domingo, 8 de maio de 2011

Direito à greve – serviços mínimos obrigatórios

O n.º 1 do art. 57.º da Constituição da República Portuguesa, dispõe que «É garantido o direito à greve».

Segall, 1956

O n.º 1 do art. 57.º da Constituição da república Portuguesa, dispõe que «É garantido o direito à greve».
Acresce o n.º 3 do mesmo artigo que «a lei define as condições de prestação, durante a greve, de serviços mínimos necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis».
Ainda que constitucionalmente consagrado, o direito à greve, não é  um direito absoluto, podendo sofrer determinadas restrições, desde em contextos legalmente estabelecidos e limites bem definidos, nos termos do n.º e do art. 18.º também da CRP, que se transcreve: «a lei só pode restringir os direitos, (…) nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direito ou interesses constitucionalmente protegidos».
 E o nº 3 do mesmo artigo regula que: «as leis restritivas de direitos, (…) não podem (…) diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais».
Assim, sempre que se trate de empresa ou estabelecimento que se destine à satisfação de necessidades impreteríveis, nomeadamente os estabelecidos no n.º 2 do art. 537.º do CT. (É o caso das empresas de transportes públicos).
Mas, não só estes expressos na lei, podendo ser considerados outros, desde que tenham como objecto a satisfação das necessidades inadiáveis.
O direito à greve é analisado de acordo como os artigos identificados anteriormente articulado com o art. 44.º da CRP, que consagra o direito à deslocação.   
Ora, temos então dois direitos em que um deles terá de sofrer alguma restrição quanto ao seu exercício, sem que tal limitação constitua a violação do direito à greve.
O direito à greve está regulado nos artigos 530.º e seguintes, do CT, aprovado pela L n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro.
Do art. 537.º do deste último diploma, resulta que os trabalhadores que adiram à greve têm deveres, que podem implicar com a prestação do período normal de trabalho. É o que acontece quando:
a)     Estamos perante serviços referentes à segurança e manutenção de equipamentos – n.º 3 do art. 537.º;
b)     Se trate de empresas ou estabelecimentos que tenham como fim, satisfazer necessidades sociais impreteríveis – n.º 1 e 2 do art. 537.º;
A satisfação de necessidades sociais impreteríveis corresponde a um conceito indeterminado, o que deve ser interpretado com o auxílio da jurisprudência e doutrina.   E neste sentido, tem sido unânime, na actual jurisprudência, que nestes casos, os limites dos dois direitos devem ser fixados caso a caso.          
 A doutrina tem defendido que a solução passa por «um critério qualificador das necessidades sociais impreteríveis, de entre o conjunto das necessidades inerentes aos bens e interesses constitucionalmente protegidos em sede de direitos fundamentais», designadamente, Monteiro Fernandes, em “Manual do Direito do Trabalho”, 13ª edição.
Liberal Fernandes, no mesmo sentido, no livro ”A obrigação de serviços mínimos como técnica de regulação da Greve nos serviços essenciais”, refere: «Em sentido laboral, os serviços mínimos compreendem a actividade que os trabalhadores em greve ficam obrigados a prestar (ou a continuar a prestar, uma vez que, por definição, a satisfação das necessidades sociais impreteríveis não admite interrupções) durante a paralisação colectiva; esta dimensão está directamente relacionada com os limites que a ordem jurídica impõe ao exercício do direito à greve e traduz a quota de prestação laboral que não pode ser interrompida ou suspensa, sob pena de lesão dos direitos fundamentais dos cidadãos».
 Mas, o próprio artigo - 537.º n.º 2, inclui na al. h) do nº2 do art.º537 do CT, os transportes no sector que integra as empresas ou estabelecimentos que se destinam à satisfação das necessidades socais impreteríveis.
 Não havendo Instrumento de Regulamentação Colectiva deve verificar-se o processo estabelecido pelo art. 538.º do CT e neste sentido ser fixado os serviços mínimos por via do Tribunal Arbitral, observando-se os princípios enunciados no n.º 5 do art. 538.º, do CT (principio da necessidade, da adequação e proporcionalidade).
Assim, a análise dos casos concretos,  deve ter em atenção tais princípios de forma a que no caso dos serviços de transporte, fique salvaguardado o direito de deslocação sem colidir com o direito à greve.  
No caso recente da greve decretada para 24 de Novembro de 2010, em que estava em causa uma empresa de transportes fluviais, o Tribunal da Relação de Lisboa, pronunciou-se sobre o recurso de uma decisão do Tribunal Arbitral, que fixou os serviços mínimos em 15%.
O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa entendeu que tal percentagem no âmbito dos serviços mínimos, não violava os princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade.
Sobre o n.º 2 do art. 538.º do CT, ver o Ac. do TRL de 16 de Março de 2011, em que está em causa uma empresa de resíduos sólidos.



2 comentários:

  1. A justificação para a existência de empresas públicas que dão grandes prejuizos ao país é a satisfação de "necessidade sociais impreteriveis" não possíveis de satisfazer pela iniciativa privada (sem encargo apra o Estado). Então, apenas existem (devem) na exacta medida da "necessidade social impreterivel" pelo que os serviços mínimos têm que garantir o total fornecimento e não qualquer percentagem. Não se pode forncer apenas 15% da água. Se a "necessidade social impreterivel" é actualmente 15% da actividade normal então, essa empresa tem que ser reduzida a 15% da sua actual dimensão.

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  2. Face ao seu comentário, gostava de fazer referência a duas questões que suscitou. A primeira referente aos prejuízos causados às empresas públicas sendo a causa - as necessidades sociais impreteríveis. Faço reparo – a Lei da Greve sendo aplicável quer ao sector público quer ao privado consubstancia prejuízo para o país.
    A outra questão, é que não me parece ser de confundir dois conceitos: o conceito “necessidades sociais impreteríveis” ainda que entenda que as mesmas englobam o núcleo duro das funções do Estado – prossecução do interesse público, a verdade é que actualmente, com a Reforma da Administração muitas dessas funções estão sob a responsabilidade do sector privado (passando a ser exercidas pelo sector privado mas ao cargo do Estado).
    O facto de estes conceitos não serem coincidentes leva a seguinte consequência: não é possível partir do pressuposto da existência de uma regra de proporcionalidade entre estas duas “grandezas” – interesse público e necessidades sociais impreteríveis. Não existe uma relação biunívoca entre ela. Logo, com todo o respeito, parece não ser possível deduzir um raciocínio nas relações laborais que consubstancie uma redução de volume dos recursos humanos de uma empresa (pública ou privada) na proporção do que é considerado “necessidade social impreterível”. Isto, porque existem funções incluídas na prossecução do interesse público adiáveis ainda que por um espaço curto de tempo. Outras são impossíveis de ser adiadas.
    Apesar de não concordar com o Acórdão acima referenciado, aproveito para exemplificar com a empresa de transportes. Um dia de greve, com apenas 6 autocarros em Lisboa. Apenas se precisa de 6 motoristas. Imagine-se esta situação durante 6 meses.

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