Luís Osório da Gama e Castro de Oliveira Batista, Comentário ao Código de Processo Penal Português, Coimbra, Coimbra Editora, 1934, p. 228 e ss.

[3] Sobre este regime, por exemplo, José Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, Coimbra, Coimbra Editora, 1960, 1, p. 276/7.

[4] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44329, de 8 de maio de 1962; e alterado pelo Decreto-Lei n.º 47692, de 11 de maio de 1967; pelo Decreto-Lei n.º 48853, de 30 de janeiro de 1969; pelo Decreto-Lei n.º 49213, de 29 de agosto de 1969; pelo Decreto-Lei n.º 270/72, de 2 de agosto; pelo Decreto-Lei n.º 297/1973, de 22 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 161/76, de 27 de fevereiro; pelo Decreto-Lei n.º 364/77, de 2 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 533/77, de 30 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 366/80, de 10 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 224/82, de 8 de junho; pela lei n.º 3/83, de 26 de fevereiro; pelo Decreto-Lei n.º 223/83, de 27 de maio; pelo Decreto-Lei n.º 118/85, de 19 de abril; pelo Decreto-Lei n.º 242/85, de 9 de julho; pelo Decreto-Lei n.º 225/85, de 30 de setembro; pela Lei n.º 31/86, de 29 de agosto; pelo Decreto-Lei n.º 214/87, de 28 de maio; pelo Decreto-Lei n.º 387-D/87, de 29 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 92/88, de 17 de março; pelo Decreto-Lei n.º 212/89, de 30 de junho; pela Lei n.º 30-C/92, de 28 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de abril; pelo Decreto-Lei n.º 254/93, de 15 de julho; pelo Decreto-Lei n.º227/94, de 8 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de fevereiro; e revogado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de novembro.

[5] Em 1973, Eduardo Correia tinha defendido que os tribunais administrativos deviam ser competentes para o efeito, nomeadamente porque «admitir um recurso para os tribunais comuns, seria, afinal criminalizar decisões que, justamente, se quer que não tenham o sentido das sentenças que aplicam penas criminais» («Direito Penal e Direito de Mera Ordenação Social», AA.VV. Direito Penal Económico e Direito Europeu: Textos Doutrinários, Coimbra, Coimbra Editora, 1998, 1, p. 15).

[6] Para as origens deste diploma e o nascimento do direito de mera ordenação social, cfr., entre outros, Tiago Lopes de Azevedo, Lições de direito das contraordenações, Coimbra, Almedina, 2020, p. 18 e ss.; Idem, Da subsidiariedade do direito das contraordenações: problemas, críticas e sugestões práticas, Coimbra, Coimbra Editora, 2011, p. 59 e ss.; Augusto Silva Dias, Direito das Contraordenações, Coimbra, Almedina, 2020, p. 27; Nuno Brandão, Crimes e Contraordenações: da Cisão à Convergência Material, Coimbra, Coimbra Editora, 2016, p. 180 e ss.; Alexandra Vilela, O Direito de Mera Ordenação Social: Entre a Ideia de “Recorrência” e a de ”Erosão” do Direito Penal Clássico, Coimbra, Coimbra Editora, 2013, p. 156 e ss.; José Lobo Moutinho, Direito das contraordenações: ensinar e investigar, Lisboa, Publicações Universidade Católica, 2008, p. 22 e ss.

[7] Cuja redação, vigente à data, na sequência das alterações que lhe tinham introduzidas pelo Decreto-Lei 377/77, de 6 de setembro, era a seguinte:

«Findo o prazo de pagamento da multa ou de alguma das prestações sem que o réu efetue o pagamento, procede-se à execução patrimonial nos termos seguintes:

1.º Tendo o réu bens suficientes e desembaraçados de que o tribunal tenha conhecimento ou que o réu indique no prazo de pagamento, comprovando a sua titularidade, o Ministério Público promoverá logo a execução, que seguirá nos termos das execuções por custas, com observância do disposto no artigo 1696.º do Código Civil;

2.º Responderão sempre pelo pagamento da multa todos os instrumentos utilizados na prática da infração e os seus produtos, salvo os que pela prática da infração ficarem perdidos para o Estado e os que, pertencendo a terceiro, tiverem sido utilizados sem o seu conhecimento ou contra a sua vontade. Para os efeitos do disposto neste número, poderão ser apreendidos os instrumentos e produtos, sempre que os infratores não garantam de modo adequado o pagamento da multa provável. São nulos os atos de disposição dos referidos instrumentos e produtos, levados a efeito após a prática da infração, que prejudiquem o pagamento da multa, ressalvando-se os direitos dos adquirentes de boa-fé, conforme o estipulado na lei civil».

[8] Era a seguinte a redação desta norma: «2 - A execução será promovida pelo representante do Ministério Público junto do tribunal competente e obedecerá aos termos da execução por custas, aplicando-se, devidamente adaptado, o disposto no artigo 640.º do Código de Processo Penal».

[9] Era a seguinte a redação completa desta norma:

«Artigo 78.º

(Princípios gerais)

1 - Se o contrário não resultar desta lei, as custas em processo de contraordenação regular-se-ão pelo disposto nos artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais.

2 - As decisões das autoridades administrativas que decidam sobre a matéria do processo deverão fixar o montante das custas e determinar quem as deve suportar.

3 - As custas abrangem, nos termos normais, o imposto de justiça, os honorários dos defensores oficiosos, os emolumentos a pagar aos peritos e os demais encargos resultantes do processo».

[10] Aprovado pelo Decreto-Lei 433/82, de 27 de outubro, alterado pela Declaração de 6 de janeiro de 1983; pelo Decreto-Lei n.º 356/89, de 17 de outubro; pela Declaração de 31 de outubro de 1989; pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de dezembro; e pela Lei n.º 109/2001, de 24 de dezembro.

[11] Apesar das múltiplas alterações que o Código das Custas Judiciais sofreu o artigo 202.º, n.º 2, permaneceu quase intocado, tendo sido alterado pelo Decreto-Lei n.º 161/76, de 27 de fevereiro, que lhe deu a seguinte redação, vigente à data da entrada em vigor do Regime Geral das Contraordenações: «2. Se forem conhecidos bens que possam ser imediatamente executados ou o réu os indicar, comprovando a sua titularidade, o Ministério Público instaurará execução no tribunal da condenação, a qual seguirá os termos das execuções por custas reguladas na parte cível, com observância do disposto no artigo 1696.º do Código Civil».

[12] Como o legislador reconhece no próprio preâmbulo: «dois diplomas que, pelo seu papel no contexto da ordem jurídica portuguesa, em muitos casos estreitaram drasticamente o espectro das alternativas disponíveis, enquanto noutros casos predeterminaram o sentido e o alcance das soluções a consagrar em processo penal».

[13] Salvador da Costa (Código das Custas Judiciais: anotado e comentado, Coimbra, Almedina, 1990, p. 246) defendia, então, que o artigo 488.º, n.º 2, do Código de Processo penal revogou tacitamente aquele artigo 202.º, n.º 2, do Código das Custas Judiciais, uma vez que «é injustificada a duplicidade de regime e dele ressalta intenção de abrangência, na medida em que a eficácia da indicação de bens à penhora pelo arguido deixou de depender da comprovação por ele da respetiva titularidade».

[14] O Decreto-Lei n.º 356/89, de 17 de outubro, no intuito de aproximar a justiça dos seus destinatários (cfr. o respetivo preâmbulo) tinha, entretanto, alterado o artigo 61.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, passando a ser competente para conhecer do recurso o tribunal em cuja área territorial se tiver praticado a infração e não o tribunal em cuja área territorial tem a sua sede a autoridade que aplicou a coima. Solução que, para além daquele propósito confessado pelo legislador, também se afigura mais próxima do processo penal (segundo o art. 19.º, n.º 1, «é competente para conhecer de um crime o tribunal em cuja área se tiver verificado a consumação»).

[15] Cfr. o preâmbulo do referido diploma.

[16] Como se diz no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de novembro, «aprovado o Código de Processo Penal pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro, as normas sobre responsabilidade por custas, no sentido pacificamente abrangente da taxa de justiça e dos encargos, que passaram a figurar no seu livro XI, entraram em colisão com disposições do Código das Custas Judiciais, as quais, não obstante a sua instrumentalidade, continuaram a ser objeto de uma aplicação acrítica, em clara sobreposição com disposições que deviam traçar-lhes os limites».

[17] O novo Código das Custas judiciais regulava as custas criminais nos artigos 74.º e ss. Para a interpretação de tais artigos, Salvador da Costa, Código das Custas Judiciais anotado e comentado, Coimbra, Almedina, 1997, p. 261 e ss.

[18]  Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro. Em bom rigor, em abono da verdade, importa referir que o regime das custas administrativas e tributárias já tinha sido introduzido no Código da Custas Judiciais (art. 73.º-A) pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro.

[19]  Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro (Ret. n.º 22/2008, de 24 de abril) e alterado pela Lei n.º 43/2008, de 27 de agosto; pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de agosto; pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril; pelo Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de abril; pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro (Retificação n.º 16/2012, de 26 de março); pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 126/2013, de 30 de agosto; pela Lei n.º 72/2014, de 2 de setembro; pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março; pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro; pela Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto; pelo Decreto-lei n.º 86/2018, de 29 de outubro; pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março; e pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.

[20] Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (na versão da Retificação n.º 42/2013, de 24 de outubro), alterada pela Lei n.º 40-A/2016, de 22 de dezembro; pela Lei n.º 94/2017, de 23 de agosto; pela Lei Orgânica n.º 4/2017, de 25 de agosto; pela Lei n.º 23/2018, de 5 de junho; pelo DL n.º 110/2018, de 10 de dezembro; pela Lei n.º 19/2019, de 19 de fevereiro; pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março; pela Lei n.º 55/2019, de 05 de agosto e pela Lei n.º 107/2019, de 9 de setembro.             

[21] A redação original foi, entretanto, alterada pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto, e pela Lei n.º 55/2017, de 17 de julho.

[22] Era a seguinte a redação do referido preceito: «7 - Das decisões proferidas nos processos por contraordenação cabe recurso para o tribunal fiscal aduaneiro territorialmente competente, segundo as regras do n.º 5».

[23] Era a seguinte a redação do referido preceito: «3 - Se o resultado obtido nos termos do artigo anterior não atingir a importância das quantias devidas, feita a distribuição da quantia que se tiver executado, será o processo remetido ao tribunal tributário de 1.ª instância competente para a realização da execução, que seguirá a forma do processo de execução fiscal previsto no Código de Processo das Contribuições e Impostos».

[24] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro e alterado pela Lei n.º 3-B/2000, de 4 de abril; pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho; pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro; pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 08 de março; pelo Decreto-Lei n.º 160/2003, de 19 de julho; pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de março; pelo Decreto-Lei n.º 238/2006, de 20 de dezembro; pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro; pela Lei n.º 40/2008, de 11 de agosto; pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril; pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 6/2013, de 17 de janeiro; pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março; pela Lei n.º 13/2016, de 23 de maio; pelo Decreto-Lei n.º 36/2016, de 1 de julho; pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 93/2017, de 1 de agosto; pela Lei n.º 100/2017, de 28 de agosto; pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março; pela Lei n.º 32/2019, de 3 de maio; pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro; pela Lei n.º 119/2019, de 18 de setembro; pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março e pela Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro.

[25] É a seguinte a redação da referida norma: «1 - As decisões de aplicação das coimas e sanções acessórias podem ser objeto de recurso para o tribunal tributário de 1.ª instância, no prazo de 30 dias após a sua notificação, a apresentar no serviço tributário onde tiver sido instaurado o processo de contraordenação».

[26] É a seguinte a redação da referida norma: «1 - As coimas aplicadas em processo de contraordenação tributário são cobradas coercivamente em processo de execução fiscal».

[27] Este diploma foi corrigido pela Ret. n.º 15/2001, de 4 de agosto e alterado pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro; Decreto-Lei n.º 229/2002, de 31 de outubro; pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 107-B/2003, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 39-A/2005, de 29 de julho; pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho; pelo Decreto-Lei n.º 307-A/2007, de 31 de agosto; pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril; pelo Decreto-Lei DL n.º 73/2010, de 21 de junho; pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro; pela Lei n.º 20/2012, de 14 de maio; pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 6/2013, de 17 de janeiro; pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 75-A/2014, de 30 de setembro; pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março; pela Lei n.º 24/2016, de 22 de agosto; pelo Decreto-Lei DL n.º 64/2016, de 11 de outubro; pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro; pelo Decreto-Lei DL n.º 93/2017, de 1 de agosto; pela Lei n.º 92/2017, de 22 de agosto; pela Lei n.º 98/2017, de 24 de agosto; pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro; pela Lei n.º 17/2019, de 14 de fevereiro; pela Lei n.º 98/2019, de 4 de setembro; pela Lei n.º 119/2019, de 18 de setembro; pela Lei n.º 58/2020, de 31 de agosto; e pela Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro.

[28] Mário Aroso de Almeida, in Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, 3, p. 144.

[29] Gomes Canotilho e Vital Moreira consideravam, então, os Tribunais Administrativos e Fiscais como uma categoria constitucional facultativa, geradora de alguma perplexidade, uma vez que ficava «dependente da lei uma categoria de tribunais que goza(va) de uma posição solidamente sedimentada no atual sistema judicial» (Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, Coimbra Editora, 1985, 2, p. 324).

[30] Alterado pela Lei n.º 4/86, de 31 de março; pela Lei n.º 46/91, de 8 de março; pela Lei n.º 11/93, de 6 de abril; pela Lei n.º 49/96, de 9 de abril; pelo Decreto-Lei n.º 229/96, de 29 de novembro; pelo Decreto-Lei n.º 301-A/99, de 5 de agosto; pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho e revogado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro (artigo 8.º, alª c). A aprovação deste estatuto revestiu-se da maior importância uma vez que, apesar daquelas hesitações constitucionais, optou por separar os tribunais que julgam a matéria administrativa e fiscal dos tribunais que julgam a matéria civil e criminal lançando as bases para a revisão Constitucional de 1989. Neste sentido, Mário Aroso de Almeida, Constituição …, p 145.

[31] Com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 229/96, de 29 de novembro, a referida norma passou a constar do artigo 62.º, n.º 1, alª o).

[32] Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de julho (na versão da ratificação n.º 200/1985, de 31 de agosto); alterado pelo Decreto-Lei n.º 4/86, de 6 de janeiro; pela Lei n.º 12/86, de 21 de maio; pelo Decreto-Lei n.º 326/89, de 26 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 229/96, de 29 de novembro; pelo Decreto-Lei n.º 231/97, de 3 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de dezembro e revogado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de fevereiro.

[33] Aprovada pelo Decreto-Lei n.º 45005, de 27 de abril de 1963 e alterado pelo Decreto-Lei n.º 45400, de 30 de novembro; pelo Decreto-Lei n.º 48699, de 23 de novembro; pelo Decreto-Lei n.º 217/76, de 25 de março; pelo Decreto-Lei n.º 434/77, de 17 de outubro; pelo Decreto-Lei n.º 500/79, de 22 de Dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 362/82, de 8 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 485/82, de 28 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 177/86, de 2 de julho; pelo Decreto-Lei n.º 414/86, de 10 de novembro e revogado pelo Decreto-Lei n.º 154/91, de 23 de abril.

[34] Neste sentido, Mário Aroso de Almeida, Constituição …, p 145.

[35] O artigo 136.º da Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de setembro, alterou a numeração deste artigo, que passou a ser o artigo 212.º, mas manteve a sua redação original.

[36] A Justiça Administrativa (Lições), Coimbra, Coimbra Editora, 2017, p. 97.

[37] José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa…, p. 98; Mário Aroso de Almeida, Constituição …, p 148/9.

[38] Ac. 607/95, de 8 de novembro.

[39] Ac. n.º 371/94, de 11 de maio e, depois, acs. n.ºs 372/94, de 11 de maio; 508/94, de 14 de julho; 610/94, de 22 de novembro; 629/94, de 22 de novembro, ou 630/94, de 22 de novembro.

[40] José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa…, p. 98 e ss.; Mário Aroso de Almeida, Constituição …, p 148/9; Diogo Freitas do Amaral/Mário Aroso de Almeida, Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo, Coimbra, Almedina, 2002, p. 23 e ss.; Paulo Castro Rangel, Repensar o Poder Judicial Fundamentos e Fragmentos, Porto, Universidade Católica Editora, 2001, p. 202 e ss.

[41] Ac. 522/2008, de 29 de outubro. Para o efeito, o referido acórdão invoca, inter alia, que «sendo inegável a natureza administrativa (no caso, em matéria ambiental) do processo de contraordenação e das situações jurídicas que lhe estão subjacentes, a verdade é que o processo contraordenacional, pelo menos na fase judicial, está gizado à imagem do processo penal (cfr. artigos 41.º e 59.º e s., maxime, 62.º e s., do RGCO, e artigo 52.º Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, que estabelece o regime aplicável às contraordenações ambientais). Neste contexto, em que coexistem matérias administrativas com modelos processuais penalistas, a “remissão” para os tribunais judiciais das impugnações judiciais no âmbito de processos de contraordenação (ambiental) não se afigura atentatória do figurino típico que a Constituição quis consagrar quanto ao âmbito material da justiça administrativa».

[42] Era a seguinte a redação da referia norma:

Artigo 237.º

Competência

1 - É competente para o processo de execução fiscal a repartição de finanças do domicílio ou sede do devedor, salvo tratando-se de coima fiscal e respetivas custas, caso em que será a repartição de finanças onde tiver corrido o processo da sua aplicação.

2 - Compete ao tribunal tributário de 1.ª instância da área onde correr a execução, depois de ouvido o Ministério Público, nos termos do n.º 2 do artigo 41.º, decidir os incidentes, os embargos, a oposição, a verificação e graduação de créditos e a anulação da venda bem como os recursos referidos no artigo 355.º

3 - Compete ainda ao tribunal tributário de 1.ª instância o conhecimento de todas as questões relativas à legitimidade dos responsáveis subsidiários, incluindo a culpa das pessoas referidas nos artigos 12.º e 13.º, devendo a prova ser feita na oposição».

[43] Ac. do Pleno da 1.ª Seção do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de junho de 2007, proferido no processo n.º 01172/06.

[44] Solução, como já se viu, depois confirmada pelo Regulamento das Custas de 2008.

[45] Ac. do Pleno da 1.ª Seção do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de junho de 2007, proferido no processo n.º 01172/06; no mesmo sentido, já havia decidido o Ac. do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 8 de junho de 2005, proferido no processo n.º 0413/05; na doutrina, sobre esta jurisprudência, cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Processo Tributário, Lisboa, Áreas Editora, 2011, 1, p. 146 e ss.

[46]  Alterou o Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o Código dos Contratos Públicos, o Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, a Lei de Participação Procedimental e de Ação Popular, o Regime Jurídico da Tutela Administrativa, a Lei de Acesso aos Documentos Administrativos e a Lei de Acesso à Informação sobre Ambiente.

[47] Embora este diploma legal seja, normalmente, apontado como uma mudança de paradigma, a verdade é que a Lei n.º 77/2013, de 21 de novembro, que cria a Comissão para o Acompanhamento dos Auxiliares da Justiça já tinha antes caminhado no mesmo sentido, dispondo que «Das sanções disciplinares e das contraordenações aplicadas pela CAAJ aos auxiliares da justiça cabe recurso para os tribunais administrativos competentes, a instaurar no prazo de 20 dias contados da data de notificação da decisão que as aplica» (art. 8.º, n.º 2). A Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, que assegura a execução, na ordem jurídica nacional, do Regulamento (UE)2016/679 do Parlamento e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados seguiu a mesma lógica, remetendo a impugnação das decisões, proferidas pela Comissão Nacional de Proteção de Dados em processo de contraordenação, para os tribunais administrativos (art. 34.º, n.º s 1 e 2).

[48] Ac. do Tribunal de Conflitos, de 11 de janeiro de 2018, proferido no processo n.º 60/2017.

[49] Ac. de 8 de fevereiro 2018, proferido no processo n.º 66/17. Embora inicialmente tenha decidido em sentido contrário, em virtude destas decisões, o TCAS passou também a decidir no mesmo sentido. É o caso dos acs. de 15-02-2018, proferido no processo n.º 783/17.9BESNT; de 19 de abril de 2018, proferido no processo n.º 368/17.0BESNT, ou de 14 de junho de 2018, proferido no do processo n.º 1190/17.9BESNT. 

[50] O próprio legislador acabou por «intervir no conflito», uma vez que introduziu o atual artigo 98.º, n.º 12, do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, que, depois das alterações concretizadas pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, passou a ter a seguinte redação: «Após o decurso dos prazos do recurso de impugnação judicial e de pagamento voluntário da coima, segue-se o regime de execução de obrigações pecuniárias, previsto no artigo 179.º do Código de Procedimento Administrativo.»

[51] Era a seguinte a redação daquele artigo:

«Artigo 57.º

Legitimidade do Ministério Público como exequente

Compete ao Ministério Público promover a execução por custas e multas judiciais impostas em qualquer processo».

[52] Assim, em vez de afirmar que: «compete ao Ministério Público promover a execução das penas e das medidas de segurança e, bem assim, a execução por custas, indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar judicialmente» este artigo passou a referir que: «compete ao Ministério Público promover a execução das penas e das medidas de segurança e, bem assim, a execução por indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar judicialmente».

[53] Assim, em vez de afirmar que: «tendo o condenado bens suficientes e desembaraçados de que o tribunal tenha conhecimento ou que ele indique no prazo de pagamento, o Ministério Público promove logo a execução, que segue os termos da execução por custas» esta norma passou a referir que «tendo o condenado bens penhoráveis suficientes de que o tribunal tenha conhecimento ou que ele indique no prazo de pagamento, o Ministério Público promove logo a execução, que segue as disposições previstas no Código de Processo Civil para a execução por indemnizações».

[54] Aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro; alterada pela Lei n.º 33/2010, de 2 de setembro; pela Lei n.º 40/2010, de 3 de setembro; pela Lei n.º 21/2013, de 21 de fevereiro; pela Lei n.º 94/2017, de 23 de agosto; e pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março.    

[55] Assim, em vez de ser «execução por multas, custas e indemnizações» a epígrafe passou a ser «Execução por multas penais e indemnizações» e o corpo do artigo em vez de ser «a execução das decisões relativas a multas, custas e indemnizações previstas na lei processual aplicável compete ao juízo ou tribunal que as tenha proferido», passou a ser: «a execução das decisões relativas a multas penais e indemnizações previstas na lei processual aplicável compete ao juízo ou tribunal que as tenha proferido».

[56] Este parecer pode ser consultado em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/

Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=43085. Apesar de louvar a ideia fundamental da Proposta de Lei, este parecer não deixou de criticar a atribuição à Administração Tributária da competência para a execução de multas criminais, que poderia suscitar algumas reservas quanto à sua verdadeira natureza jurídica e à efetiva salvaguarda dos direitos de defesa.

[57] Este parecer pode ser consultado em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/

Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=43085.

[58] Este parecer pode ser consultado em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/

Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=43085.

[59] Cfr. o art. 1.º da referida proposta.

[60] Diário da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 16.

[61] Era a seguinte a redação inicial do projeto:

«Artigo 1.º

1 - A presente lei procede à aplicação do processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas, multas, coimas e outras quantias cobradas em processo judicial, e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou multas».

[62] Era a seguinte a redação inicial do projeto:

«Artigo 2.º

Alteração ao Código de Procedimento e de Processo Tributário

O artigo 148.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 148.º

[…]

1 -[…]:

a) […];

b) [Revogada];

c) […].

2 -[…]:

a) […];

b) […];

c) Custas, multas, coimas e outras quantias cobradas em processo judicial, e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões administrativas, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações ou multas».

[63] Era a seguinte a redação inicial do projeto:

Artigo 3.º

Alteração ao Regulamento das Custas Processuais

Os artigos 26.º e 35.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

(…)

Artigo 35.º

[…]

1 -Compete à Autoridade Tributária e Aduaneira, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover a cobrança coerciva das custas, multas, coimas ou de outras quantias cobradas de acordo com os artigos anteriores, e dos juros de mora devidos».

[64] Cuja redação é a seguinte:

«1 - O processo de execução fiscal abrange a cobrança coerciva das seguintes dívidas:

(…)

b) Coimas e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações tributárias, salvo quando aplicadas pelos tribunais comuns.

[65] Esta proposta de alteração pode ser consultada em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=43085.

[66] Diário da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 18.

[67] Diário da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 19.

[68] Diário da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 20/21.

[69] Diário da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 21/22.

[70] Submetida à votação na generalidade, esta proposta de Lei «foi aprovada, com votos a favor do PS, do PAN e do Deputado não inscrito Paulo Trigo Pereira, votos contra do PCP e de Os Verdes e abstenções do PSD, do BE e do CDS-PP (Diário da Assembleia da República I série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 48).

[71] Conforme consta do Diário da Assembleia da República (I Série -A – número 57, de 7 de fevereiro de 2019, p. 123/4), a votação na especialidade teve o seguinte resultado: «n.º 1 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (constante do artigo 5.º-A/renumerado como artigo 8.º) – aprovado, com votos a favor do PS e do BE, votos contra do PCP e abstenções do PSD e do CDS-PP. Demais artigos da proposta de lei (na redação das propostas de alteração apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PS, com as alterações introduzidas oralmente no que se refere ao artigo 35.º do Regulamento das Custas Processuais (n.ºs 1, 2 e 3), conforme a redação proposta pelo Grupo Parlamentar do PSD – aprovados, com votos a favor do PSD, do PS e do BE, votos contra do PCP e a abstenção do CDS-PP). Proposta de alteração do Grupo Parlamentar do PS ao artigo 5.º da PPL (renumerado como art. 7.º), referente ao artigo 469.º do Código de Processo Penal – aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do BE, votos contra do PCP e a abstenção do CDS-PP).

[72] Diário da Assembleia da República I Série, número 35, de 5 de janeiro de 2019, p. 22/23.

[73] A doutrina portuguesa tem debatido a verdadeira natureza do direito de mera ordenação social, oscilando entre uma natureza administrativa (Tiago Lopes de Azevedo, Lições de direito …, p. 34; Augusto Silva Dias, Direito das…., p. 41) e a sua classificação, à semelhança da doutrina e da jurisprudência alemãs, como direito penal em sentido amplo [José de Faria Costa, Noções Fundamentais de Direito Penal (framenta iuris poenalis): Introdução, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 29 e 46; Alexandra Vilela, O Direito…, p. 157 e ss., 251 e 349 e ss.; Nuno Brandão, Crimes…, p. 863 e ss. 

[74] Como referiu este Conselho, no Parecer n.º 17/2020 de 10 de setembro de 2020, «constituindo o tipo de sanção um elemento identitário das contraordenações, ela assume o papel de mera admonição, como especial advertência ou reprimenda, relacionada com a observância de certas proibições ou imposições legislativas  (…), tendo em vista finalidades distintas das sanções penais, conforme se evidencia da leitura do artigo 18.º, n.º 1, do RGCO - as finalidades da coima são em larga medida estranhas a sentidos positivos de prevenção  (…) -, considerando-se que poderá assumir especial relevância uma finalidade de prevenção geral e especial negativa (…). Na verdade, a admonição que preside à aplicação da coima, desprovida de qualquer sentido ético, tem, em muitos casos, um efeito intimidatório sobre toda a comunidade e sobre o próprio agente, atuando como um desincentivo à prática de novas infrações».

[75] O mesmo sucede, como já se viu (supra 3.3.), apesar da letra da lei, com as coimas aplicadas no âmbito do ilícito de mera ordenação social em matéria de urbanismo e irá suceder, no futuro, como já iremos ver, nos termos do artigo 64.º do Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de janeiro, que aprova o Regime Jurídico das Contraordenações Económicas.

[76] Para além de não respeitar aquela progressiva passagem do ilícito de mera ordenação social para a jurisdição administrativa, esta solução tem a consequência perversa de gerar duas execuções: uma nos tribunais comuns para cobrança das coimas; outra nas execuções fiscais para cobrança das custas. Em vez da poupança de meios e da eficiência poderá, assim, representar uma estranha duplicação de esforços, que deveria ser repensada pelo legislador.

[77] Na velha definição deste Conselho (Parecer n.º 184/80, de 18 de dezembro, BMJ, 1981, 306, p. 141) as taxas são: «o preço autoritariamente estabelecido, pago pela utilização individual de bens semipúblicos, tendo a sua contrapartida numa atividade do Estado ou de outro ente público, especialmente dirigida ao obrigado ao pagamento». Da mesma forma, nos termos do artigo 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária (aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, que, entretanto, sofreu inúmeras alterações): «2 - As taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares».

[78] Salvador da Costa, Código…, 1997, p. 30. O artigo 1.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 44329, de 8 de maio de 1962, ainda reputava a atual taxa de justiça, imposto de justiça. Esta denominação foi, todavia, alterada pelo Decreto-Lei n.º 387-D/87, de 29 de dezembro, uma vez que, efetivamente, está em causa uma taxa e não um imposto. Neste sentido, António L. de Sousa Franco, Finanças Públicas e Direito Financeiro, Coimbra, Almedina, 2012, 2, p. 64; Salvador da Costa, Código…, 1990, p. 15; J. Teixeira Ribeiro, Noção jurídica de taxa Revista de Legislação e de Jurisprudência1985,117, p. 291; António Braz Teixeira, Princípios de Direito Fiscal, Coimbra, Almedina, 1985, I, p. 43 e ss.; Vítor António Duarte Faveiro, Noções Fundamentais de Direito Fiscal Português, Coimbra, Coimbra Editora, 1984, I, p. 49 e ss.; Nuno Sá Gomes, Lições de Direito Fiscal, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal1984, 133, p. 84 e ss.; Carlos Pamplona Corte-Real, Curso de Direito Fiscal, Cader­nos de Ciência e Técnica Fiscal, 1981, 124, p. 162 e ss. ou Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, Lisboa (s.n.) 1974,I, p. 49. Neste Conselho, cfr. o Parecer n.º 18/2010, de 1 de julho de 2010; na jurisprudência ac. do TC n.º 412/89, de 31 de maio.

[79] Noções Fundamentais…, p. 49/50.

[80] Lições…, p. 86; no mesmo sentido, J. Teixeira Ribeiro, «Noção…, p. 291; Carlos Pamplona Corte-Real, Curso…, p. 163; António L. de Sousa Franco, Finanças Públicas…, p. 64.

[81] É a seguinte a redação do preceito: «1 - Aos serviços da administração tributária cabe: (…) g) Cobrar as custas dos processos e dar-lhes o destino legal».

[82] Alberto Xavier (Manual…, p. 49) defende que «os encargos não têm caráter tributário, antes são simples reembolsos de despesas efetuadas pelos serviços».

[83] Recenseada supra, 1 e ss.

[84] Artigo 179.º do Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro e alterado pela Lei n.º 72/2020, de 16 de novembro.

[85] Art. 22.º, n.ºs 1, al.ª b), 3 e 3, do Decreto-Lei n.º 191/99, de 5 de junho, que aprova o regime da tesouraria do Estado; na doutrina, sobre estas duas possibilidades, cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento…, 3, p. 31 e ss.

[86] Supra, 3.1. Na doutrina, sobre esta possibilidade, cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento…, 3, p. 28 e ss. Como refere Carlos Paiva, embora tenha nos tributos o seu objeto essencial, a execução fiscal tem um âmbito relativamente abrangente (Processo de Execução Fiscal, Coimbra, Almedina, 2016, p. 136).

[87] Supra 4.

[88] É a seguinte a redação da referida norma:

«2 - A execução é promovida pelo representante do Ministério Público junto do tribunal competente, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no Código de Processo Penal sobre a execução da multa».

[89] Naquilo que ora nos interessa é a seguinte a redação da referida norma:

«1 - Compete aos juízos do trabalho conhecer, em matéria cível:

(…)

m) Das execuções fundadas nas suas decisões ou noutros títulos executivos, ressalvada a competência atribuída a outros tribunais».

[90] Atento o expediente anexo os partidários da tese a manutenção das competências executivas do Ministério Público apoiam-se, justamente, nestas normas.

[91] Supra, 4.1.

[92] Nos termos do artigo 183.º, este diploma entrará em vigor 180 dias após a sua publicação.

[93] O legislador (agora com outra composição politica) não foi sensível à ideia de, progressivamente, integrar no âmbito da jurisdição administrativa, à medida que a sua reforma seja executada, a impugnação das decisões da Administração Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social, consagrada no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro.

[94] Neste sentido, Tiago Lopes de Azevedo, Lições de direito …, p. 57; Augusto Silva Dias, Direito das…., p. 194.

[95] Para a interpretação deste artigo, por último, Tiago Caiado Milheiro, AA.VV. Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Coimbra, Almedina, 2019, 1, p. 93 e ss.

[96] A já referida divergência relativa à verdadeira natureza do direito de mera ordenação social não impede a doutrina de reconhecer, una voce, a sua autonomia.

[97] Tiago Lopes de Azevedo, Lições de direito …, p. 57; na jurisprudência cfr. o ac. do STJ n.º 1/2009, de 4 de dezembro de 2008, segundo o qual «havendo norma expressa no diploma legal de que se ocupa, não é lícito ao aplicador lançar mão de direito subsidiário de tal diploma. O direito subsidiário destina -se, como é sabido, a regular os aspetos deixados sem previsão legal no diploma em causa, dela carecendo, e não para se sobrepor às disposições da lei a que é subsidiariamente aplicável».

[98] Neste sentido, já João Conde Correia, AA.VV. Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Coimbra, Almedina, 2019, 1, p. 1281.

[99] Para este artigo, Paulo Dá Mesquita, AA.VV. Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Coimbra, Almedina, 2021, 3, p. 913 e ss. (em curso de publicação).

[100] Para este artigo, António Gama, AA.VV. Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Coimbra, Almedina, 2021, 3, p. 743 e ss. (em curso de publicação).

[101] Para a sua aplicabilidade no processo penal, Acs. do STJ: de 12 de março de 2009, proferido no processo n.º 08P3168; de 13 de janeiro de 2011, proferido no processo n.º 3/09.0YGLSB.S1; ou de 11 de fevereiro de 2016, proferido no processo n.º 15/14.1UGLSB.S2.

[102] «Para uma reforma global do processo penal português: da sua necessidade e de algumas orientações fundamentais», AA.VV, Para uma nova justiça penal, Coimbra, Almedina, 1996, p. 222.

[103] Para o caráter inovador desta norma, cfr. Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, Coimbra, Coimbra Editora, 1945, 2, p. 32 e ss.

[104] Manuel A. Domingues de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, Coimbra Editora, 1979, p.




segunda-feira, 1 de março de 2021

Cessação do vínculo Laboral. Execução da sanção disciplinar. Administração Pública

 

O art. 176.º da LTFP na redação original ao contrário do regime revogado impossibilitava a aplicação de sanções disciplinares em caso da cessação de vínculo laboral, designadamente, o de natureza  precário – a termo resolutivo.

 

O DL n.º 6/2019 com entrada em vigor a 01/02/2019 veio alterar a redação do art. 176.º da LTFP, o que permite, que as sanções disciplinares resultantes de infrações praticadas antes da extinção do vínculo sejam executadas se e quando o trabalhador constituir um novo vínculo de emprego público.

É o que resulta do n.º 4 e 5 do citado artigo:

 «4 - A cessação do vínculo de emprego público ou a alteração da situação jurídico-funcional do trabalhador não impedem a punição por infrações cometidas no exercício da função.

5 - Em caso de cessação do vínculo de emprego público, o procedimento disciplinar ou a execução de qualquer das sanções previstas nas alíneas b) a d) do n.º 1 do artigo 180.º suspende-se por um período máximo de 18 meses, podendo prosseguir caso o trabalhador constitua novo vínculo de emprego público para as mesmas funções a que o procedimento disciplinar diz respeito e desde que do seu início, ressalvado o tempo de suspensão, não decorram mais de 18 meses até à notificação ao trabalhador da decisão final».

Ou seja, a cessação do vínculo laboral ou a alteração da situação jurídico-funcional não impede a aplicação da sanção por infração cometida por trabalhador em funções públicas com a exclusão da sanções de repreensão escrita (al. a) do n.º 1 do art. 180.º.

De salientar que a execução do processo disciplinar ou a execução das sanções estão limitadas no tempo. A suspensão limita-se a 18 meses.

Note-se que, estas alterações apenas se aplicam aos processos instaurados após a entrada em vigor do DL n.º 6/2019, ou seja, processos instaurados a partir de 01/02/2019.

 

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sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Doença profissional. COVID-19. Profissionais de saúde


O art. 20.º - A aditado pelo DL n.º 106-A/2020 ao DL n.º 10-A/2020, de 13/03 regula aspetos da “Doença Profissional” neste contexto de pandemia.

Dispensa de prova

Os trabalhadores (enfermeiros; técnicos de emergência médica pré-hospitalar; trabalhadores civis do HFAR; profissionais dos serviços médico-legais do INMLCF, I. P.; trabalhadores das unidades e serviços de saúde prisionais da DGRSP) doentes com COVID-19 dos serviços e estabelecimentos do SNS,, independentemente da natureza jurídica do vínculo laboral que tenham praticado atos diretamente relacionados com pessoas suspeitas e doentes infetados por SARS-CoV-2, quer enquanto prestadores diretos de cuidados, quer como prestadores de atividades de suporte, nas áreas dedicadas à COVID-19 dos estabelecimentos e serviços de saúde, definidos como unidades de referência de primeira e segunda linha para admissão de pessoas suspeitas ou infetadas por SARS-CoV-2, nas áreas dedicadas à COVID-19 estão dispensados de fazer prova de que a doença COVID-19 é uma consequência direta da atividade exercida e que não representa normal desgaste do organismo os trabalhadores doentes com COVID-19 dos serviços e estabelecimentos do SNS.

Reconhecimento da doença

O reconhecimento da situação de doença profissional exige a intervenção do interessado junto da Segurança Social através de um requerimento acompanhado: Certificado de incapacidade temporária para o trabalho indicando doença profissional; Modelo de participação obrigatória de doença profissional; e, Declaração da entidade empregadora comprovativa da situação profissional do trabalhador, (referência ao exercício de funções enquanto prestador direto de cuidados de saúde ou, sendo o caso, de atividades de suporte a tais cuidados no âmbito da doença COVID-19, entre outras).

Reparação de doença profissional

Certificada a situação de doença a reparação tem por referencia a remuneração líquida corresponde ao montante da retribuição de referência apurada nos termos do artigo 111.º da L n.º 89/2009 subtraídas as taxas contributiva e de retenção do IRS.

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Obrigatoriedade do desfasamento de horário laboral. Contexto COVID

 

O DL n.º 79 – A/2020 com a nova redação prevista pelo DL n.º 106.º-A72020 prevê a obrigatoriedade do desfasamento de horário de entrada e saída dos locais de trabalho com a garantia de intervalos mínimos de 30 minutos até ao limite de uma hora entre grupos de trabalho com 50 ou mais trabalhadores, nas áreas territoriais em que a situação epidemiológica o justifique, definidas pelo Governo mediante resolução do Conselho de Ministros, bem como nos concelhos considerados pela Direção-Geral da Saúde (DGS) como sendo de risco elevado, muito elevado e extremo, conforme declarados pelo Governo mediante decreto que regulamente a declaração do estado de emergência, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.

O empregador pode alterar de forma unilateral os horários até ao limite máximo de uma hora, salvo se tal alteração causar prejuízo sério ao trabalhador. O prejuízo sério ao trabalhador traduz-se por exemplo: a inexistência de transporte coletivo de passageiros que permita cumprir o horário de trabalho em razão do desfasamento e a necessidade de prestação de assistência inadiável e imprescindível à família.

Sem prejuízo da consulta prévia aos trabalhadores envolvidos, à comissão de trabalhadores ou à comissão sindical ou aos delegados sindicais, o empregador deve comunicar ao trabalhador a alteração efetuada com antecedência mínima de cinco dias relativamente ao início da sua aplicação (num contexto normal a antecedência seria de 7 dias ou 3 dias para as microempresas – n.º 2 do art. 217.º do CT/2009).

Estão dispensados dos desfasamentos de horários: trabalhadora grávida, puérpera ou lactante, o trabalhador menor, o trabalhador com capacidade de trabalho reduzida, com deficiência ou doença crónica e os trabalhadores com menores de 12 anos a seu cargo, ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica

Os limites ao desfasamento de horário: o empregador não pode efetuar mais de uma alteração por semana; e, alteração do horário de trabalho realizada não pode implicar a alteração dos limites máximos do período normal de trabalho, diário e semanal, nem a alteração da modalidade de trabalho de diurno para noturno ou vice-versa.

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quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Prazos processuais no Direito Penal

 

Os atos processuais praticam-se nos dias úteis, às horas do expediente dos serviços de justiça e fora do período de férias judiciais sem prejuízo das 8 exceções previstas na lei:

Os atos processuais relativos a arguidos detidos ou presos, ou indispensáveis à garantia da liberdade das pessoas;


b) Os atos relativos a processos em que intervenham arguidos menores, ainda que não haja arguidos presos;


c) Os actos de inquérito e de instrução, bem como os debates instrutórios e audiências relativamente aos quais for reconhecida, por despacho de quem a elas presidir, vantagem em que o seu início, prosseguimento ou conclusão ocorra sem aquelas limitações;

d) Os actos relativos a processos sumários e abreviados, até à sentença em primeira instância;
e) Os actos processuais relativos aos conflitos de competência, requerimentos de recusa e pedidos de escusa;


f) Os actos relativos à concessão da liberdade condicional, quando se encontrar cumprida a parte da pena necessária à sua aplicação;


g) Os actos de mero expediente, bem como as decisões das autoridades judiciárias, sempre que necessário.
h) Os atos considerados urgentes em legislação especial.


Em regra fundamental nesta matéria é de que em sede de processo penal é que o interrogatório do arguido não pode ser efetuado entre as 0 e as 7 horas, salvo em ato seguido à detenção, nos casos alínea a) do n.º 5 do artigo 174.º ou quando o próprio arguido o solicite.

Ainda em sede do interrogatório, o mesmo não pode ter duração superior a 4 horas, podendo ser retomado, em cada dia, por uma só vez e idêntico prazo máximo, após um intervalo mínimo de sessenta minutos.

Não podem ser utilizadas como prova, as declarações prestadas para além do limite das 4 horas.


As regras da contagem dos prazo sem processo penal são as mesmas que em processo civil, nos termos do n.º1 do art. 1003.º do CPP.

Há processos em que os prazos correm em férias. São exemplo:

a)       Os actos processuais relativos a arguidos detidos ou presos, ou indispensáveis à garantia da liberdade das pessoas;

b)       Os atos relativos a processos em que intervenham arguidos menores, ainda que não haja arguidos presos;

c)       Os actos de inquérito e de instrução, bem como os debates instrutórios e audiências relativamente aos quais for reconhecida, por despacho de quem a elas presidir, vantagem em que o seu início, prosseguimento ou conclusão ocorra sem aquelas limitações;

d)       Os actos relativos a processos sumários e abreviados, até à sentença em primeira instância;

e)        Os actos processuais relativos aos conflitos de competência, requerimentos de recusa e pedidos de escusa;

f)        Os processos por crime de violência domestica por força da remissão do n.º 2 do art. 28.º da L n.º 112/2009, de 16/09. (Os processos relativos a crimes de violência doméstica assumem, todos eles, natureza urgente, independentemente de haver arguidos á sua ordem sujeitos a medidas de coação privativas de liberdade, e os prazos, que lhes dizem respeito, correm durante as férias judiciais).

 

O prazo geral para a pratica de qualquer ato processual é de 10 dias salvo quando a lei expressamente determinar em sentido contrário.

Os despachos e promoções de mero expediente devem ser proferidos no prazo máximo de 2 dias.

Com particular interesse, o Ac. STJ n.º 5/2012, de 21/05/2012, que fixou jurisprudência no sentido de que o Ministério Público, em processo  penal, pode praticar ato processual nos três dias úteis seguintes ao termo do respectivo prazo, ao abrigo do disposto no artigo 145.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, sem pagar multa ou emitir declaração a manifestar a intenção de praticar o acto naquele prazo. No mesmo sentido o Ac. STJ de 4/2020, de 18/05.

Os termos do processo e a passagem dos mandados devem ser efetuados no prazo de 2 dias, salvo, se a lei indicar expressamente prazo diferente ou no caso de haver arguidos detidos ou presos e o prazo ali fixado afetar o tempo de privação da liberdade; neste último caso os actos são praticados imediatamente e com preferência sobre qualquer outro serviço.

A prática extemporânea de atos processuais, nos termos legais, implica o pagamento de uma verba pecuniária que varia de acordo com o momento em que se pratica o ato processual, a saber:

 

Ato praticado no 1.º dia multa de 0,5 UC = 51.00 €;

Ato praticado no 2.º dia com multa a 1 UC = 102.00 €;

Ato praticado no 3.º dia de multa a 2 UC = 204 €

A UC mantem o mesmo valor do que em 2020, ao abrigo do art. 232.º da L n.º 75-B/2020 (LOE/2021).


Formação modular em Processo Penal.

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regime sancionatório

 

O DL n.º 28-B/2020 veio a estabelecer o regime sancionatório aplicável às situações de incumprimento previstas na regulamentação da situação de alerta, contingência e calamidade, declaradas ao abrigo da Lei de Bases da Proteção Civil, assim como do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, na sua redação atual.

A determinação de sanções administrativas encontra-se conexa com o incumprimento de regras de comportamento aprovadas por lei ou habilitadas por lei, prevista no artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, na sua redação atual, por força do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na sua redação atual, e, bem assim, nos artigos 13.º-A e 13.º-B do mesmo decreto-lei.

De acordo com o art. 3.º as coimas para as pessoas singulares situam-se entre (euro) 100,00 a (euro) 500,00 no caso de pessoas singulares, e de (euro) 1000,00 a (euro) 5000,00 no caso de pessoas coletivas.

De salientar que este regime sancionatório abrange a forma negligente em que a sanção será em 50%.

Se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contraordenação, o infrator sujeita-se a ser punido a título de crime, sem prejuízo da aplicação das sanções acessórias previstas para a contraordenação, sem prejuízo da responsabilidade civil do infrator.

 

Procedimento concursal. Carreira de especialista de polícia científica da Polícia Judiciaria Aviso n.º 1185/2021

 

Procedimento concursal. Carreira de especialista de polícia científica da Polícia Judiciaria

Aviso n.º 1185/2021

Prepare-se para o concurso através de aulas personalizadas online estruturadas em módulos com componente teórico-práticas com disponibilização de matéria de apoio.

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O procedimento concursal exige prova de conhecimentos em diversas matérias, designadamente, o conhecimento de várias áreas temáticas, a saber:

1.        Organização política e administrativa do Estado.

2.       Estrutura organizacional da Polícia Judiciária

3.       Estatuto Profissional do Pessoal da Polícia Judiciária

4.       Processo Penal:

4.1.   Da forma dos atos e da sua documentação

4.2.   Da prova - Disposições gerais

4.3.   Da prova pericial

4.4.   Dos exames

4.5.   Das revistas e buscas

4.6.   Das apreensões.

5.       Além de temas relacionados com medidas cautelares e de polícia no processo criminal os candidatos tem que ter conhecimento de alguns normativos constitucionais a par do conhecimento da legislação laboral de natureza pública e privada (Código do Trabalho e LGTFP).

 


 

 

 

 

 

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Processos disciplinares na Administração Pública - Formação profissional

 

Formação e-Learning com componente teoria e Pratica. Analise de  jurisprudência mais recente.

Horário Pós-Laboral

Estrutura modelar  ou modulo único para esclarecimento de dúvidas pontuais. 

Inicio a 15 de novembro  de  de 2021.

 

Processos disciplinares no setor privado (Código do Trabalho) 


Formação e-Learning com componente teoria e Pratica. Analise de  jurisprudência mais recente.

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Inicio a 15 de novembro  de 2021.


Inscrição - Preencha o formulário.  

domingo, 1 de novembro de 2020

Personalidade jurídica. Direitos de personalidade gozam de proteção para além da morte

 Relembrar um homicídio (relato em livro) consubstancia ofensa à honra e bom nome do homicida /falecido?


O n.º 1 do art. 66.º articulado com o n.º 1 do art. 68.º, ambos do Código Civil dispõem que a personalidade jurídica é adquirida com o nascimento completo e com vida e cessa com a morte.

 

Por sua vez, o n.º 1 do art. 71.º determina que os direitos de personalidade gozam ainda de proteção após a morte do seu titular.

 

Assim, de acordo com os normativos do Código Civil ainda que a personalidade cesse com a morte do titular dos direitos, alguns direitos de personalidade – ofensa ilícita e ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral tem a tutela do Direito.

 

A lei visa a proteção das pessoas falecidas contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à respetiva personalidade, física ou moral, em vida e após morte.

 

O direito ao bom nome tem consagração na Lei Fundamental – no capítulo dos direitos, liberdades e garantias, constam: a proteção à cidadania; ao bom nome e reputação; à imagem; à palavra; à reserva da intimidade da vida privada e familiar - art.º 26.º, n.º 1.

 

Por sua vez, o artº 12.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aplicável por força do disposto no artº 8º da CRP, determina que, «ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da lei».

 

Por outro lado, a publicação em livro a relatar o evento (homicídio) encontra igualmente tutela constitucional na liberdade de expressão e informação, prevista genericamente no art.º 37.º da CRP e na específica liberdade de criação cultural e artística, prevista no art.º 42.º da CRP.

 

Também o art.º 19.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece que «todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão».



 

Já o art. 10.º, n.º 1, 1ª parte, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) determina que «qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações ou ideias sem que possa haver ingerência de quaisquer autoridades públicas e sem considerações de fronteiras», sem prejuízo de algumas restrições.


A CEDH prevê-as no art.º 10.º, n.º 2, «o exercício desta liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas pela lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a proteção da saúde ou da moral, a proteção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e a imparcialidade do poder judicial».


No que respeita aos direitos fundamentais, haverá colisão ou conflito sempre que se deva entender que a Constituição protege simultaneamente dois valores ou bens em contradição numa determinada situação concreta (real ou hipotética).

 

Tem sido entendimento que no confronto do direito à honra com o direito de liberdade de expressão, exercido através da imprensa (ou publicação de um livro) se há um qualquer interesse público a prosseguir, haverá eventualmente que privilegiar o direito à informação e a liberdade de expressão em detrimento de outros direitos individuais.

 

Também é entendimento que, «a liberdade de imprensa deva respeitar, no seu exercício, o direito fundamental do bom nome e da reputação, o jornalista não está impedido de noticiar factos verdadeiros ou que tenha como verdadeiros em séria convicção, desde que justificados pelo interesse público na sua divulgação, podendo este direito prevalecer sobre aquele, desde que adequadamente exercido, nomeadamente mediante exercício de um esforço de objetividade com recurso a fontes de informação fidedignas por forma a testar e controlar a veracidade dos factos».


Se o autor na descrição do homicídio o descreve de forma objetiva retratando as circunstância de modo, tempo e lugar não há como dizer que a retratação tenha atingido o bom nome da pessoa falecida e por conseguinte tenha havido um ilícito suscetível de ser indemnizável nos termos da lei civil.

 

Liberdade de expressão, Direito de personalidade, tutela do direito à honra, ofensa à memória de falecido, Ac. TR Guimarães de 22/10/2020.

 Tem dúvidas sobre questões de Direito Penal?

Solicite esclarecimentos preenchendo o formulário.

Plano de explicações estruturado em módulos ou questões pontuais. 

 

 

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Dever de Decidir. Deferimento tácito. Administração pública

Um dos grandes princípios da Administração Pública é o Dever de Decidir – Principio da Decisão, previsto no n.º 1 do art. 13.º do CPA.

Este dever enuncia a obrigação da Administração Pública tomar uma posição face as questões que sejam apresentadas aos seus órgãos e serviços.
Quer isto dizer que, a Administração está vinculada a uma resposta quando lhe seja apresentada: petição, reclamação, queixas, impugnações.
 Este dever mantém-se mesmo que a questão apresentada tenha sido para órgão ou serviço incompetente na matéria, impondo-se a este a enviar para órgão ou serviço competente n.º 1 do art. 41.º do CPA).
O princípio do dever de decidir tem uma exceção. Não há o dever de decidir quando a Administração tenha praticado o ato administrativo sobre o mesmo pedido, formulado pelo mesmo particular com os mesmos fundamentos, há pelo menos dois anos, a contar da data da apresentação do requerimento (n.º 2 do art. 13.º do CPA).
Aqui chegados, e tendo como foco o instituto do deferimento tácito, é importante aferir os prazos para a decisão da Administração Pública.
 O n.º 1 do art. 128.º do CPA estabelece o prazo-regra de 90 dias. Este prazo pode ser prorrogado por 90 dias desde que fundamentado em circunstancias excecionais ou em alguns procedimentos específicos ser mais curto (n.º 2 do art. 128.º do CPA).
Em matérias de prazos é ainda importante reter que nos casos de procedimentos de natureza oficiosa em que a decisão possa ser desfavorável ao interessado, os mesmos caducam no prazo de 180 dias (n.º 6 do art. 128.º do CPA).
 No que respeita a contagem dos prazos deve observar-se o previsto no art. 87.º do CPA, sem prejuízo da dilação, (art. 88.º)  a saber:
a)         O prazo começa a correr independentemente de quaisquer formalidades;
b) Não se inclui na contagem o dia em que ocorra o evento a partir do qual o prazo começa a correr;
c) O prazo fixado suspende-se nos sábados, domingos e feriados;
d) Na contagem dos prazos legalmente fixados em mais de seis meses, incluem-se os sábados, domingos e feriados;
e) É havido como prazo de um ou dois dias o designado, respetivamente, por 24 ou 48 horas;
f) O termo do prazo que coincida com dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o ato não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte;
g) Considera-se que o serviço não está aberto ao público quando for concedida tolerância de ponto, total ou parcial.
Considerando o dever de decidir nos prazos previstos na lei quando a Administração Pública não obedece a imposição legal estamos perante uma omissão do deve de decidir. A inercia da Administração pode significar uma de duas situações: há incumprimento do dever de decidir; ou, ao silêncio dá-se o valor jurídico de deferimento tácito. 
O deferimento tácito é um instituto jurídico que está previsto no n.º 1 do art. 130.º do CPA. E o silêncio só tem significado jurídico quando existe legislação que confira esse valor. Não havendo lei que determine o deferimento tácito há incumprimento da Administração Pública.
Os interessados têm formas de reagir no caso de incumprimento da Administração. Na ausência de decisão final pode o particular recorrer aos meios de tutela administrativa ou judicial, tal como, podem reagir quando está perante o deferimento tácito.
Sobre a possibilidade de recorrer aos meios de tutela no caso de deferimento tácito a doutrina diverge, por exemplo:
- Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos defendem que o interessado pode na mesma (…) «pedira condenação da Administração à emissão do ato administrativo ilegalmente omitido, de modo a obter uma tutela plena da sua situação jurídica».
- Sérvulo Correia  e João Tiago Silveira refendem que (…) «havendo deferimento tácito, o ato já existe: os seus efeitos típicos encontram-se desde logo constituídos na esfera do interessado. Uma ação de condenação à prática de ato administrativo com o mesmo conteúdo enfermaria de possibilidade do objeto».
-  Vasco Pereira da Silva contesta que o deferimento tácito dê origem a um ato administrativo.
 Deve salientar-se que o ato tácito da comunicação prévia prevista no n.º 3 doa rt. 134.º do CPA em que, a ausência de pronúncia do órgão competente não dá origem a um ato de deferimento tácito, mas habilita o interessado a desenvolver a atividade pretendida, sem prejuízo dos poderes de fiscalização da Administração e da possibilidade de esta utilizar os meios adequados à defesa da legalidade, sendo uma alternativa à atribuição de um valor positivo ao silencio da Administração.
Note-se que, o ato tácito da comunicação prévia implica a responsabilidade exclusiva do particular, se for o caso.
Em fase de conclusão, deixa-se claro que a lei restringe as situações em que é possível deferimento tácito impondo que nesses casos exista referencia expressa naquele sentido.
O que se compreende, pois a ser em sentido contrario a Administração sempre correria o risco de aceitar, por diversos motivos, designadamente, pela sua inercia, situações solicitadas pelos particulares que poderiam ir contra os interesse público.
Para maior desenvolvimento nesta matéria ver:
Carla Amado Gomes / Ana Fernanda Neves / Tiago Serrão, in Comentários ao Novo Código do Procedimento Administrativo.
Diogo Freitas Do Amaral, in Curso de Direito Administrativo, Tomo II.
Marcelo Rebelo de Sousa / André Salgado De Matos, in Direito Administrativo Geral, Tomo III.